Imunizante contra a Covid-19 requer temperatura de -70°C; equipamentos demandam cuidados específicos e podem armazenar até 500 litros de amostras
Na reta final de 2020, o assunto destaque são as vacinas contra a Covid-19. Passados mais de nove meses desde os primeiros casos da doença no Brasil, as pesquisas relacionadas aos imunizantes se aproximam das últimas fases.
A ânsia pela vacinação é grande, afinal são mais de 4.400 mortos e 432 mil casos confirmados de Covid-19 só no Estado de Santa Catarina. Dentre as mais de 200 vacinas em desenvolvimento no mundo, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), algumas parecem estar mais próximas de desembarcar em solo brasileiro.
Uma delas é a vacina BNT162 desenvolvida pela norte-americana Pfizer e sua parceira alemã BioNTech. Na última quinta-feira (10), o governo federal assinou um memorando de entendimento com a Pfizer. Ele prevê, inicialmente, 8,5 milhões de doses no primeiro semestre de 2021 e 61,5 milhões no segundo semestre. São necessárias duas doses para imunizar um paciente contra a Covid-19.
Contudo, para pisar de vez no Brasil, ainda é preciso o registro ou a autorização emergencial da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Com o registro em mãos, surge outra preocupação: o armazenamento. Diferente das vacinas da CoronaVac, AstraZeneca e Johnson & Johnson, que demandam temperaturas de 2° a 8°C, compatíveis com as das vacinas já existentes no país, a da Pfizer requer um ambiente de -70°C.
Sendo assim, o armazenamento exige o uso de ultracongeladores, que não são comuns nos laboratórios e unidades de saúde dos estados. Equipamentos desse tipo podem ser encontrados na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). O Lameb (Laboratório Multiusuário de Estudos em Biologia) do CCB (Centro de Ciências Biológicas), em Florianópolis, mantém 16 aparelhos em uma sala.
A presença desses equipamentos na Universidade foi mencionada pelo consultor em saúde da Fecam (Federação Catarinense dos Municípios), Jailson Lima, durante a cerimônia que oficializou o interesse da entidade na compra da vacina CoronaVac. Ele destacou a dificuldade da logística da vacina da Pfizer. Para entender o funcionamento e as características dos ultrafreezers, o ND+ conversou com o presidente do Lameb, professor Geison de Souza Izídio.
Sala fria
Os 16 ultracongeladores são mantidos pelo Lameb em uma sala fria localizada no piso térreo do CCB, onde também são armazenados botijões criogênicos. A sala é chamada assim não apenas pela característica dos equipamentos que abriga, mas também, porque possui cinco aparelhos de ar condicionado espalhados pelas quatro paredes do ambiente e nunca são desligados.
Acionados em uma temperatura de 19°C, os aparelhos auxiliam a manter o ambiente sempre gelado. Isso porque os motores dos ultrafreezers geram muito calor e uma sala em temperatura ambiente poderia trazer danos aos materiais biológicos armazenados. Além disso, a sala fria possui gerador próprio, o que garante que uma eventual queda de energia não prejudique o armazenamento.
Os ultracongeladores são propriedade de pesquisadores do CCB que os adquiriram de acordo com critérios estabelecidos pela direção. O Lameb é responsável por gerenciar a sala. Apesar de o laboratório ter sido criado em 2008, a sala fria é mais recente. O professor Izídio conta que alguns dos freezers da sala ficavam em diferentes laboratórios. A centralização dos equipamentos em um só ambiente partiu de uma política adotada pelo CCB.
Capacidade de armazenamento e temperatura
Os equipamentos do Lameb são de diferentes marcas. De acordo com o professor Geison, os tamanhos variam dependendo da marca e do modelo. No entanto, a maioria dos ultrafreezers tem em torno de 2 metros de altura e, fisicamente, se assemelham a uma geladeira doméstica. Alguns podem custar mais de R$ 300 mil.
A capacidade de armazenamento também varia conforme o modelo, mas a média fica em torno de 400 a 500 litros por freezer. O professor Geison explica ainda que a capacidade de cada aparelho depende da manutenção que é feita.
“Cada vez que abrimos os freezers, de certa maneira, ganham umidade e vai formando uma camada de gelo dentro. Com o passar dos anos, a falta de descongelamento diminui um pouco a capacidade em litros de cada um deles”, diz. Com relação à temperatura, os aparelhos podem atingir até -86°C. O nível de temperatura de, pelo menos -80°C, é necessário para preservar a integridade das amostras biológicas.
Capacidade para armazenar vacinas
O professor Geison diz que os ultracongeladores do Lameb podem armazenar vacinas que precisem de uma temperatura de até -80°C. O armazenamento, contudo, dependeria da realocação das amostras biológicas existentes em cada um dos aparelhos. A quantidade de vacinas armazenadas nos equipamentos depende do formato do frasco da substância.
Ele conta que desde que preside o laboratório, não há conhecimento sobre o armazenamento de grande quantidade de vacina no local, “mas nada impediria isso. Seria uma questão de alinhar com as organizações superiores, a diretoria do CCB e os pesquisadores que detêm os freezers”.
Compra de ultrafreezers para o Lacen
Em entrevista ao ND+ no dia 4 de dezembro sobre a logística para a chegada da vacina em Santa Catarina, o secretário estadual de Saúde, André Motta Ribeiro informou que ultracongeladores para temperaturas de até – 86°C estão sendo adquiridos para o Lacen (Laboratório Central de Saúde Pública) com o custo total de R$ 157.200. O secretario destacou que vem estruturando uma rede de frios mais adequada no Estado.
“Claro que a prioridade se for o caso, se nós tivermos opção, se o Ministério da Saúde nos der a opção, vamos tentar utilizar vacinas que se adaptam melhor ao país tropical como o Brasil. Vacinas que possam utilizar de refrigeração temperaturas menos agressivas como essas, mas dependendo da forma, nós estamos preparando também a rede de frios para essa possibilidade”, disse Motta na ocasião.
A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Estado da Saúde para saber mais informações sobre o processo de aquisição dos ultracongeladores para o Lacen, mas não obteve retorno até a publicação.
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