Anunciada como reviravolta educacional, revolução curricular, entre outras descrições superlativas, a aprovação pelo Conselho Nacional de Educação da “Proposta de Experiência Curricular Inovadora do Ensino Médio”, iniciativa do Ministério da Educação (MEC), tem objetivos bem mais modestos. Na verdade, só o que o conselho chancelou foi a realização de um experimento que deverá envolver mero 0,4132% do total de 24.200 escolas de ensino médio do país.
Pelo plano, serão selecionados cem colégios que receberão verbas e apoio técnico para ensaiar uma reestruturação em seus “curricula” já a partir do ano que vem.
Experiências mais exitosas poderão ser estendidas para outras unidades da rede. É certo, porém, que nada de maior vulto ocorrerá antes de 2012. “Em 2012, teremos as primeiras turmas concluindo o ensino médio com propósito inovador. Só então será possível fazermos uma avaliação completa dos resultados obtidos”, afirmou Maria do Pilar Lacerda, secretária de Educação Básica do MEC.
O investimento federal nas cem escolas será, segundo o ministro Fernando Haddad, de algo entre R$ 50 milhões e R$ 100 milhões em 2010. O montante total só será definido depois de as escolas apresentarem seus projetos a partir dos quais o ministério selecionará os participantes do programa.
Em grandes linhas, o MEC pretende tirar a ênfase no ensino de disciplinas estanques como física, química ou matemática. A ideia é reorganizar os conteúdos em torno de quatro eixos integrados: trabalho, ciência, tecnologia e cultura. “Interdisciplinaridade” ou “integração de conteúdos” são palavras-chave do documento.
A definição de como isso será feito, porém, ainda não ocorreu. Em setembro e outubro, técnicos do MEC em conjunto com especialistas em educação dos Estados se reunirão para dar materialidade à proposta.
Não se sabe ainda, por exemplo, que parâmetros serão usados para avaliar quais as experiências exitosas. Pode ser pela evolução da performance dos alunos no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio)? A secretária diz que sim. Pode ser por índices de repetência e evasão escolar? Também. “Definiremos neste ano todas as variáveis a serem usadas na avaliação das experiências”, diz.
Para tornar o pacote mais atrativo, o MEC propôs aumentar a duração total do curso de 2.400 para 3.000 horas e permitir que cada estudante defina pelo menos 20% de sua carga horária em atividades optativas e disciplinas eletivas -um pouco como no modelo americano.
Coincidentemente, as 600 horas adicionais equivalem ao tempo mínimo de que o aluno disporá para compor sua grade pessoal. O documento enuncia quem poderá ser professor das chamadas disciplinas optativas: “coreógrafo, técnico desportivo, diretor de teatro, maestro, regente de coral, artista plástico, jornalista, radialista e outros tantos”. Tais horas adicionais podem, portanto, acabar consumidas em atividades não exatamente intelectuais, como capoeira e grafite. “Mas essas optativas podem ser também de matemática avançada, para alunos mais interessados”, explica Lacerda.
A proposta nada mais é do que um desenvolvimento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que já evita nomear disciplinas específicas e fala em diretrizes curriculares gerais, em um claro incentivo à abordagem interdisciplinar.
Outra característica da LDB é a forte autonomia que concede aos Estados e às comunidades escolares para definir suas prioridades pedagógicas. Esta, aliás, é a razão alegada pelo MEC para que as mudanças propostas estejam ainda apenas em fase experimental. “Não poderíamos impor nada de cima para baixo”, diz Lacerda.