Por Julian Borba*
Ao acompanhar as propostas das duas candidaturas que foram ao segundo turno na última eleição para a Reitoria da UFSC, tive a oportunidade de escrever à época uma breve reflexão sobre o pleito em questão. Circulei o texto entre alguns colegas e o enviei às respectivas coordenações de campanha. Em essência, meu argumento era que o processo eleitoral na Universidade havia se transformado em um modelo “centrão” de fazer política, porém, ao contrário desse grupo, aqui não tínhamos um
orçamento secreto para administrar. Cito uma breve passagem do texto:
“Me dei ao trabalho de ler e ouvir as propostas dos candidatos e candidatas, e o que temos é um festival de generalidades corporativistas (e populistas)! Coisas do tipo: vamos conseguir novos códigos de vagas docentes! 30 Horas! Café da manhã no RU! Teletrabalho! Eu fiquei pensando se estou vivendo no mesmo mundo e na mesma instituição de tais candidatos(as).
No momento em que estamos precisando mostrar à sociedade nossa relevância institucional, dar respostas aos desafios do presente e ajudar a pensar o futuro, assistimos a um simulacro de debate eleitoral em que os postulantes ao cargo máximo mais se parecem a políticos do centrão distribuindo o orçamento secreto para suas bases do que futuros reitores de uma das mais importantes Universidades brasileiras. A diferença é que os primeiros têm orçamento secreto para distribuir!”
Transcorrido mais de um ano da atual gestão da Universidade, cabe o questionamento: será que a avaliação acima estaria equivocada? Parece que não! As várias matérias e artigos publicados neste espaço sobre os problemas nas Unidades acadêmicas, a situação calamitosa de espaços importantes do Campus, como a BU e, especialmente, as recentes notícias amplamente veiculadas pela imprensa sobre furtos, caso de sequestro relâmpago e o “filme de terror” que é circular pela UFSC no período noturno, evidenciam uma Universidade imersa numa enorme crise de infraestrutura (e de gestão), após uma Pandemia e quatro anos da destruição bolsonarista.
E quais foram as principais ações administrativas anunciadas pela reitoria até o momento? Cito algumas: o teletrabalho, a flexibilização da jornada de trabalho e a proposição de uma “Resolução de festas”! A mais recente ideia “fora do lugar” parece ser o tal “muro” de proteção (já desdito pela Administração Central!), como se o cercamento do campus fosse capaz, num passe de mágica, de resolver nossos problemas internos. Interessante que tal notícia do muro venha acompanhada de notas na imprensa local sobre a ronda policial, nas quais o prefeito sugere que professores (somente professores, observem!) estariam incomodados com essa iniciativa. Sempre é mais fácil terceirizar os problemas!
Ao invés de enfrentar os graves e urgentes problemas que nos afligem, se coloca em prática uma conhecida “tradição” institucional: a distribuição de benesses para certos setores da Universidade, que se transformam em base de apoio. É importante que a comunidade universitária problematize o quanto esse modelo está na raiz das disfunções político-administrativas e na crise de infraestrutura pelas quais estamos vivenciando.
Os descompassos entre a realidade do campus e o discurso da Administração Central são gritantes. No discurso oficial vivemos num mundo de Alice, onde palavras bonitas são constantemente ditas sobre inclusão e igualdade. Editais vazios de recursos, mas cheios de boas intenções são lançados! Enquanto isso, a escuridão domina no Campus, sequestros relâmpagos acontecem e luminárias despencam na cabeça de discentes, mostrando que os problemas da Universidade não se resolverão apenas com discursos ao vento e teletrabalho!
Creio que chegamos a um ponto de esgotamento desse estilo populista de gerir a UFSC. Afinal, as paredes estão literalmente desabando sobre nossas cabeças! Romper com esse modelo é tarefa urgente e necessária, porém sabidamente difícil. Sempre é mais fácil e cômodo propor “almoço grátis” do que enfrentar os problemas institucionais com a complexidade exigida.
A gestão em curso tem a legitimidade das urnas e quase três anos de mandato pela frente para mostrar que está à altura dos desafios institucionais. Resta saber se tem vontade!
*Professor do Departamento de Sociologia e Ciência Política da UFSC