A próstata de Crivella

Marcelo Crivella, exorcista e prefeito do Rio, acaba de anunciar que possui um câncer (pequeno) na próstata (Ver URL abaixo). Se conheço bem a “doutrina” da Universal do tio de Crivella, este câncer é obra do demônio. Isto porque, segundo prega seu tio e sumo sacerdote do Templo de Salomão III, construído em São Paulo, todo o mal é obra do Tibinga. Expulsado o tinhoso, a cura se processa naturalmente.

Ora, sendo Crivella um competente bispo e exorcista, até com obra publicada sobre o assunto, soa estranho ouvir dele que, por enquanto, vai apenas tomar remédio. Mais tarde, conforme tenha evoluído o tumor, fará uma cirurgia.

Como é que é? Mas o Deus de Crivella não é o Deus vivo? Não é Operador de milagres fantásticos? Vai tão fervoroso bispo e tão competente exorcista deixar de “repreender” o capeta que desavergonhadamente ataca sua próstata? Ou será que não existe auto-exorcismo? Mas, se este for o caso, não deveria Crivella servir-se da expertise de um colega da Universal do tio? O seu próprio tio, por exemplo?

A igreja do tio de Crivella (como de fato toda igreja neopentecostal) é uma usina de milagres diários. São milagres em profusão, de todos os tamanhos e complexidades, como todo milagre deve ser, já que milagre, por definição, é uma quebra das leis naturais, segundo a vontade de Deus. E a vontade de Deus, Crivella sempre pregou, é ilimitada em poder, como não poderia ser diferente em se tratando daquele que “criou as coisas como elas são hoje”, nas palavras de Marina Silva, evangélica e criacionista como Crivella.

Como, então, entender Crivella procurando a limitadíssima medicina dos homens, tomando remédios dos homens e sujeitando-se a uma cirurgia humana? Logo ele, um bispo da Universal do tio, negligenciando o Médico de todos os médicos, o Mestre de todos os curadores, o Senhor de todos os milagres? Como entender isso, em nome de Jesus?

Certa vez ouvi o seguinte de um fiel pagador de dízimos de uma igreja neopentecostal (poderia ser a Universal, mas não me lembro). Estando ele endividado, pediu ao pregador um milagre para libertar-se da dívida. (Claro, incrédulo leitor, a dívida é também obra do chifrudo, fique isto claro). Feita a imposição das mãos e repreendido o cornudo (com fortes pesadas no chão), no dia seguinte o fiel foi ao Banco e (aleluia!) a dívida havia desaparecido. Dívida desaparecida em nome de Jesus! Aleluia! Aleluia! Eis, exposto nesta edificante história, o poder absoluto da vontade do Deus vivo.

Pois se o Deus vivo da Universal opera milagres diários, como nas demais neopentecostais, penso que eliminar o pequeno câncer prostático de Crivella é fichinha para quem “criou as coisas com elas são hoje”. Não vejo razão alguma para Crivella ficar seguindo as prescrições do homem, em vez de seguir o Caminho infinitamente mais eficaz e seguro que ele sempre pregou.

Meu conselho é este: Crivella, siga o seus próprios ensinamentos e cure-se pela fé, em nome de Jesus. Faça isso, homem! Se seguires o que sempre pregaste e deixares de lado a fraca medicina humana, com absoluta certeza, em alguns meses o Rio será uma cidade bem mais feliz.


* José J. de Espíndola

Engenheiro mecânico pela UFRGS, Mestre em Ciências em Engenharia pela PUC-Rio, Doutor (Ph.D.) pela Universidade de Southampton, Inglaterra, Doutor Honoris Causa da UFPR, Professor Titular da UFSC, Departamento de Engenharia Mecânica, aposentado.

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