Levantamento feito pelo Andes-SN indica pelo menos oito invasões cibernéticas nos últimos meses
Com o uso mais frequente das plataformas virtuais nas universidades, professores e estudantes têm sido alvo de ataques cibernéticos, durante reuniões, seminários, debates, aulas e até mesmo apresentações de trabalhos de conclusão de curso.
O Andes-Nacional fez um levantamento dessas invasões nas instituições de ensino. Em comum, segundo a reportagem, a maioria dos ataques tem caráter racista, misógino, machista e fascista, fazendo referência à suástica, xingamentos de cunho racial e lgbtfóbicos e exibição de filmes pornográficos, entre outros. Houve ainda menções ao presidente da República, Jair Bolsonaro.
Na manhã do dia 29 de julho, por exemplo, a Assembleia Geral Universitária da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), em ambiente virtual, foi alvo de um ataque cibernético. A reunião, convocada conjuntamente por docentes, técnicos e estudantes, tinha como objetivo discutir a possibilidade do retorno das aulas em ensino remoto. O debate acabou suspenso.
“Esses ataques virtuais mostram o quanto são frágeis esses ambientes virtuais, e apontam ao que poderão estar expostos estudantes e docentes”, diz Antonio Gonçalves, presidente do ANDES-SN, “Além de lidar com todas as dificuldades de infraestrutura, acesso, organização de tempo, e também questões subjetivas, a comunidade acadêmica também está exposta a interrupção das atividades e ao impacto emocional negativo que essas agressões têm, em especial contra mulheres, negras e negros, indígenas, quilombolas e lgbts.”
Segundo levantamento realizado pela imprensa do ANDES-SN, ao menos oito universidades registraram ataques a atividades acadêmicas. Na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), em 15 de julho, a apresentação de um trabalho de conclusão de curso da Faculdade de Direito foi alvo de agressões homofóbicas. O TCC abordou discursos de ódio e a criminalização da homotransfobia.
Após a apresentação inicial, a fala do primeiro avaliador foi interrompida por gemidos de conotação sexual. Logo depois, passaram a soprar fortemente os microfones. Em seguida, duas pessoas desconhecidas ligaram as câmeras. Por fim, reproduziram áudios do presidente Jair Bolsonaro em entrevistas concedidas quando ainda era deputado federal. “O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro, ele muda o comportamento dele”, dizia Bolsonaro, então parlamentar, em um dos áudios.
Semanas antes, em 6 de julho, uma palestra da disciplina de Vigilância e Segurança Alimentar e Nutricional do curso de Nutrição da UFSM, com o tema “Saúde e Nutrição da População Negra”, também foi cancelada após ataques virtuais. A aula pública ocorria pela plataforma virtual Google Meet, quando, em meio às discussões, uma dezena de pessoas solicitou entrada na sala e passou a promover uma série de entraves ao andamento da palestra. Depois, ligaram o microfone e passaram a desferir frases de deboche e ameaças contra os participantes. O incômodo foi tamanho que a aula foi encerrada.
Em junho, um ciclo de palestras promovido pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) foi interrompido por agressões com palavras de baixo calão e compartilhamento de imagens de teor pornográfico, forçando a interrupção momentânea da atividade.
No mesmo mês, um debate sobre negritude com professores da Universidade Federal da Bahia (UFBA) foi interrompido por imagens de conotação racista. A reunião foi suspensa após não conseguirem retirar os invasores da sala virtual, que comemoraram a decisão aos gritos de “mito, mito” – em referência ao presidente Jair Bolsonaro.
Em 8 de junho, o webinário Atlântico Negro, organizado por professores da Universidade de Campinas (Unicamp), foi invadido ” de forma massiva por vozes e imagens que impediram o direito de fala da professora da Unicamp, dra. Lucilene Reginaldo, bem como de todos que acompanhavam a atividade, numa clara agressão à missão que a sociedade entregou à universidade de produzir conhecimento e difundi-lo de forma livre e democrática”, repudiou, em nota, a universidade.
No mesmo dia, um evento organizado pelo centro acadêmico da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) foi “alvo de uma invasão promovida por um grupo neonazista durante o evento do Conhecendo o CACO na plataforma Zoom”. “Diante de imagens nazistas, vídeos de pornografia e fotos de pessoas mutiladas exibidas em nossa reunião com calouros e calouras, vimos necessidade em levar a ocorrência às autoridades competentes”, disse o centro, em nota.
Ainda naquele mês, uma videoconferência sobre a História da África realizada pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) foi invadida com desenhos, pornografia e áudios de conteúdo de extrema-direita. Na Federal de Minas Gerais (UFMG), um debate virtual sobre saúde sexual e reprodutiva, maternidade e raça também foi alvo de ataques.
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