Afirmei, em artigo publicado no Boletim da APUFSC (n. 782), que a gestão atual da UFSC tinha inaugurado uma nova forma de sequestro: sequestro de vagas REUNI. Isso porque, na distribuição de vagas REUNI ocorrida no ano passado, o Departamento de Economia e Relações Internacionais (CNM/CSE) não tinha recebido nenhuma vaga, e esse departamento tem direito, pelo pactuado no Projeto Político Pedagógico do RI/CNM/REUNI a receber 04 vagas de concurso para professor efetivo, afirmação até hoje não contestada pela atual gestão.
Tanto a pró-reitora de graduação quanto o diretor técnico de ensino afirmaram verbalmente que fizeram a distribuição com base em critérios técnicos, e que foram democráticos, pois a alocação das referidas vagas baseou-se nos trabalhos de uma comissão. Contudo, é preciso registrar novamente que o CNM e o CSE não participaram dessa “democrática” comissão, embora sejamos os principais responsáveis por um dos maiores sucessos do programa REUNI.
E um episódio recente, envolvendo a cessão do professor Ranulfo Alfredo Manevy de Pereira Mendes, do Departamento de Artes e Libras (DALI) do CCE para a Prefeitura de São Paulo, ilustra o “novo” modo de governar, baseado nos princípios do “republicanismo”. Contemos resumidamente essa história, com base no processo em versão impressa (sob número 23080.000397/2013-15), que documenta o jeito “transparente” de distribuir vagas de concurso para professor atualmente em curso:
1) a Prefeitura de SP solicitou a cessão do Professor Manevy, para ocupar o cargo de Secretário Adjunto de Cultura, através de dois memorandos, datas de 21.12.2012 e 09.01.2013 (folhas 02 e 03 do processo)d+
2) O Departamento de Artes e Libras negou tal pedido, alegando que precisava de docentes para cumprir suas atividades didático/pedagógicas (com data de 18.02.2013, folhas 12 a 15 do processo). O pedido também foi recusado pelo conselho de unidade do CCE, em reunião ocorrida no dia 28.02.2013 (folha 20)d+
3) A pró-reitora de graduação efetua um despacho, no dia 14.03.2013, solicitando reanálise da matéria, dizendo que providenciará um substituto para o citado departamento (folha 26)d+
4) Tanto o colegiado do departamento (em reunião ocorrida em 22.03.2013) quanto o conselho da unidade do CCE (em 28.03.2013) recusam a reconsideração (folhas 30 a 34 e folhas 42 e 43, respectivamente), pois segundo essas instâncias um substituto não resolveria o problema. Em determinado momento do segundo parecer da comissão do DALI/CCE, solicita-se a disponibilidade de um professor efetivo para o departamento, para que a cessão seja reavaliada (folha 33)d+
5) O Secretário de Cultura da Prefeitura do SP, senhor Juca Ferreira, em 13.03.2013, envia mensagem eletrônica para a Magnífica Reitora, expondo motivos para que seja cedido o professor (folha 47)d+
6) A Magnífica Reitora solicita, pedindo perdão, que o secretário faça tudo por escrito, por ser necessária uma formalização para que seja resolvido tecnicamente e politicamente o assunto. Transcrevo a mensagem da reitora, na íntegra, como consta na folha 47 do processo: “Prezado Secretário Juca Ferreira, suas considerações são muito importantes. Seria possível transformar em um ofício formal, destacando os pontos referentes aos projetos a serem desenvolvidos, assinar, digitalizar e encaminhar por e-mail. Peço perdão por esta situação, mas é necessário formalizar tudo para que possamos encaminhar tecnicamente e politicamente a questão (grifos meus). O processo já foi reencaminhado ao departamento para análise, incluindo a garantia de substituição do professor. Enfim, estou retornando a UFSC amanhã pela manhã e verei o que é possível fazer caso o departamento recuse a liberação. Amanhã mando novo e-mail sobre a situação. Desde já agradeço a compreensão. Roselane”. A mensagem em questão foi enviada no dia 14.03.2013d+
7) Em 14.05.2013 a Magnífica Reitora, de próprio punho, comunica que está dando uma vaga de professor efetivo para o DALI, em troca da cessão provisória do Professor Manevy para a Prefeitura do SP. Tal despacho está na página 45 do referido processo e transcrevo-o na íntegra: “A PROGRAD para ciência e manifestação e posteriormente encaminhar aos setores. Encaminhar ao Departamento do DALI e de Jornalismo e à Direção do CCE informando que foi disponibilizada vaga de professor efetivo para substituição conforme solicitação registrada na p. 33 pelo parecer dirigido ao Colegiado do DALI. 14.05.2013. Roselane Neckel (com carimbo e respectiva assinatura)”. O despacho da Magnífica Reitora ocorreu depois da segunda negativa de cessão, tanto da parte do Colegiado do Departamento DALI/CCE quanto do Conselho de Unidade do CCE, como relatado no item 5, acimad+
8) Por fim, um parecer do conselheiro Carlos Locatelli, aprovado pelo Conselho do CCE em 29.05.2013, aceita a cessão e deixa registrado que, ao fim e ao cabo, o DALI e o CCE saíram ganhando, porque cederam provisoriamente um docente e ganharam uma vaga de professor efetivo (folha 51 do processo). Tal parecer também é explícito ao comentar a atuação destacada da Magnífica Reitora no assunto, ao dar garantia de vaga de professor efetivo para solucionar o impasse e afirma: “Assim, crê este parecerista que, considerando como garantia explícita e juridicamente irrefutável o despacho da Reitora (grifo meu) e satisfeitos os pleitos de todas as partes – o requerente será liberado para a Prefeitura de São Paulo, a Reitoria atendeu a demanda do Prefeito de São Paulo (folhas 46-50), a condição interposta pela Comissão do DALI foi atendida e de fato o Departamento passa a contar com mais um professor em seu quadro efetivo (grifo meu) – não poderia ser outro o parecer que não FAVORÁVEL à matéria” (folha 51)
O que podemos apreender desse caso, brevemente exposto acima?
Em primeiro lugar, é necessário parabenizar o Departamento de Artes e Libras (DALI) e o Conselho do CCE, pela defesa intransigente de seus legítimos interesses, não aceitando soluções precárias, como a contratação de substituto.
Em segundo lugar, parece que foi inaugurado um “novo” jeito de distribuir vagas de professor efetivo na UFSC. Basta que ocorra um pedido de uma prefeitura importante como a de São Paulo (e o pedido da Prefeitura citada é normal e legítimo, que fique claro!) que um departamento ganha vagas de concurso, de despacho de próprio punho da magnífica reitora, sem nenhum “lastro” (isto é, sem ser vaga de professor equivalente ou de expansão, como vagas REUNI). Ora, é muito provável que outros departamentos da UFSC tenham docentes “emprestados” para outros órgãos da administração pública. O Departamento de Economia e Relações Internacionais, por exemplo, tem docente à disposição do Ministério da Fazenda. E recebemos tão somente um professor substituto. Por que não recebemos um tratamento isonômico? Uma gestão que se diz democrática deveria, de imediato, dar uma vaga de concurso para cada departamento que tiver professor cedido provisoriamente para outra instância da administração pública. Por que o DALI/CCE ganhou vaga de concurso para professor efetivo por conta de uma cessão provisória de docente e outros departamentos, como o CNM/CSE, não tiveram o mesmo tratamento?
Em terceiro lugar, a alegação de alguns gestores de que a distribuição de vagas de concurso para docente é baseada unicamente em critérios técnicos parece mais um conto do vigário, diante desse fato que acabo de relatar. Existe um critério político e pessoal, que foi usado nesse caso. Ora, o Departamento de Artes e Libras (DALI) recebeu uma vaga de professor efetivo sem nenhum lastro. Quando o professor cedido retornar, o citado departamento não perderá essa vaga dada “gratuitamente”. Essa vaga não foi distribuída por motivos “técnicos” (pois não há nenhuma justificativa técnica por parte da administração central nos autos do referido processo). Síntese: a reitora deu, pessoalmente, uma vaga de concurso para professor efetivo para o Departamento de Artes e Libras (DALI/CCE) tão somente para atender um pedido da Prefeitura de São Paulo! Ou seja, na atual gestão, quem tem padrinho não morre pagão.
OBSERVAÇÕES: os leitores devem estar cientes de que tanto a comissão que avaliou o pedido original, no âmbito do Departamento de Artes e Libras (DALI/CCE), quanto o parecerista no âmbito do Conselho de Unidade do CCE (Prof. Carlos Locatelli), chamaram a atenção, em seus pareceres (folhas 30 a 34 e folha 51), para a dimensão política que envolve esse assunto. Por último, mas não menos importante: esse texto é baseado em cópia do processo na forma física (até o parecer final aprovado no Conselho de Unidade, que aprovou a cessão, em virtude de o DALI/CCE ter recebido vaga de professor efetivo). Consultando o processo on-line, percebi que não constam as páginas citadas por mim nos itens 6 e 7, acima, referentes às manifestações da reitora a respeito do assunto. Ou seja, no sistema eletrônico não estão disponíveis os despachos da autoridade máxima da UFSC. E também não constam os dois pareceres nas folhas mencionadas acima (segundo parecer da Comissão e parecer final no Conselho da Unidade). Por que será?