*Por Astrid Baecker Avila e Carlos Soares
No ano de 2024, tivemos um movimento paredista que envolveu a educação federal como um todo, técnicos, docentes e estudantes de todo o país. E para aqueles que viveram esse processo ficou uma certeza: de que o Proifes Federação não representa os docentes das Universidades e Institutos Federais, pois atuam a revelia do que pensam e querem suas bases. Constituem-se em um braço governamental para silenciar nossos movimentos de luta. Consideramos importante entender esse processo e sua inserção no contexto sindical brasileiro, para reafirmar que para fortalecer a Apufsc, hoje, é preciso nos desfiliarmos do Proifes.
O que é a Proifes-Federação e qual tem sido seu papel histórico no movimento sindical docente no Brasil?
Criada em 2004, naquele momento, como um Fórum de Docentes com a adesão das diretorias sindicais de 12 associações docentes ligadas a Universidades brasileiras, o “Proifes” (Fórum dos Professores das Instituições Federais de Ensino Superior) passa a constituir, em 2012, uma Federação de Sindicatos, a Proifes-Federação. Atualmente, apenas cinco entidades baseadas em Universidades Federais compõem efetivamente a Federação (ADUFG, Adufrgs, Adurn, Apub e Apufsc); todas as demais associações ligadas à criação do Fórum se desvincularam da Federação a partir de 2012, incluindo a emblemática UFSCar, berço de Gil Vicente, um dos fundadores da Proifes. Pretendendo representar não apenas os/as docentes do Magistério Superior, mas também aqueles da Educação Básica, Técnica e Tecnológica (EBTT) Federal, a Proifes-Federação conta ainda em suas bases com uma entidade ligada a um Instituto Federal (Sindiedutec – IFPR).
A representatividade da Federação é baixíssima. Na verdade, compor a Proifes-Federação tem sido uma escolha pelo isolamento em relação ao conjunto da categoria docente em nível nacional. Em um país que conta atualmente com 69 Universidades Federais e com 38 Institutos Federais, além de 2 CEFETs, com campi em 660 municípios, a Proifes-Federação representa menos de 15% dos/das docentes do Magistério Superior (hoje mais de 136 mil professores/as,entre ativos/as e aposentados/as) e menos de 11% do total das categorias da educação federal (mais de 202 mil professores/as, quando somados o Magistério Superior e a carreira EBTT, também considerando ativos/as e aposentados/as).
Além disso, é importante destacar que a Proifes-Federação não tem a legitimidade de uma efetiva entidade sindical. Seu pedido de registro provisório junto ao Ministério do Trabalho, pelo qual ela funcionou como associação de fato, foi deferido num contexto bastante questionável, em meio ao movimento de greve e após a Justiça ter declarado nulo o famigerado acordo assinado com o governo. Porém, o documento do tal registro sequer apresenta um quantitativo do total de filiados/as nas Associações que compõem a Federação. Considerando a estrutura federativa dessa entidade, que congrega Sindicatos autônomos de base territorial e abrangência, em geral, estadual, a situação da Proifes-Federação é bastante duvidosa. A quase totalidade das entidades federadas tampouco possui registro sindical e a maior parte delas não disponibiliza, nem por meio de registros oficiais, nem por instrumentos de comunicação institucional, o total de filiados/as. A razão para essa situação é escandalosa e profundamente reveladora do que tem sido o papel histórico da Proifes-Federação na organização sindical da categoria docente do ensino superior brasileiro.
Em face da estrutura Federativa da Proifes, as decisões da Federação são tomadas não exatamente pelo acúmulo das vontades expressas pelas bases, seja por meio de Assembleias ou mesmo dos plebiscitos e consultas que as entidades vinculadas à Proifes-Federação costumam organizar, mas sim por um Conselho Deliberativo (CD), composto por representantes de cada um dos Sindicatos autônomos federados. Esse modelo, que, por si só, já geraria graves distorções, uma vez que representa de forma desequilibrada o quantitativo de filiadas/os nas bases da Federação, as diferenças organizativas entre cada um dos Sindicatos ou mesmo as peculiaridades regionais de cada entidade federada, acaba por se tornar uma aberração quando se procura conhecer a natureza efetiva de cada um dos entes que compõem a dita Federação. A falta de transparência do CD, aliás, é preocupante, pois as atas das reuniões não são disponibilizadas à base, contrariando seu próprio Estatuto. Essa atitude impede que se acompanhem as decisões tomadas e que se façam cobranças.
Como afirmado, embora a Federação tenha apenas 6 entidades de fato ligadas às categorias do Magistério Superior e da EBTT hoje a ela associadas (5 em Universidades e 1 Instituto Federal), um exame detalhado de sua estrutura e da respectiva composição de seu Conselho Deliberativo revela que se trata de uma entidade federativa composta por 11 ditos “sindicatos autônomos”. Na verdade, portanto, se trata de uma Federação que é composta, em quase metade de seus Sindicatos federados, por entidades de natureza cartorial, sem relação efetiva com alguma base social de que sejam representativas. Foram criadas apenas com o fito de espalhar cizânia entre o movimento sindical docente em nível nacional e garantir uma maioria artificial para conformar as decisões que, a revelia do que pensam as/os docentes nas suas bases, os dirigentes do Conselho Deliberativo já tomaram previamente.
Hoje, aqueles/as docentes associados a Sindicatos vinculados à Proifes-Federação estão à mercê dos “fantasmas” referidos a seguir. O “Sindproifes-PA”, por exemplo, é uma entidade fundada em 2015, hoje com 51 filiadas/os, que visa deslegitimar a organização dos/das docentes da UFPA. Estes são representadas/os pela Adufpa, entidade com mais de 40 anos de existência e hoje com 1162 docentes filiadas/os. Do mesmo modo, o “Sindufma”, entidade fundada em 2014, sem qualquer pedido de registro sindical verificado no CNES (Cadastro Nacional de Entidades Sindicais) do Ministério do Trabalho e sem declaração de número de filiados, visa somente dividir a organização dos/das docentes da UFMA, representadas/os pela APRUMA, entidade fundada em 1978 e hoje com 1019 docentes filiadas/os. O “Sindifse”, fundado em 2015, em mais uma tentativa de fracionar bases de outras entidades sindicais, nesse caso, dos/das docentes do Instituto Federal de Sergipe (representadas/os pelo Sinasefe-SE), é uma entidade com apenas 62 filiados e com pedido de registro sindical cancelado pelo Ministério do Trabalho, em reconhecimento à representação legítima daqueles/as colegas pelo Sinasefe-SE. O caso mais vexatório é o do Sindproifes, fundado em 2008: sem registro sindical e sem pedido de registro, sem base declarada de filiadas/os e com pretensão de abarcar qualquer docente que queira se associar a tal iniciativa no território nacional. Além disso, dentre as entidades ligadas à Proifes-Federação, há a presença do Sindicato da Academia da Força Aérea (ADAFA), com sede em Pirassununga, definida como Associação de finalidade apenas “recreativa”.
Em tal conformação, obviamente importa muito pouco o que pensam as/os docentes das Universidades Federais de Goiás, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, Bahia ou Oeste da Bahia, assim como o que pensam as/os colegas do Instituto Federal do Paraná. Basta que os dirigentes da Proifes-Federação realizem pequenos “truques” de manipulação e terão certamente o apoio de seus Conselheiros Deliberativos “fantasmas” para encaminharem todo um conjunto de decisões que contrariem a vontade explícita de suas bases. E tem sido exatamente essa a prática verificada.
Os episódios recentes de desrespeito às decisões da maioria de suas bases e de grave prejuízo ao conjunto da categoria docente da educação federal, que não está organizada em Associações vinculadas à Proifes-Federação, são recorrentes nos últimos 12 anos. Em 2012, naquela que era a maior greve docente federal da história, em número de adesões nas Universidades e Institutos Federais brasileiros, reunindo 58 das 59 universidades do país, a recém-criada Proifes-Federação assinou um simulacro de acordo com o governo. Ignorou o dano que causaria ao conjunto da categoria docente em nível nacional, veementemente contrária às propostas de reordenamento das carreiras do Magistério Superior e da EBTT. Desrespeitou as decisões de suas próprias bases, também majoritariamente contrárias ao PL4.368/2012 e ao que viria a ser a estrutura atual da Lei nº 12.772/2012. Assim, colocou a mobilização docente em uma situação muito difícil, a partir do início de agosto daquele ano. O mesmo gesto de traição, à revelia do conjunto da categoria docente e em contradição às suas bases, seria repetido durante as jornadas de luta da greve docente federal de 2015. Naquele momento, ignorando a gravidade da situação de desfinanciamento da educação pública federal gerada por sucessivos cortes orçamentários, a Proifes-Federação resolve apostar na intransigência do governo, fortemente afetado por uma grave crise econômica. Após o fim do movimento nacional, de modo autoritário e unilateral, decide assinar acordo que condenaria as/os docentes à decomposição salarial ao longo do que viriam a ser os anos dos governos Temer e Bolsonaro (até o fim de 2019), contribuindo para a situação de depreciação salarial em que as categorias hoje se encontram.
Assim, em nada nos deve surpreender a atitude da Proifes-Federação durante o processo em curso. Foi baseado no “cheque em branco” que lhe conferem as entidades “fantasmas”, que o Conselho Deliberativo da Federação arvorou-se a participar da farsa da assinatura do acordo de 27 de maio, hoje impedido por vias judiciais. Tal Conselho decidiu ignorar o fato de que as/os docentes da UFRN, por meio de suas Assembleias e também de plebiscitos; da UFG, igualmente por meio de suas Assembleias e plebiscitos; da UFBA, por meio daquela que foi provavelmente a maior Assembleia presencial de todo o país nos últimos meses; da UFOB e do IFPR, nestes casos, também por meio de Assembleias, rejeitaram a proposta apresentada pelo governo em 15 de maio último.
Para levar a cabo esse ato de vilipêndio da vontade da categoria em seu conjunto e de suas próprias bases, a diretoria da Apufsc, ligada à Proifes-Federação, violou o próprio estatuto, organizando plebiscito sem a discussão e aprovação das questões em Assembleia, incluindo a própria cédula de votação, como dita aquele dispositivo. A votação foi permitida apenas aos/às filiadas/os, o que contraria o direito de ampla representação prefigurado na Lei nº 7.783/1989. Essa define que decisões relativas à negociação coletiva e direito de greve são de interesse de toda a categoria envolvida e não podem ser tomadas ao arrepio de consulta ao conjunto categoria. O resultado foi a adulteração da vontade expressa pela Assembleia dos/das docentes da UFSC, que também haviam rejeitado a proposta que ensejou o pretenso acordo.
Pior ainda foi a imoral exploração das circunstâncias trágicas, relacionadas à crise ambiental em que se viu mergulhado o estado do Rio Grande do Sul, que levaram a diretoria da ADUFRGS, também ligada à Proifes-Federação, a considerar adequado realizar uma Assembleia híbrida, com tão baixa participação. Seus organizadores sequer tiveram a coragem de expor os números de docentes que compareceram, tendo como resultado uma suposta aceitação da proposta e autorização para firmar o acordo, por parte da base da UFRGS, em uma Universidade onde, a bem da verdade, não era possível sequer cogitar uma discussão minimamente ampla e democrática.
Na UFG, em uma assembleia híbrida, a diretoria recusava-se a encaminhar a votação da proposta do governo, desrespeitando os pedidos de encaminhamento nesse sentido e provocando uma confusão generalizada, muito semelhante ao ocorrido na UFSC. Foi apenas após muita insistência que a votação ocorreu, e a proposta do governo foi rejeitada por ampla maioria. Em seguida, a diretoria da ADUFG encerrou bruscamente a assembleia, sem aprovação das questões. No mesmo dia divulgou o plebiscito com duas enquetes separadas: uma sobre a aceitação ou rejeição da proposta do governo, debatida e rejeitada em assembleia; e outra sobre a permanência ou saída da greve, tema não debatido e nem deliberado na referida assembleia. Esta situação ocasionou em um resultado totalmente controverso, com a rejeição da proposta do governo e aprovação da saída da greve.
As formas de agir das diretorias dos sindicatos ligados ao Proifes são as mesmas, usando o estatuto quando convém e o desrespeitando quando assim requer seus interesses. Por esta razão, temos uma campanha nacional de desfiliação. Pelo exposto acima, continuar filiado à Proifes Federação não é mais uma opção, essa Federação não deverá mais agir em nosso nome. Junte-se à campanha: Não em nosso nome!
*Astrid Baecker Avila é professora do EED/CED e Carlos Soares é professor do CCB/UFSC