Justiça Federal havia pedido comprovação de que as falhas na correção do Enem 2019 tinham sido sanadas; presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, atendeu pedido do governo e derrubou decisão
O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, atendeu na terça-feira (28) ao pedido do governo federal e liberou a divulgação dos resultados do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e os próximos passos do processo seletivo com base no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2019.
Na sexta-feira (24), a Justiça Federal em São Paulo havia determinado que o processo deveria ser suspenso assim que se encerrassem as inscrições para concorrer a vagas em universidades públicas – o prazo terminou na noite deste domingo (26).
Na prática, isso fez com que o resultado do Sisu não fosse divulgado na manhã desta terça-feira (28), como previsto inicialmente. Na decisão, Noronha diz que o adiamento desses prazos pode prejudicar todo o ano letivo nas universidades públicas.
“(…) é inegável que a suspensão de qualquer fase do SISU impacta não apenas a etapa interrompida mas também as subsequentes, já que interdependentes. Nesse contexto, pode impedir a organização e a concretização do calendário acadêmico, bem como a formação de turmas; se perdurar, pode até mesmo impactar o ano universitário”, afirma.
Além disso, com a decisão da Justiça de São Paulo o governo havia suspendido o início das inscrições para o Programa Universidade para Todos (Prouni), que concede bolsas parciais e integrais em universidades privadas.
Isso porque o cronograma prevê que o Prouni começa logo após a divulgação dos dados do Sisu, justamente para evitar que candidatos com vaga nas instituições públicas tentem bolsas nas privadas.
Com a decisão de Noronha, o governo poderá divulgar o resultado do Sisu e definir novas datas para o Prouni. Até a última atualização desta reportagem, o Ministério da Educação ainda não tinha informado novos cronogramas para esses processos seletivos.
Razões da decisão
Para o presidente do STJ, “são evidentes e graves as consequências danosas” de suspender o processo. “Já são milhares os estudantes apreensivos, sem saber para qual curso foram selecionados e em qual instituição de ensino ingressarão. Suas famílias, obviamente, também estão ansiosas sem saber para onde seus filhos irão.”
João Otávio de Noronha disse que o MEC e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão responsável pelo Enem, “pecaram pela deficiente comunicação com a sociedade em geral e, em específico, com os órgãos encarregados da defesa dos interesses difusos e coletivos”. Neste ponto, ele citou o Ministério Público e a Defensoria Pública.
O presidente do STJ declarou, por outro lado, que não se verifica, na análise dos autos, lesão aos estudantes.
“Ao analisar, brevemente, a documentação ora apresentada e as alegações do autor da ação originária considerando os contra-argumentos da União, vê-se que nada de errado ou lesivo aos estudantes que se supõe tenha ocorrido, de fato, ocorreu. Ou seja, ao que se percebe, a falha inicial foi prontamente sanada pela própria administração, sem que fosse necessária, inclusive, a atuação mediadora ou corretiva do Judiciário ou dos órgãos de defesa da sociedade.”
Noronha afirmou ainda que a falha na correção atingiu “estatisticamente, percentual mínimo se comparados com o universo global dos participantes do Enem de 2019” e que isso não pode servir para impedir o acesso de estudantes às universidades.
“Se erros pontuais e individuais houve, certamente que devem ser sanados pelas vias próprias. Contudo, a simples possibilidade de rever nota específica não pode servir de substrato para impossibilitar o acesso de milhares a vagas já ofertadas e o início das atividades acadêmicas nas mais variadas entidades públicas e privadas.”
Erro na nota do Enem
A disputa judicial começou depois que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, e o presidente do Inep, Alexandre Lopes, admitiram que houve “inconsistência” na correção dos gabaritos das provas aplicadas em 3 e 10 de novembro do ano passado.
Lopes disse que o erro ocorreu na gráfica onde foi impresso o caderno de questões do candidato, que é identificado com um código de barras do aluno. Depois, imprime-me o cartão de respostas (gabarito), que também tem um código. Outra máquina une estes dois documentos. O erro ocorreu nesta união e na geração do código de barras.
O resultado foi que candidatos que fizeram a prova de uma cor tiveram o gabarito corrigido como se fosse de outra cor. Com a associação de respostas erradas, houve candidato que perdeu até 454 pontos na correção, comparando com o resultado de 2018.
Depois que a Justiça Federal suspendeu o processo e ordenou que o governo comprovasse que resolveu o problema, a Advocacia Geral da União (AGU) recorreu, mas teve o pedido negado na noite do último domingo (26).
Para a presidente do TRF-3, os entendimentos da Justiça Federal de São Paulo “nada mais fizeram do que proteger o direito individual dos candidatos do Enem a obterem, da administração pública, um posicionamento seguro e transparente a respeito da prova que fizeram”.
A desembargadora Therezinha Cazerta afirmou ainda que a situação provocou uma “crise” de “confiabilidade” em relação ao Enem. E que o governo não pode se recusar a dar uma “satisfação transparente”. Diante da decisão, a AGU recorreu ao STJ na segunda-feira (27).