Pela primeira vez, um país do hemisfério Sul irá sediar a Conferência Internacional de Educação de Adultos, que teve sua primeira edição em 1949, em Elsinore (Dinamarca). A 6ª Confintea (www.unesco.org/en/confintea) será realizada no Brasil, em Belém, no Pará, entre os dias 19 e 22 de maio, e deverá receber delegações de pelo menos 170 países-membros da Unesco -de um total de 193. A capital paraense é exemplo de um dos maiores desafios mundiais: a promoção do desenvolvimento humano a partir de paradigmas de sustentabilidade.
A educação de jovens e adultos é um dos fundamentos para o desenvolvimento das nações. O saber -desde sempre um valor essencial-, diante da globalização, em algumas circunstâncias, se torna moeda. A atual crise global reforça a necessidade de uma agenda mundial que contemple a criação de políticas nacionais com financiamento assegurado e ações de monitoramento e avaliação para respaldar tanto os investimentos internos, de origem pública ou privada, quanto a ajuda internacional para os países que dela precisam.
É imprescindível que o ensino destinado à população jovem e adulta esteja alinhado a outras agendas internacionais, como as Metas de Educação para Todos e as Metas do Milênio, com as quais o Brasil está comprometido. Educação de adultos tem forte interface com questões-chave capazes de melhorar a qualidade de vida mundial, como a erradicação da fome e da pobreza.
Em uma sociedade globalizada em que populações desfavorecidas protagonizam a versão moderna do êxodo em busca de uma vida digna, o acesso ao conhecimento necessita ser democratizado. Os grupos de imigrantes, migrantes e refugiados que, muitas vezes, ao mudar de território, se deparam com profundas diferenças socioculturais também precisam de políticas públicas articuladas. É essencial dotar os jovens e os adultos de um repertório pessoal que os permita participar plenamente do contexto social em que vivem. Só assim os processos educativos contribui-rão, de fato, para a promoção do desenvolvimento integral.
A última Conferência Internacional de Educação de Adultos, realizada em Hamburgo (1997), é considerada um marco para esse debate por ter estabelecido um entendimento integral do processo como parte indissociável de uma visão ampla de educação ao longo da vida (“life-long learning”).
A partir da Conferência de Hamburgo, a educação de adultos foi considerada como um direito do cidadão e não como benesse ou concessão. Sem dúvida, um dos principais desafios da conferência do Brasil é estimular o poder público de todos os países-membros da Unesco a passar da retórica, sempre presente em discursos, para ações concretas e mensuráveis.
Ao final do encontro, será aprovado um documento que traça o panorama da educação de adultos, aponta linhas de ação regionais e faz recomendações para seu avanço. As conferências internacionais, especialmente as intergovernamentais, são ferramentas de mobilização mundial que têm por objetivo influenciar na formulação das políticas públicas dos países-membros de forma a melhorar a qualidade de vida das populações. Para potencializar as ações de mobilização e envolver todos os atores da sociedade, as grandes conferências são precedidas de encontros nacionais (organizados pelos países) e regionais, que agrupam por continente países vizinhos ou que tenham realidade semelhante.
O desafio não é pequeno. Há no mundo 776 milhões de pessoas adultas não alfabetizadas, dos quais 64% são mulheres. Três quartos dos analfabetos do mundo concentram-se em 15 países, entre eles, o Brasil, onde 14,1 milhões de pessoas, entre a população maior de 15 anos, não sabem ler nem escrever. Além disso, 9,5 milhões de jovens entre 15 e 24 anos não concluíram o ensino fundamental e 750.160 são analfabetos.
Há que se reconhecer, entretanto, que o Brasil tem tido muitos avanços nessa área. O Plano Nacional de Desenvolvimento da Educação institucionalizou a educação de jovens e adultos e garantiu seu financiamento por meio do Fundeb (Fundo de Manutenção da Educação Básica).
Mas está provado que a alfabetização, um dos alicerces da educação de jovens e adultos, precisa ser enfrentada de forma sustentável, com farto acesso a bibliotecas e materiais de leitura que favoreçam a continuidade da aprendizagem. Esse desafio, no Brasil e no mundo, precisa ser enfrentado não apenas pelo poder público mas também por toda a sociedade.
Vincent Defourny, 49, doutor em comunicação pela Universidade de Louvain (Bélgica), é representante da Unesco no Brasil.