Num país em que a maioria das famílias de classe média ou alta vê o ensino privado como única opção, uma parcela desse grupo foge à regra e matricula os filhos em escolas públicas. Muitos procuram algo que os colégios particulares, por serem pagos, são incapazes de proporcionar: um ambiente diversificado, onde convivem alunos de vários níveis socioculturais.
Foi esta a opção de Andréa Beltrão, atriz que interpretou uma professora no filme “Verônica”, lançado neste ano.
Mãe de três filhos, ela diz que a escolha foi natural. “Eu estudei em escola pública. Minha mãe deu aula no Pedro 2º [colégio federal no Rio]. Por isso, quis para meus filhos uma escola em que o critério de entrada não fosse o dinheiro”, diz.
Casos como o dos filhos de Andréa ainda são minoria nas famílias mais ricas.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE, tabulados pela Folha, mostram que em 2007 apenas 16% das crianças nas famílias de maior renda (mais de cinco salários mínimos per capita) estudavam em escolas públicas. Em 2001, eram 12%.
Como não abre mão da qualidade, esse movimento da classe média em direção à escola pública ainda é restrito aos poucos estabelecimentos estatais que conseguem manter alto padrão de aprendizagem.
É o caso da escola municipal Minas Gerais, no Rio, incluída em 2006 numa lista do Ministério da Educação e do Unicef de escolas públicas modelo. Além de atender crianças mais pobres, a escola atrai uma parcela da classe média, como o funcionário público Luiz Eduardo Ricon. Seus dois filhos, de nove e 14 anos, estudavam num colégio particular até o ano passado.
“O problema não era a mensalidade. Eu e minha mulher achávamos que o melhor para eles era estudar numa escola que fosse representativa da cidade em que vivem, pois, no futuro, vão trabalhar e conviver com todos, e não apenas com pessoas de classe média que pensam como eles”, diz Ricon.
Ensino mais valorizado – Em São José dos Campos (SP), o professor Túlio Lopes Cunha conta uma história parecida. Suas duas filhas, de três e nove anos, estudam hoje na rede municipal da cidade. A mais velha, no entanto, veio de uma escola particular onde a mensalidade custava R$ 430.
“Levei em conta também a questão financeira, mas só matriculei minha filha mais velha nessa escola depois que vi que ela ficou bem acima da média”, diz Cunha, citando o Ideb, índice do MEC que monitora a qualidade da educação pública e que mostrou que a escola Jacyra Baracho estava entre as 20 melhores de São Paulo.
Até o momento, ele diz que não teve motivos para arrependimento. “Minha filha se adaptou muito bem. Está se sentindo até mais acolhida. Pela minha experiência como professor, sei que muitos pais de escolas particulares acham que a educação se resume a pagar uma escola. Na rede pública, aprende-se a valorizar mais o ensino”, afirma Cunha.
Outra vantagem adicional citada por pais que optaram pela rede pública é a mudança em hábitos de consumo.
“A pressão consumista diminui bastante, pois não existe tanto essa coisa de eles quererem usar na escola calça de marca ou tênis da moda”, conta a engenheira Ana Cristina Nori, que tem um filho na escola municipal Minas Gerais e outro que estudou lá no ensino fundamental.
Nori diz não se abalar quando ouve o argumento de que seus filhos poderiam estar na rede particular, liberando a vaga para alunos mais pobres.
“Eu pago impostos e tenho os mesmos direitos que qualquer outro cidadão. Sempre estudei em escola pública e acho que, se a classe média não tivesse abandonado a escola pública quando ela começou a piorar, hoje, certamente, a situação do ensino não seria tão ruim.”