A favor do corte de gastos, parte da equipe econômica recebe mais do que o estipulado para funcionários públicos
Integrantes da cúpula do Ministério da Economia recebem quantias superiores ao previsto por lei pelo teto do funcionalismo público por meio de honorários por participação em empresas estatais, que vão de R$ 2.700 a R$ 14 mil. Esses membros, entretanto, defendem reformas e cortes de gastos, mesmo que os ganhos acima do teto sejam incondizentes com tais propostas.
O teto é extrapolado por meio de jetons , que são pagamentos feitos a parlamentares que participem de reuniões de conselhos. Por não serem tidos como salário, não fazem parte da conta que ultrapassa o limite máximo de recebimento de um funcionário público federal. Este limite é compatível ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Visando a redução de gastos com funcionários, o governo apresentou ao Congresso , no início do último mês, uma proposta de reformulação do serviço público no país. Essas despesas reduzem a verba para investir em programas sociais, conforme crescem.
A proposta, entretanto, não prevê mudanças nas regras para os servidores atuais e tampouco altera o recebimento de honorários por participação em reuniões de conselho de estatais , nem mesmo para novos funcionários.
O ministro da Economia, Paulo Guedes , não recebe jetons, mas possui um salário de R$ 30,9 mil por mês, inferior ao de servidores da área econômica no topo da carreira.
No entanto, a lista de membros de alto escalão do Ministério da Economia que recebem jetons. O segundo em comando, o secretário-executivo, Marcelo Guaranys, por exemplo, possui salário bruto de R$ 37,8 mil, mas recebe também R$ 7.000 de jetons da PPSA , empresa pública que opera a parte da União no pré-sal.
O secretário-adjunto de Desburocratização e Gestão , Gleisson Rubin, também aumenta seus ganhos através destes honorários. A Casa da Moeda e a Finame (Agência Especial de Financiamento Industrial) são responsáveis por um acréscimo de R$12,5 mil em seus ganhos. Gleisson é o principal técnico em defesa da reforma administrativa .
Fazem parte da lista, também, os secretários George Soares (Orçamento), Waldery Rodrigues (Fazenda), Carlos da Costa (Produtividade e Emprego), Bruno Funchal (Tesouro), Bruno Bianco (Previdência e Trabalho), Bruno Dalcolmo (Trabalho), Cristiano Rocha Heckert (Gestão), Diogo Mac Cord de Faria (Desestatização) e Martha Seillier (Programa de Parcerias de Investimentos).
Com salários brutos variando entre R$ 15,4 mil e R$ 37,8 mil, eles possuem renda em jetons de R$ 2.700 a R$ 14 mil . No início do mês de setembro, em meio a um debate sobre a reforma administrativa, o ministro Paulo Guedes defendeu o aumento do teto do funcionalismo para mais de R$ 39,3 mil, visando valorizar a meritocracia e manter os bons profissionais no serviço público.
Procurados pelo jornal Folha de S. Paulo, os secretários responderam, através da assessoria de imprensa do Ministério da Economia , que a remuneração em conselhos é prevista por lei.
Questionado sobre a incoerência entre o pagamento de um “extra salarial” , que em certos casos infla o contracheque, e a proposta da equipe econômica a favor da austeridade fiscal, o Ministério da Economia afirmou que os jetons são “prática de mercado, seja público, seja privado, e é devido à sua responsabilidade e aos riscos do dever de diligência”.
De acordo com a pasta, o motivo da presença de membros representantes da União nos conselhos e fiscalização das estatais é a garantia de congruência entre as empresas e o governo, facilitando a governância.
Segundo o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, fazer parte dos conselhos administrativos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e do Banco do Brasil , acarreta um aumento significante na carga de trabalho. Waldery Rodrigues recebe, em valores brutos, R$ 8.100,68 e R$ 5.948,54 de jetons dessas estatais, respectivamente.
O secretário afirma que tal pagamento está alinhado com as responsabilidades e riscos da ocupação. Estes são: orientações gerais dos negócios da companhia, fiscalização da gestão de diretores e das contas da administração e algumas outras atividades.
No governo do ex-presidente Michel Temer (MDB), houve a tentativa de aprovar no Congresso uma proposta que mudaria o conceito de teto salarial no serviço público, fazendo com que a soma do salário bruto e dos jetons não pudesse ultrapassar o limite, que atualmente é de R$ 39,3 mil.
Diante das notícias evidenciando que ministros do governo Temer não seguiam a regra proposta, o então ministro de Planejamento , Dyogo Oliveira, abdicou de sua vaga no conselho fiscal do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) e do honorário recebido, que, atualmente, chega a R$ 21 mil por mês.
A ação de Oliveira foi uma tentativa de evitar que o plano de cortar supersalários travasse. A proposta, entretanto, não foi pra frente. Cerca de R$ 1 bilhão por ano seria poupado do orçamento caso a medida fosse aprovada, de acordo com os dados da época.
Contatado pelo jornal Folha de S. Paulo, o Ministério da Economia não se pronunciou sobre possíveis pretensões de revisar o pagamento de jetons para evitar travar a discussão da reforma administrativa. O governo, até então, enviou apenas a primeira fase do projeto de reformulação do funcionalismo, uma PEC (proposta de emenda à Constituição).
A equipe de Guedes segue trabalhando nas outras etapas do plano, como projetos de lei que visem criar regras para calcular o teto salarial do serviço público. Esse tipo de projeto de lei foi inclusive utilizado por Temer para o mesmo propósito.
Fonte: Brasil Econômico