O governo demonstrou mais uma vez que não pretende deixar a responsabilidade da expansão da oferta de banda larga no país apenas nas mãos do mercado. Em seminário realizado quinta-feira (4), em Brasília, o assessor especial da Presidência da República e responsável por coordenar o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), Cezar Alvarez, defendeu a atuação da Estado como regulador do sistema e também como competidor em determinadas situações. O evento foi organizado pela revista TeleTime em parceria com o Centro de Estudos de Políticas de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB).
Alvarez voltou a enfatizar que a infraestrutura de banda larga governamental deve mesmo ser gerenciada por uma empresa pública. “Será um desperdício de dinheiro público não utilizar os 31 mil quilômetros de fibras que o Estado possui”, afirmou, referindo-se às redes de empresas como a Eletronet e a Petrobras. Embora essa estrutura deva, em sua maioria, levar a internet apenas às grandes cidades, em alguns casos pode também fazer o atendimento direto ao cidadão, competindo com os altos preços cobrados pelas atuais operadoras privadas.
“Só chego [ao consumidor] em último lugar, se a empresa [privada] não estiver indo ou se estiver indo com preços de monopólio. Eu tenho o dever público, como Estado social, de levar o serviço aonde ele não chega”, disse ele, lembrando que os pequenos provedores podem ser parceiros do governo. O assessor sinalizou inclusive com a possibilidade de disponibilizar a rede pública para as empresas privadas. “Também posso vender minha [capacidade de] rede. Preciso competir para ter receita.”
Mas mesmo com essas ações, as empresas de telefonia não ficariam de fora do plano. A redução de tributos, uma das principais reivindicações das teles, por exemplo, está em estudo pela equipe do governo. A opção em análise envolve tanto a diminuição de impostos usados para compor o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) e o Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel) e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Os dois primeiros formam caixas nacionais formados também a partir da contribuição do cidadão e o terceiro sustenta os cofres dos estados. Alvarez também avaliou ser possível fornecer subsídios diretos à população.
Na próxima quarta-feira (10), haverá uma reunião com o presidente Luis Inácio Lula da Silva em que o decreto que deverá instituir PNBL deve ficar mais próximo da sua versão final. Até lá, o governo ainda deve fazer reuniões com as empresas privadas que prestam o serviço de internet. Cezar Alvarez ponderou que também será montada uma mesa permanente de debates sobre o plano. Só não deixou claro se ela será feita a partir da publicação do decreto ou antes dele.
Também presente em uma das mesas do seminário, o pesquisador e coordenador do Centro de Estudos de Políticas de Comunicação da UnB, Murilo Ramos, elogiou o encaminhamento que o governo está dando ao assunto. “O governo está no caminho certo ao propor tratar o tema como uma política social. É importante pensar no Estado com seu papel alargado”, disse o professor. No entanto, Ramos avaliou que a atual conjuntura pode transformar uma boa ideia em um projeto ruim. Ele lembrou, por exemplo, que a partir de março a Casa Civil e o Ministério das Comunicações devem ter novos dirigentes por causa da disputa eleitoral.
Setor privado
Por outro lado, os representantes das empresas de telefonia fizeram questão de mandar recados ao governo, mostrando descontentamento com vários pontos divulgados sobre o PNBL até o momento. O presidente da Telefônica, Antônio Valente, em sua fala tentou justificar que o atual modelo privado tem conseguido aumentar a oferta de banda larga em níveis satisfatórios e que os números só não são melhores devido a equívocos do Poder Público, como a alta carga tributária que recai sobre o setor de telecomunicações e a indisponibilidade de um número maior de faixas de espectro para as operadoras.
A empresa pública que o governo pretende criar foi um dos principais alvos dos empresários. “A reativação da Telebrás me parece complicada porque implicaria redefinir os objetivos de empresas que deve ser feito por lei e não por decreto”, disse o diretor de assuntos regulatórios da Oi, Paulo Mattos.
Já o presidente da Associação Brasileira das Concessionárias de Telefone Fixo Comutado (Abrafix), José Fernandes Pauletti, foi bem direto e ameaçou diminuir os investimentos no setor caso o governo mantenha suas posições. No projeto das empresas, divulgado pelo Ministério das Comunicações, o setor privado faz uma previsão de aplicação de cerca de R$ 75 bilhões nos próximos cinco anos para a expansão da banda larga. “Essa projeção vale caso mantidas todas as condições regulatórias e com estabilidade. Sem modificação das regras e com a manutenção das premissas básicas onde se pressupõe que o Estado abriria mão do seu papel de empresário e só ficaria com o papel de regulador”, afirmou Pauletti.