Especialistas criticam carta do Ministro de Educação às escolas

Professores de direito, especialistas em educação e entidades como a organização sem fins lucrativos Todos Pela Educação repudiaram a carta enviada pelo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, na segunda-feira (25), às escolas de ensino básico, com o slogan de campanha do presidente Jair Bolsonaro “Deus acima de tudo, Brasil acima de todos”. Conforme apurado pelo Estadão, o comunicado pedia que a mensagem fosse lida aos estudantes e funcionários perfilados durante execução do hino nacional, e que o momento fosse filmado e enviado para o governo federal.

 

No portal BBC News Brasil, o professor de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Luciano Godoy atesta que o slogan não poderia ter sido usado em um comunicado oficial: “A propaganda do governo deve ser impessoal, por isso os governos desde FHC adotam um slogan diferente daquele da campanha”.

 

Gody aponta, também, que a filmagem de crianças é ilegal, uma vez que é necessária a autorização de pais ou responsáveis para uso da imagem, como prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Por fim, o professor destaca que o uso da frase “Deus acima de todos” vai contra o princípio de laicidade do Estado brasileiro.

 

A posição do Diretor de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação, Olavo Nogueira Filho, também é contrária à atitude de Vélez. Ao O Globo, ele diz que a mensagem contrasta com o discurso do Ministério: “O MEC criticava uma suposta doutrinação ideológica e coação moral promovida por outros governos, e agora, com este slogan, parece impor uma preferência”.

 

A doutora em direito político e econômico e coordenadora da pós-graduação em Direito Administrativo da Escola de Direito do Brasil (EDB), Mônica Machado, ressalta outra possível ilegalidade: o envio da carta sem consultar estados e municípios pode ir contra o pacto federativo, já que a maioria das escolas públicas de ensino básico são administradas por estas esferas.

 

 O Conselho Nacional de Secretários da Educação (Consed), que representa os administradores estaduais da área, afirma que a medida abala a autonomia dos entes da federação e argumenta que as escolas “devem estar imunes a qualquer tipo de ingerência político-partidária”.

 

O presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), Ademar Batista Pereira, foi um dos únicos defensores da ação do ministro Vélez. Líder de uma federação que representa as cerca de 40 mil escolas privadas brasileiras, ele avalia que “não há problema em falar “Deus acima de todos”. É bom fazer um apelo à religiosidade, independentemente da crença do estudante […] A carta do MEC pede apenas para aproveitarmos o início das aulas para mostrar os valores patriotas, como cantar o hino com a postura correta. Seria uma perda de tempo tentar barrar essa iniciativa na Justiça”.

 

O deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) comunicou que entrará com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) por crime de responsabilidade contra Vélez Rodríguez. Para Freixo, o ministro estaria ocupando seu cargo para realizar “doutrinação em massa”.

 

Vélez Rodríguez é aguardado em audiência pública com a Comissão de Educação (CE) nesta terça-feira (26). Em entrevista ao O Globo, o presidente da CE, Dário Berger (MDB-SC), garante que o ministro será cobrado por sua decisão de enviar a carta, já que, segundo ele, é inadmissível “associar a política pública com a política partidária”. Para o parlamentar, o ministro Vélez Rodríguez “parece que não tem educação. Em vez de encontrar soluções para o sistema educacional, fica colocando política partidária no meio de questões sensíveis”.

 

Leia mais: O Globo I / O Globo II / O Globo III / BBC News Brasil / Estadão 


L.S./L.L.