Finep alerta para riscos da transferência do FNDCT para o MCTIC

A Finep é a atual gestora do Fundo, responsável por quatro mil convênios e contratos de subvenção econômica com universidades, instituições de CTEI e empresas, que totalizam cerca de R$ 9 bilhões

A Associação dos Empregados da Finep (Afin) publicou manifesto contra a Medida Provisória 870, alertando que a sua aprovação vai promover o “desmonte da ciência brasileira”. Segundo a Afin, o ponto mais crítico da MP é a transferência das atribuições da Secretaria-Executiva do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT (fundo que promove o desenvolvimento do Sistema de CTEI), para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Essa transferência, prevista no item 12.14 da MP 870, é “o golpe fatal no sistema de financiamento à ciência, tecnologia e inovação no País”.

 

Atualmente, essa competência é da Finep, que desde 1971 está organizada e estruturada para operar e gerir os recursos do FNDCT. A Afin salienta que “sem a estrutura adequada à gestão de recursos públicos destinados aos centros de excelência do país, não haverá novas liberações de recursos, de forma que a medida representará o desmonte da ciência e da tecnologia no Brasil”. Ao assumir a gestão do FNDCT – caso a MP seja mesmo aprovada –  o MCTIC herdará, de imediato, a responsabilidade pela gestão de mais de 4 mil convênios e contratos de subvenção econômica realizados com universidades, instituições de CTEI e empresas, que totalizam cerca de R$ 9 bilhões.

Confira o manifesto da Afin na íntegra:

Aprovação de emenda na MP 870 promoverá o desmonte da ciência brasileira

Com 541 emendas, a Medida Provisória 870 da Reforma Administrativa do Governo Federal traz, em seu item 12.14, o golpe fatal no sistema de financiamento à ciência, tecnologia e inovação no País. O documento prevê a transferência das atribuições da Secretaria-Executiva do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT (fundo que promove o desenvolvimento do Sistema de CTEI), para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Atualmente, essa competência é da Finep, que desde 1971 está organizada e estruturada para operar e gerir os recursos do Fundo, utilizados no apoio não-reembolsável, a projetos de pesquisa científica e tecnológica de universidades e demais instituições de ensino e pesquisa de todo o País, bem como apoiar a inovação de elevado risco tecnológico nas empresas brasileiras.

Um setor que tem acumulado perdas, em decorrência das sucessivas políticas de contingenciamento de recursos para o desenvolvimento da pesquisa científica brasileira. Apenas este ano, o corte sofrido pelo FNDCT foi de 60%, com imposição de reserva de contingência na sua Lei Orçamentária Anual (LOA) de R$3.4 bilhões. A paralisação de pesquisas importantes, o sucateamento de laboratórios e a evasão de pesquisadores renomados para outros países, são apenas alguns exemplos do impacto negativo sofrido com a escassez de verbas para pesquisa.

Sem a estrutura adequada à gestão de recursos públicos destinados aos centros de excelência do país, não haverá novas liberações de recursos, de forma que a medida representará o desmonte da ciência e da tecnologia no Brasil.

O contingenciamento dos recursos do FNDCT aponta para a total falta de priorização do uso dessa importante fonte de financiamento na atividade para a qual foi criada. O Governo fechou o ano de 2018 com R$ 17 bilhões de recursos nas fontes vinculadas do FNDCT no seu “caixa”, na forma de superávit apurado no BGU (Portaria STN nº 191 de 28/03/2019). Esses R$17 bilhões contribuem para diminuir o déficit primário da União, ao invés de serem destinados ao financiamento da ciência e tecnologia.

A justificativa alegada para a mudança proposta pela MP é o fortalecimento do MCTIC como coordenador da política e das fontes de recursos para ciência, tecnologia e inovação, um papel que nunca deixou de ser exercido por aquele Ministério, já que a Finep é uma empresa pública vinculada ao MCTIC e sempre atuou como o braço operacional do Ministério para a implementação das políticas de CTEI. Para gerir os recursos do Fundo, a Finep obedece a uma estrutura de governança orientada à execução das políticas definidas pelo MCTIC e pelo Conselho Diretor do Fundo, presidido pelo ministro (com representantes do governo, dos setores empresarial, acadêmico e da sociedade civil).

Ao assumir a gestão do FNDCT, o MCTIC herdará, de imediato, a responsabilidade pela gestão de mais de 4 mil convênios e contratos de subvenção econômica realizados com universidades, instituições de CTEI e empresas, que totalizam cerca de R$ 9 bilhões. O Ministério ficará responsável, ainda, por todas as atividades de natureza administrativa, orçamentária, financeira e contábil, sem dispor, para a execução dessa tarefa, de equipe técnica qualificada, sistema de informática próprio e dedicado, experiência ou infraestrutura.

Em decorrência de seu desempenho como Secretaria Executiva, a Finep e o FNDCT são reconhecidos nacional e internacionalmente pela diversidade de instrumentos e por sua larga experiência na análise de projetos de CTEI. Tanto a Finep quanto o modelo de financiamento público do FNDCT são singulares, e servem de parâmetro para agências de outros países.

A transferência da Secretaria-Executiva traria impactos à Finep, que deverá redefinir seu escopo de atuação e estrutura operacional. Ao MCTIC, acarretaria o ônus de atividades que fogem à sua função e estrutura, o que exigirá a criação imediata de uma estrutura complexa e especializada, atualmente inexistente.

A Finep é a única agência de financiamento à CTEI do País que dispõe de um arcabouço jurídico que permite combinar instrumentos de subvenção econômica e crédito. Desde 2003, a Finep aplicou, com recursos do FNDCT, cerca de R$ 5 bi em 59 universidades federais, R$ 1,5 bilhão em 30 universidades estaduais e R$ 400 milhões em 33 instituições privadas sem fins lucrativos.

Grandes projetos de infraestrutura científica nacional foram apoiados pela Finep com recursos do FNDCT, dentre os quais destacamos a Torre Alta de observação da Amazônia, com investimento de R$ 12 milhõesd+ o Laboratório de Sequenciamento Genômico no Instituto Butantã, projeto de R$ 34 milhõesd+ o Supercomputador Santos Dumont, instalado no Laboratório Nacional de Computação Científica, localizado em Petrópolis – Região Serrana – e que recebeu R$ 60 milhõesd+ o Navio Polar da Marinha Brasileira, também apoiado com R$ 60 milhões, o Laboratório de Integração de Testes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que recebeu R$ 75 milhõesd+ o Reator Multipropósito, projeto conjunto da Comissão Nacional de Energia Nuclear e da Marinha, com investimento na fase inicial de construção de R$ 120 milhõesd+ e o Sirius, fonte de Luz Sincrotron, cuja primeira fase acaba de ser inaugurada e no qual o FNDCT já investiu R$ 350 milhões.

Nos últimos anos, apesar da escassez de recursos, a Finep seguiu lançando, em consonância com as diretrizes do MCTIC, uma série de iniciativas de sucesso devidamente planejadas para fortalecer a infraestrutura científica nacional e integrá-la ao setor produtivo (via FNDCT).

O corpo funcional da Finep, sabedor da importância da atuação da empresa na execução do fundo, e de como a atual estrutura de operação é o que sustenta a ciência brasileira, se manifesta CONTRA a mudança sinalizada pela emenda 12.14 da MP 870. Ela vai fragilizar um setor já tão combalido pelo sucessivo corte de recursos, comprometendo o desenvolvimento e o futuro do país.

Confira: Jornal da Ciência