Avaliação é de que essas entidades vão atuar nas atividades-fim das universidades
Estudiosos da área de educação que fizeram uma análise mais apurada do projeto que cria o Future-se avaliam que o poder das Organizações Sociais na gestão das universidades será maior do que o anunciado na semana passada.
Na apresentação do programa, foi dito que essas entidades atuariam em atividades como a gestão patrimonial e a captação de recursos para as universidades. O objetivo seria desincumbir os reitores de tarefas burocráticas para que eles pudessem se dedicar à finalidade acadêmica das universidades.
A minuta, no entanto, prevê mais que isso. Estabelece que as OSs irão “apoiar a execução de planos de ensino, pesquisa e extensão” e, em outro trecho, que irão “aprimorar as atividades de pesquisa”.
Além disso, diz que elas receberão recursos públicos e poderão ter conselheiros remunerados. Outro artigo permite ainda que professores em regime de dedicação exclusiva às universidades possam fazer pesquisa remunerada nas organizações, desde que cumpram “sua carga horária ordinária de aulas”.
Questionado, o MEC afirma que essa carga horária, por lei, é de no mínimo oito horas semanais, mas que cabe às instituições de ensino deliberar sobre a jornada.
Para Ranieri, não faz sentido exigir do professor em dedicação exclusiva que apenas dê aulas, pois a Constituição estabelece que uma universidade tem que atuar não só no ensino, mas também em pesquisa e extensão. “Pelo texto apresentado, as OSs vão atuar nas atividades-fim da universidade. Diferente do que foi dito, o projeto não aumenta a autonomia, pelo contrário.”
A professora também destaca que o projeto de lei tenta contornar problemas estruturais com um programa construído às pressas, sem discussão prévia e com tramitação rápida demais para a dimensão das mudanças pretendidas – a consulta pública, etapa anterior ao envio do texto ao Congresso, vai até o dia 15. “É um projeto muito complexo para um ministro há tão pouco tempo no cargo”, diz. Abraham Weintraub assumiu o MEC no dia 9 de abril.
Estrutura paralela de poder
Professor da FGV, Gustavo Fernandes diz ver o risco de o programa criar uma estrutura paralela de poder na universidade, com as OSs. De um lado, explica, vai haver servidores contratados nos moldes atuais, por concurso público, e, de outro, as organizações sociais, com outro regime jurídico e possibilidade de contratação por CLT.
Pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Paulo Meyer Nascimento avalia que esse risco vai depender da forma de implantação do programa.
Em sua opinião, o maior desafio do Future-se é a falta de previsão de recursos a curto prazo, em um momento em que as universidades sofrem um contingenciamento de 30% nas despesas não obrigatórias, e ainda a falta de detalhes de como exatamente vão funcionar os fundos de financiamento previstos no programa. Ele defende o financiamento das instituições pela cobrança dos ex-alunos das instituições, condicionada à renda deles. Essa medida, no entanto, dependeria de alteração constitucional.
Hospitais Universitários
Em outra mudança nas universidades, a minuta do projeto de lei do Future-se inclui ainda um artigo segundo o qual os hospitais universitários (HUs) poderão atender pacientes com planos de saúde privados.
Segundo a professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Lígia Bahia, especialista em saúde coletiva, isso já ocorreu no passado, mas os planos que demonstraram interesse em fazer convênios com HUs eram os que pior remuneravam os hospitais, o que não cobria custos.
Para ela, é interessante a liberação de planos, mas cabe regulamentação para que os HUs atendam preferencialmente casos graves e complexos, para que a missão educativa e de pesquisa deles seja respeitada.
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