As 11 universidades federais que farão eleições para reitoria em 2019 temem que os nomes indicados não sejam nomeados, o que viola o princípio de autonomia das instituições federais de ensino superior. Embora o novo ministro da Educação Abraham Weintraub tenha dito em seu discurso de posse que adotaria uma postura conciliadora, ele afirmou em entrevista que escolherá o nome que achar mais conveniente. Dessa forma, não há garantia de que o MEC respeitará o resultado da consulta pública, a qual tradicionalmente nomeia o nome mais votado para assumir a reitoria.
O processo eletivo de reitores começa com a consulta nas instituições, que segue o formato de eleição, com chapas e campanha. Posteriormente, o nome dos três primeiros candidatos são submetidos a um colégio eleitoral composto por professores, funcionários e estudantes. Nessa etapa, outros nomes podem ser submetidos à avaliação. A partir daí, uma lista tríplice com os nomes dos potenciais gestores é enviada ao MEC que, tradicionalmente, nomeias o vencedor da consulta.
Em entrevista ao Correio Braziliense, o professor do Departamento de Gestão Pública da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Correa Gomes afirma que o transtorno enfrentado por Weintraub ao desrespeitar a consulta pública seria maior do que qualquer influência que o governo federal possa ganhar se desrespeitar o processo democrático indicando outro nome da lista. Para ele, embora Weintraub tenha o direito de apontar o nome que quiser da lista tríplice, burlar a escolha da comunidade é o mesmo que falar que não precisa de consulta. “Ele já faria como quisesse. As universidades são locais de produção de conhecimento. E produção de conhecimento está intimamente relacionado à autonomia”, alerta.
“Vamos supor que o ministro escolha o terceiro nome da lista, por considerá-lo mais adequado. Adequado como? Então é melhor chamar todo mundo pra discutir e mudar a regra do jogo. Nas vezes em que isso não foi seguido, foi um transtorno. Nesses casos, o gestor escolhido enfrenta desgastes, tem dificuldade para agir. Pode ter até invasão de reitoria. As universidades têm um compromisso muito grande. Não se pode criar mais problemas. Melhor botar o ministério para trabalhar. Nomear outra pessoa que não a eleita pode ser legal, mas não é correto”, avalia Gomes.
Existem alguns exemplos de desrespeito ao processo eleitoral, como no Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines) do Rio de Janeiro (RJ), o qual tem processo de eleição semelhante ao das universidades federais. O então ministro Vélez Rodríguez nomeou como diretor-geral o segundo colocado na consulta com a comunidade: Paulo André Bulhões, da Chapa 4. A candidata mais votada foi Solange Rocha, da Chapa 1, com 40% dos votos.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que elegeu no início do mês a biofísica Denise Pires de Carvalho ( primeira mulher indicada para o cargo na instituição), também sofre com a incerteza sobre a nomeação. O segundo lugar é do professor Oscar Rosa Mattos, da Escola Politécnica, e o terceiro, do docente Roberto dos Santos Bartholo Junior. Os nomes serão submetidos ao colégio eleitoral em 30 de abril e, após isso, Weintraub terá 60 dias para indicar quem ocupará o cargo na reitoria da UFRJ.
Por enquanto o reitor da UFRJ é Roberto Leher, filiado ao PSol, que não se candidatou à reeleição. Pró-reitor de Planejamento e Finanças da instituição, Roberto Gambini minimiza o clima de tensão. “O processo não é novo. Em função disso, acreditamos que não há razão para qualquer questionamento. Não vejo razão para o governo não levar o primeiro nome da lista em consideração. É ruim tomar qualquer medida sem consultar universidades. Há o risco de se mudar uma estrutura em funcionamento e causar problemas posteriores. É bom conversar, saber os impactos”, defende. “Mas, se houver algum movimento para construir um nome muito diferente, saberemos na reunião do colégio”, pondera.
Em 11 de março, o presidente Jair Bolsonaro postou em seu perfil no Twitter que as universidades têm sido massacradas “pela ideologia de esquerda que divide para conquistar e enaltece o socialismo e tripudia o capitalismo”. Disse, ainda, que pretende quebrar esse ciclo, a fim de “impedir para sempre que o mal que esteve tão perto de destruir nosso país volte com força”. Na época, professores rebateram a afirmação e destacaram que as instituições são plurais e, por isso mesmo, produzem conhecimento de qualidade.
De acordo com o presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), Antônio Gonçalves, o ministro não tem compromisso nenhum em nomear o primeiro da lista.“A intenção é limitar e dificultar a eleição de candidatos progressistas. O ministro anterior tinha um alinhamento político, mas não tinha competência gerencial para lidar com as políticas do atual governo. Agora, o presidente escolheu alguém com o mesmo alinhamento ideológico, mas com uma capacidade de gestão aparentemente melhor”, diz. “Haverá uma luta política, cujo resultado dependerá da correlação de forças. As universidades, os institutos estão dispostos a preservar a democracia dentro das instituições”, afirma.
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M.B / N.O.