Chico de Oliveira se lança candidato de protesto na USP

O sociólogo Francisco Maria Cavalcanti de Oliveira, o Chico de Oliveira, um dos mais importantes intelectuais de esquerda no Brasil, é a surpresa na calmaria com que vinha sendo até agora conduzida a sucessão da reitoria da USP.

O próximo reitor deve ser escolhido em outubro. Sucederá a farmacêutica Suely Vilela, a reitora que chamou a polícia -pela primeira vez desde 1968, um dirigente universitário solicitou a presença de soldados no campus central a título de proteger os prédios dos próprios funcionários e dos estudantes.

Aos 75 anos, aposentado como professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, Oliveira não pode nem cogitar ser o próximo reitor da instituição: pelo estatuto, teria de ter no máximo 70 anos e estar na ativa.

Mas o sociólogo que ajudou a fundar o PT e, depois, o PSOL, resolveu entrar na disputa para denunciá-la. Apoiado pelo Sintusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP), pelo DCE (Diretório Central de Estudantes) e pela APG (Associação dos Pós-Graduandos), Oliveira é um candidato de protesto.

“É para propor uma estatuinte que encaminhe a série de reformas de que a universidade precisa”, disse Oliveira ontem em sua casa, durante entrevista à Folha. Abaixo, trechos do antiprograma do “candidato”.

Universidade pública
É preciso defender o caráter público da USP. A universidade vem sendo privatizada de forma perversa com as fundações. Esses entes de direito privado infiltrados usam o nome, os recursos, os docentes e pesquisadores, o campus em benefício próprio. Diz-se que o caráter estatal é um obstáculo ao desenvolvimento técnico e científico. Ora, isso é o contrário da história brasileira, veja-se o caso da Petrobras. Agora, ela é o êxtase, e o Lula tem orgasmos múltiplos com o pré-sal. Mas a Petrobras só existe por causa da teimosia de fazer uma empresa estatal que pesquisa a fundo perdido com recursos do povo. Não foi acaso. A Petrobras é a melhor prova de que é falsa a tese segundo a qual o que é estatal não funciona. E as universidades públicas são outra prova- e agora tem gente que quer andar para trás.

Democracia
Eu não sentaria na cadeira de reitor com a estrutura que a USP hoje tem. Ela é uma condenação. Se você repassar todos os últimos reitores, verificará que todos eles, importantes professores em suas áreas, fizeram muito pouco em suas gestões. O primeiro ponto é ampliar a democratização da USP. Um bom começo seria reformar a escolha do reitor. Por que as eleições diretas são boas para presidência e não são boas para a universidade? Depois, é preciso reformar o Conselho Universitário, por exemplo, criando um parlamento universitário. Acho importante dizer que não serão os funcionários nem os estudantes que dirigirão a pesquisa, função que ainda caberá ao pesquisador. Mas é, sim, tarefa do cidadão universitário decidir democraticamente sobre prioridades, onde e como serão aplicadas as verbas públicas.

Polícia no campus
Se estudantes, professores ou funcionários invadissem a reitoria, a minha atitude seria uma só: dialogar, dialogar, dialogar. Polícia, jamais.

Caça às bruxas
A reitoria optou por desencadear uma caça às bruxas. Quer anular o Sintusp, demitindo dirigentes, com ações na Justiça. E por quê? Porque os trabalhadores da universidade se transformaram em uma força política importante. Veja, isso ocorreu simultaneamente ao apagamento, por exemplo, da associação dos docentes, a Adusp. Quem da Faculdade de Medicina, da Poli, da Direito, da Economia participa da Adusp? Ninguém. A Adusp reduziu-se às humanidades, à Física e Matemática, à Faculdade de Educação. Paradoxalmente, a Adusp perdeu força por causa do êxito profissional de seus associados, sobrerremunerados pelas fundações, que acabaram com a isonomia salarial na universidade. Os trabalhadores cresceram em importância porque o objetivo deles da vida profissional é crescer dentro da universidade, e só dentro dela. Por isso, eles são mais republicanos que nós.