*Por Fábio Lopes
A UFSC acaba de completar 64 anos. A efeméride foi comemorada em uma sessão solene do Conselho Universitário. Aproveitou-se a ocasião para, com toda justiça, outorgar a duas colegas do Departamento de História o título de professor emérito.
Para os que ainda mantêm um mínimo de escrúpulos e compostura, o evento deixou um travo na boca. É que, em circunstâncias normais, não estivesse a instituição mergulhada até os cabelos no mais miserável moralismo de goela, um outro ilustre membro da comunidade universitária teria se tornado professor emérito naquele mesmo dia. Refiro-me, claro, ao Prof. Rodolfo, três vezes reitor desta Casa.
O processo inquisitorial a que ele foi inadvertidamente submetido permanece como um dos mais sórdidos episódios a manchar a história da universidade. E o pior é que os perpetradores da iniquidade não aprenderam nada com a imagem de sua própria estupidez refletida no espelho. O desejo de vingança que os alimenta – uma evidente compensação para a incompetência e a impotência de que eles têm patente – não conhece limites. Outras vítimas já se estão na alça de mira de suas metralhadoras giratórias.
Só não saí do Auditório Garapuvu ainda mais acabrunhado porque, a par das já mencionadas homenagens às duas historiadoras, a sessão solene do CUn me deu a oportunidade de dar um abraço de despedida no Prof. Edson de Pieri. Como parte da pauta, ele foi oficialmente substituído pelo Prof. Sérgio Peters no comando do CTC. Contando o tempo em que Edson foi vice-diretor e diretor daquela unidade, foram doze anos e meio seguidos de serviços prestados.
Conheço-o há três décadas. Embora pertencêssemos a áreas de atuação muito distantes uma da outra, tínhamos amigos em comum. Nos anos 90, quando meu fígado ainda era um jovem promissor, bebi graciosamente hectolitros de uísque em festas memoráveis que aconteciam na casa dele.
De vez em quando – em uma época em que a amizade não se resumia a likes no Instagram ou a frases telegráficas por Whatsapp –, almoçávamos juntos. Era sempre revigorante conversar com alguém tão bem informado, inteligente e atento. Desde então, nunca nos perdemos de vista. Mas nossa relação se estreitou de verdade há cerca de quatro anos, quando chefiei sua última campanha a reitor. Ele saiu
derrotado, como todo mundo sabe. Em compensação, eu só lucrei: primeiro, porque Edson me apresentou à candidata a vice, Marcela Veiros, com quem me casei uns seis meses depois e é simplesmente o amor de minha vida; segundo, porque, a partir dali, ele tem me concedido lições diárias de elegância, nobreza, conhecimento técnico e humanismo profundo e sincero.
Não sei dizer quantas vezes me socorri de sua sabedoria política e de suas habilidades como administrador em minha dura lida como diretor do CCE. Não há semana em que eu não o visite em sua sala ou em que não ligue para ele para tirar alguma dúvida ou pedir-lhe pílulas de sabedoria. Temos, de resto, um grupo de Whatsapp que reúne alguns diretores de centro. É o bom humor que lá reina o principal motivo de suportarmos a grotesca inoperância da atual gestão da UFSC. As piadas do Edson são as melhores.
Vendo a universidade na draga em que se encontra, não é possível deixar de pensar no quanto a instituição perdeu ao deixar de tê-lo como reitor. Parte o coração compará-lo aos atuais administradores desta instituição esquecida por Deus. Não é à toa que os bolsonaros da vida chegam ao poder. Se na UFSC, a opção pela demagogia e a ignorância triunfam, imaginem a mixórdia que não acontece por aí.
Não conheço pessoa mais injustiçada na universidade do que esse humilde filho de jardineiro que saiu dos confins do interior paulista para estudar na Unicamp e na França, até se tornar o mais precioso quadro da UFSC. E o mais incrível é que, mesmo sendo preterido em prol de gente que não lhe chega aos pés, Edson, como diretor do CTC, não deixou de salvar a instituição umas tantas vezes nos últimos anos. A modéstia o impede de alardear esses feitos, e não vou ser eu a constrangê-lo tornando públicas suas boas ações.
Limito-me a recomendar aos leitores que sigam o proverbial conselho de um compositor popular que, sabe-se lá por que cargas d’água, ganhou recentemente da UFSC um título de doutor honoris causa que nunca virá receber: “Procurem saber”. É isto: procurem saber.
*Fábio Lopes é diretor do CCE/UFSC
Artigo recebido às 13h54 do dia 16 de dezembro de 2024 e publicado às 10h29 do dia 17 de dezembro de 2024