*Por Nildo Domingos Ouriques
Na AG que decidiu por unanimidade rejeitar a proposta do governo e manter a greve (dia 20/05) apresentei a proposta de uma consulta eletrônica a todos os professores. A proposta foi rejeitada e contou com apenas 9 votos a favor. No dia seguinte, tal como anunciei previamente, tampouco tinha dúvida de que a AG convocada pela diretoria em nome dos filiados da APUFSC (21/05) decidiria sobre a matéria em qualquer circunstância, tal como agora se comprova. A despeito da indignação de alguns e protestos e outros, os atropelos praticados pela diretoria naquela assembleia e da qual se retirou abruptamente deixando o comando para os grevistas, não altera o sentido da disputa que temos sob nossos pés.
A verdade elementar é que nossa greve não conta com adesão completa. É, obviamente, uma greve dividida. Não seria a primeira vez que tal fato ocorre e tampouco a divisão pode necessariamente comprometer eventual vitória ou mesmo impugnar o ritmo lento da adesão que aqui e ali se verifica na UFSC. Uma greve dividida necessita ter como objetivo supremo ganhar a maioria num ambiente marcado pela despolitização, distância ou indiferença da maioria dos professores ao sindicato desde que a APUFSC decidiu a desfiliação do ANDES e assumiu sua entrada no PROIFES.
Num debate convocado pelo CR da APUFSC no dia nacional de luta realizado em outubro passado, fiz uma exposição sobre a ausência de uma real mesa de negociação com o governo. Na mesma oportunidade exibi as razões pelas quais o governo nos trataria a pão e água e as consequências da continuidade da economia política do rentismo conduzida por Haddad sob comando de Lula. O governo anunciou (por e-mail…!!!) que a proposta rejeitada na última AG é definitiva. Não me espanta, mas me obriga e pensar de maneira crítica e não religiosa: para dobrar o governo, precisamos de força na greve! Mais: precisamos estar conscientes que a batalha se desenha longa com todas as consequências que conhecemos bem.
Pois bem, voltemos a nossa AG: a consulta em urna que sugeri foi derrotada pela maioria. A diretoria da APUFSC tal como prevíamos realizaria a consulta em qualquer circunstância! Agora, todos aqueles que negaram a consulta fazem campanha para derrotar a diretoria e ganhar o apoio de todos os professores para exibir o necessário troféu moral da greve: afinal, temos ou não maioria? Eu votarei pela continuidade do movimento. É importante vencer a consulta, mas não cabe fechar os olhos para lição que esta a luz do dia: o desafio da greve é sempre falar em nome da maioria. Caso a maioria rejeite a proposta do governo, ganhamos um reforço moral (mesmo com o voto dos aposentados) e seguimos no desafio de mobilizar a maioria; a vitória não assegura, necessariamente, um salto de qualidade em nosso movimento. Em caso de nossa derrota, qual será a posição da assembleia presencial? Não cabe disputar a urna eletrônica, perder e seguir com a greve. Nesse caso, cometeríamos um grave erro.
Os dois lados – o nosso e o da diretoria – disputam o voto dos aposentados. É grave deficiência, um absurdo mais nesse cenário que se insinua cada dia mais turbulento. Na nossa tradição, aposentados nunca decidiram o futuro de qualquer greve embora jamais o movimento esqueceu ou traiu os aposentados em negociações nacionais. Vários professores – Marcos Ferreira (CFH), Rogério Portanova (CCJ), Lino Peres (CTC) e Geronimo Machado (CSE) – todos da velha guarda e com comprovada fidelidade a nosso sindicalismo, anunciaram publicamente na primeira AG que defendiam a greve, mas não votariam! A razão é óbvia: um professor aposentado não incide sobre o movimento grevista embora possa contribuir com sua militância nos debates e em nossas atividades. O aposentado não paralisa a aula!! É até constrangedor explicitar tal evidencia nessa disputa na qual não creio adequado autorizar o “vale tudo”.
Agora, após rejeitar a proposta da consulta, nós, os que nos alinhamos com o ANDES, estamos participando ativamente da votação promovida pela diretoria quando deveríamos ter assumido a responsabilidade da consulta. No surrado jargão, em qualquer luta, ninguém pode renunciar a hegemonia! Não existia duvida alguma que a diretoria faria a consulta na livre e interessada interpretação do regimento! Nenhuma dúvida! De resto, uma greve ou seu rumo não pode ser decidida pelo advogado da entidade! A razão é simples: a continuidade da greve ou sua interrupção depende da maioria dos professores da ativa e jamais da interpretação do regimento!
Agora, após rejeitar em AG a consulta a todos os professores, estamos todos votando e esperando o resultado da urna eletrônica! Não se trata de uma ironia do destino. É uma lição de que não podemos renunciar o apoio da maioria! Não podemos falar em nome da maioria se não somos maioria. Esse é o desafio ético de nossa greve! É um desafio político profundo que não pode ser mudado com interpretação jurídica ou com decisão judicial do regimento, com a idealização das assembleias presenciais e menos ainda com atos violentos num determinado momento da disputa. Tampouco basta vencer a eleição da entidade no segundo semestre pois sem qualidade militante e novo horizonte político-intelectual, a APUFSC não passa de um aparelho sem vida e capacidade de intervenção real na vida da maioria. Não cabe, agora, atuar na greve com um olho exclusivo na disputa pelo sindicato. A prioridade é ganhar a maioria dos professores para uma greve que se insinua longa e difícil. Nesse contexto, toda manobra destinada a eludir a busca da maioria deve ser rejeitada. Não é muito, mas é tudo que podemos fazer aqui e agora. Afinal, não será de maneira repentina e com pequenos artifícios que lograremos a autoridade política nessa greve e a alteração qualitativa de nosso movimento.
*Nildo Domingos Ouriques é professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)