UFSC Curitibanos prepara catálogo com milhares de amostras de solo catarinense

Ação faz parte do projeto de pesquisa “Aplicação de modelos de aprendizagem via máquina de dados de sensoriamento proximal do solo”

Tem biblioteca, videoteca, discoteca, brinquedoteca e até cinemateca – embora, convenhamos, algumas em desuso. Em breve também vai ter, pelo menos em Santa Catarina, a soloteca. Oriundo do grego Theke, teca significa um lugar de guardar, um depósito, receptáculo. Biblioteca é para livros; videoteca, vídeos; discoteca, discos; brinquedoteca, brinquedos; e soloteca, claro, solos.

Cofinanciado pela Bayer e com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu) na gestão de recursos, o projeto de pesquisa Aplicação de modelos de aprendizagem via máquina de dados de sensoriamento proximal do solo, desenvolvido na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), está identificando e catalogando 6 mil amostras de solo catarinense originalmente coletadas pela Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) no programa Microbacias 2.

O projeto é apoiado pela Bayer por meio do programa Grants4Ag, uma iniciativa anual da empresa alemã que oferece financiamento e experiência a pesquisadores que desenvolvem novas soluções para a agricultura. A proposta inclui a redução de carbono na agricultura ao incentivar o aumento dos teores de matéria orgânica nos solos agrícolas.

“A matéria orgânica está diretamente relacionada à melhoria de qualidade do solo com a disponibilidade de nutrientes para as plantas, assim como a resiliência das plantas a secas está ligada à maior oferta de água no solo”, explica Alexandre ten Caten, coordenador do projeto e professor de Geoprocessamento no Programa de Pós-Graduação em Ecossistemas Agrícolas e Naturais no Campus de Curitibanos da UFSC.

O projeto foi um dos 21 escolhidos entre mais de 350 propostas apresentadas por pesquisadores de todo o mundo e submetidas à avaliação ao longo do ano de 2021. O anúncio dos vencedores foi feito em janeiro de 2022. “Como nosso projeto pesquisa novas e inovadoras metodologias para a caracterização dos solos agrícolas, isso permitiu que o projeto fosse financiado pela Bayer”, conta o professor ten Caten.

Ciência de solo

Farão parte da soloteca, além 6 mil amostras de solo armazenadas em pequenos recipientes, os dados analíticos, resultados de análises química e física das amostras e, também, os dados espectrais de cada uma das amostras coletadas por um radiômetro. “Estas amostras estão sendo catalogadas, identificadas e lidas pelo radiômetro para que possamos incorporá-las em nossos modelos preditivos. Estamos criando o que se denomina em ciência de solo de uma soloteca”, explica o professor.

Para realizar uma correta adubação da lavoura, o agricultor precisa antes fazer uma análise do solo. Hoje, as análises são realizadas em laboratórios e baseadas em reações químicas, quando são produzidos rejeitos nocivos ao ambiente. Além disso, as avaliações laboratoriais também são consideradas demoradas, custosas e que demandam muita mão de obra.

“Por isso, buscamos aplicar sensores para escanear as amostras do solo e processar os dados por algoritmos de aprendizagem de máquina. Com isso, vamos gerar informação de forma limpa, rápida, com automatização e por uma fração do custo atual”, detalha o coordenador do projeto. “Com a pressão crescente para a produção de alimentos de forma mais eficiente e o reconhecimento da importância do solo como sequestrador dos gases de efeito estufa, a demanda por dados do solo está em crescimento. Logo, é importante que sejam desenvolvidos novos métodos para a caracterização dos solos agrícolas”, observa.

Agricultura 4.0

A meta do projeto é desenvolver um método inovador para a caracterização dos solos via técnicas alinhadas com os preceitos da agricultura 4.0. “Queremos empregar um método digital, por sensores e com processamento dos dados por métodos de aprendizagem de máquina (machine learning) em nuvem, e com o envio dos resultados diretamente para o celular do agricultor”, ressalta o professor, que possui mestrado e doutorado em Ciência do Solo.

No projeto, as coletas de amostras de solos são enviadas ao laboratório onde um espectrorradiômetro opera no visível e infravermelho para coletar o dado da reflectância das amostras de solo. Sobre a amostra de solo, é incidida uma fonte luminosa de energia padronizada. A seguir, o radiômetro irá coletar a resposta refletida pela amostra de solo e traçar uma curva espectral da amostra. “Estamos utilizando técnicas de aprendizagem de máquina para encontrar padrões na curva espectral de cada amostra de solo, e com isso gerar modelos preditivos que associem uma determinada característica espectral com características da amostra de solo. Por exemplo, podemos definir os teores de matéria orgânica, bem como a concentração de argila e areia nas amostras de solo analisadas”, detalha o docente.

Os trabalhos de identificação, catalogação e armazenamento de cada uma das amostras da soloteca são realizados na Fazenda Experimental Agropecuária do Centro de Ciências Rurais do campus de Curitibanos da UFSC. O projeto tem a participação de pesquisadores desde estudantes de iniciação científica até de pós-doutorado que atuam no Laboratório de Geomática da UFSC no Campus de Curitibanos.

Inovação

A partir dos estudos desenvolvidos pela equipe de pesquisa, o projeto já ganhou um desdobramento. Desde 2021, o grupo atua junto com o Sinova UFSC, o Departamento de Inovação da Universidade, para criar uma startup que leve o conhecimento da bancada do laboratório para uma aplicação prática na sociedade – no caso, uma tecnologia inovadora para a caracterização dos solos dos agricultores.

No ano seguinte, em 2022, a equipe trabalhou, via programa Catalisa ICT do Sebrae, para a criação da startup SensorGreen e, em 2023, a iniciativa teve continuidade por meio do Programa IA² do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e da Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex). “Nossa expectativa é a de que nossa pesquisa possa ser aplicada na criação de um CNPJ de valor agregado e que contribua para uma agricultura mais moderna e sustentável”, destaca o professor.

Fonte: Notícias UFSC