O câmpus da UFSC em Araranguá foi implantado em 2009, juntamente com os de Joinville e de Curitibanos, quando a Universidade aderiu ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Atualmente, o câmpus conta com quatro cursos em funcionamento: Bacharelado em Tecnologia da Informação e Comunicaçãod+ Engenharia de Energiad+ Engenharia de Computação e Fisioterapia.
São 23 professores efetivos e nove substitutos para atender a 515 alunos. O prédio onde funciona o câmpus é próprio e conta com sete salas de aula, quatro laboratórios de informática, um auditório e uma biblioteca.
Nesta entrevista, os professores João Rodrigues Neto, Paulo César Esteves, membros do Conselho de Representantes da Apufsc-Sindical, e Eugênio Simão, falam sobre a situação do câmpus. O Boletim da Apufsc também ouviu alunos e o diretor geral, professor Sérgio Peters.
Boletim – Como está o câmpus da UFSC em Araranguá?
Professores – Nós temos dois grandes problemas. O primeiro é na criação, ou seja, o ato de criação dos câmpus foi um ato que fez da UFSC uma universidade multicâmpus. Só que está difícil cair a ficha na UFSC de que ela é uma universidade multicâmpus. Nós temos um problema sério que é o problema de regimento. Em Araranguá nós formamos uma comissão para estudar o regimento desse câmpus. A gente entende Araranguá como um câmpus. Nada de câmpus fora da sede, nem unidade universitária, nenhum outra palavra que não seja câmpus. Essa comissão fez uma proposta de um estatuto e submeteu para o jurídico da UFSC para ser analisada e, por incrível que pareça, retornou outra coisa e nós não tivemos nenhuma informação se nossa proposta foi avaliada ou não. O que retornou para nós foi a proposta de Joinville. Não sabemos se Joinville não se entende por câmpus ou se quer ser apenas Centro. Quer dizer, nosso projeto caiu no vazio e voltou para nós a iniciativa de Joinville. O que está na nossa proposta é o seguinte: existe uma reitoria e hoje existem quatro câmpus, e o que está naquela proposta é que existe uma reitoria, existe um câmpus e existe alguma coisa que chamaram de unidades universitárias e, pendurado nessa estrutura, tem os câmpus e tem tudo que está fora da sede. Tem uma alcunha intermediária dizendo que é uma Unidade universitária. Então o câmpus daqui não é o mesmo câmpus de lá. É isto que está esquisito e esta é uma proposta de Joinville.
Bolotim – Então a Reitoria está querendo implantar aqui o mesmo regimento proposto pelo pessoal de Joinville?
Professores – Sim. Mas nós não concordamos. Não queremos ser uma unidade universitária que se chama de câmpus, mas não é câmpus. Porque essa alcunha intermediária permite criar uma diferenciação do câmpus daqui com o câmpus de lá. Então nós somos câmpus, mas para sair nos folders, mas de fato a gente é outra coisa, porque se nós somos uma unidade universitária, nós estamos no mesmo nível de uma fazenda-escola, de um campo experimental. Nós estamos nesse mesmo grau hierárquico. Em resumo, nós temos uma proposta do câmpus que não foi bem avaliada ou bem interpretada, se é que foi avaliada. Nós temos uma proposta que é de origem de Joinville que tenta nos criar com uma unidade universitária, quando nós queremos ser câmpus, mesmo que seja um câmpus pequeno que comece com um centro, uma unidade enxuta, com diretor geral, diretor acadêmico, diretor administrativo, mas nós não queremos perder o que foi nos dado no momento da criação que é o status de câmpus. Se o Estatuto da UFSC permitir que sejamos tratados como unidade universitária, a UFSC não vai ser multicâmpus. Ela vai ser uma universidade com unidades avançadas. Na verdade, para concretizar nosso regimento, tem que se alterado o Regimento da UFSC como um todo. Dentro da estrutura hierárquica nós estamos como se fosse um centro, é como se fosse um centro fora da sede. Nos não queremos isto, nos queremos um câmpus para um dia chegar a 10 mil alunos. A gente quer autonomia de câmpus para poder crescer.
Boletim – Os senhores falaram em dois problemas. O primeiro é sobre o regimento, qual o segundo?
Professores – É sobre Reuni. O que nós percebemos é que a UFSC entrou na rabeira do projeto Reuni e, com isso, também entrou na rabeira de recursos, ou seja, houve recursos financeiros para dar o start, mas não houve recursos financeiros suficientes para dar o fim do projeto como um todo. O Reuni é um projeto que tem inicio, meio e fim e esse projeto é de alavancagem, a gente não vai viver permanentemente com recursos do Reuni, ou seja, vamos viver por um tempo até que dê para viver com as próprias pernas. Esse primeiro guarda-chuvas do Reuni acabou e nos estamos na esperança do Reuni 2 . O que é dito para nós é que a infraestrutura do prédio um, prédio dois e prédio três já estão definidas, mas no nosso caso é um pouco mais grave porque os recursos para a construção não vieram do Reuni, vierem de emendas parlamentares. Com isso, só os professores estão sendo bancados pelo Reuni.
Boletim – Como está o quadro de professores?
Professores – Geralmente o que se tem é uma média de 20 professores por curso e que o nós temos aqui são 23 professores para quatro cursos. Com os substitutos esse número chega a 32. Tem professor com carga horária de 20 horas-aulas que ainda é coordenador de curso. A gente até entende que nesse início precisamos dar um pouco mais de cada um de nós, pelo menos até que máquina engrene. Só que a exceção não pode virar regra. Há um tentativa de convencimento de que os professores do Reuni tenham uma aplicação do seu tempo maior no ensino. Isso é lorota, a gente é professor universitário e tem que fazer pesquisa e extensão. No estágio probatório a gente não é diferente de ninguém, somos avaliados como todos os professores da UFSC. O Reuni fechou como projeto, mas não atingiu os objetivos. Se não houver uma segunda etapa do Reuni para que se possa ir buscar as coisas que ainda faltam, nós estamos meio que sem saída. Até quando vai durar isso? Na verdade, nesse câmpus as pessoas estão com medo de olhar para o futuro. O que estamos fazendo é resolvendo os problemas do dia-a-dia, apagando incêndio. Até agora está tudo sobre controle, os alunos não estão sem aula, mas isso aqui tem hora marcada para dar problema. Dois professores já chegaram a se afastar por doença, causada por sobrecarga. Um até foi embora. O deslocaram para uma área que não era a de sua formação e ele simplesmente pediu demissão da Universidade. E agora, há um mês, uma professora entrou com atestado médico devido a carga de trabalho. Na verdade você é professor de uma, duas disciplina, mas não poder ser de toda uma área. Eles te jogam para onde está faltando profissionais.
Boletim – Os problemas citados pelos senhores está prejudicando o projeto pedagógico?
Professores – Quando chegamos aqui, nós vimos que os cursos que foram pensados, acho que foram pensados por equipes da própria UFSC, e pensaram sobre o processo de Bolonha. Mas essa filosofia não foi disseminada aqui e quem está tocando está desassociado dessa filosofia. Não sabe o que é processo de Bolonha, não sabe o que é ensino por ciclos. Então recebeu de herança uma filosofia que não encontrou e não conhece. A estrutura tem que estar aliada a estratégia. Só que quem pensou não acompanhou os primeiros passos. Nos foi vendida essa idéia de 10 mil alunos. Isto não coisa da nossa cabeça, o próprio vice-reitor esteve aqui e afirmou isso e falou também no modelo, que não estava pronto e que nos precisamos ajudar a construir. Quando vem aqui alguém que manda, dizendo que não vão impor qualquer tipo de modelo por que nos tínhamos a oportunidade de construir um novo modelo, é muito bom. E foi assim que gente pensou em fazer nosso próprio regimento, fazer o câmpus que sempre sonhamos, mas, de repente vem outra vertente dizendo que não, que a coisa é assim, vocês vão ser uma unidade universitária, vão ter um diretor, mas um administrativo e se virem nos trinta. Então tem uma vertente dizendo que a gente tem a oportunidade de construir uma coisa moderna, enxuta e de acordo com os movimentos internacionais, com mobilidade acadêmica, por isso o modelo de Bolonha, e por outro lado vem o pessoal do deixa disso, dizendo que a estrutura mínima é esta e se virem com podem. Resumindo, ou agente se assume como câmpus mesmo, com a expectativas de criar uma coisa diferente, sem departamentos, numa estrutura nova ou é muito mais cômodo não se mexer em nada e deixar tudo como está, não precisa nem mexer no regimento da UFSC.
Boletim – Quanto à infraestrutura do prédio, como salas de aula e laboratórios, qual a situação?
Professores – Nessa questão de infraestrutura é bom que se fale que existe um segundo prédio aqui que já tem projeto de engenharia, recursos alocados e início de licitação, mas o fato é que no semestre que vem nos vamos ter um problema de espaço físico, não tem mais jeito. A gente está procurando alternativas, passando os alunos entrantes para o período vespertino e noturno para a melhor utilização de espaço. Essa insistência de não olhar para frente cria um otimismo enganoso, porque daqui a um ano, se nada mudar no cenário, não teremos salas, nem laboratório, nem professores. Nós não temos mais um ano de fôlego. Espaço físico, nem seis meses. No semestre que vem já vai ficar complicado. São quatro cursos que ainda estão andando, tem entrantes e, até agora são 72 disciplinas para 32 professores. Só que no semestre que vem serão pelo menos mais 20 disciplinas e a gente espera por mais profissionais, mas isso tem que acontecer já no próximo semestre. No momento está sendo feito um trabalho sobre-humano para dar um jeito de não deixar os alunos sem aula e, apesar da sobrecarga dos professores, não vamos deixar cair a qualidade do ensino.
Pesquisa e extensão são prejudicadas por falta de tempo dos professores, afirmam estudantes do câmpus
No início deste semestre os alunos do câmpus de Araranguá fizeram um protesto pedindo mais estrutura. Segundo eles, a UFSC de Araranguá já convive com os velhos problemas presentes nas universidades públicas brasileiras. “A falta de assistência estudantil, como moradia e restaurante universitário, a falta de professores, laboratórios e espaço físico insuficientes, salas de aula lotadas, e os pilares de Ensino, Pesquisa e Extensão comprometidos pela falta de estrutura física e de quadro docente que contemplem a crescente demanda da unidade”, relatam os estudantes.
“Em Araranguá, o câmpus da UFSC, nasceu atrelado a uma espécie de clientelismo político moderno, sustentado nas emendas parlamentares, recursos destinados aos deputados federais para atenderem suas bases eleitorais”, denunciam os estudantes.
De acordo com os acadêmicos, esses problemas já estão sendo levantados desde o primeiro semestre de 2010, onde, afirmam eles, a situação ainda se mostrava contornável pela quantidade de alunos. “Passou-se o tempo, e com exatamente as mesmas condições, num ato de pura irresponsabilidade, criou-se mais dois cursos para o câmpus, o que faz com que todos esses problemas aumentem exponencialmente a cada semestre”.
“Pesquisa e a Extensão estão prejudicadas pela falta de tempo dos docentes que tem como prioridade o Ensino, que também sai prejudicado por conta de que cada professor tem de se desdobrar em dois ou três para que não haja disciplina sem professor, aceitando inclusive, ministrar aulas fora da sua especialização, que aqui foram chamados de professores “Band-aid”, ou seja, apenas remediam, jamais solucionam, claro que não por culpa própria pois confiamos plenamente na capacidade de todos de serem bons nas suas áreas”, finalizam.
Diretor geral do câmpus de Araranguá admite que quadro de pessoal está defasado
O diretor geral do câmpus, professor Sérgio Peters, reconhece alguns problemas de estrutura, mas afirma que as providências estão sendo tomadas. Ele também admite que os professores estão sobrecarregados e que algumas coisas precisam ser melhoradas.
Boletim – Como está a estrutura do campus de Araranguá?
Sérgio Peters – O câmpus de Araranguá está no terceiro ano de implantação. Começamos em 2009. Começou com um prédio pequeno num primeiro momento para atender basicamente ao primeiro curso. Depois nós planejamos os próximos prédios e os próximos cursos. Nosso projeto pedagógico foi construído a partir desse período. Ele não estava pronto. O projeto para a construção do prédio dois está em conferência. Foi entregue pela empresa e está em fase finald+ estão conferindo os números para colocar em licitação este ano ainda e construir no ano que vem. Mas nossa estrutura realmente é limitada. O prédio é pequeno e, para atender todos os quatro cursos, não é suficiente. Hoje todos os alunos estão aqui, mas nós não temos aqui laboratórios específicos. Então a estrutura não é a que agente precisa. Mas os cursos estão no inicio e os primeiros laboratórios estão fora daqui.
Boletim – E o quadro de pessoal?
Peters- Também está defasado. Estávamos contanto com as 150 vagas previstas no Reuni e a UFSC não recebeu estas vagas. Técnicos nós recebemos, num concurso realizado agora para nove técnicos administrativos em educação. Na docência estamos defasados. Estamos fazendo seleção de professores substitutos, mas temos dificuldades em conseguir candidatos. Aqui não há muita disponibilidade, não é como em Florianópolis onde há estudantes de doutorado que são potenciais candidatos. Nós estamos com 23 professores efetivos e nove substitutos, mas o ideal é que fossem todos efetivos. A Administração Central tem atuado junto ao MEC, junto ao Ministério do Planejamento, não só o Reitor, mas há um movimento grande no Brasil todo para que essas vagas sejam liberadas, porque, realmente, o que faz mais falta é o pessoal. Os professores daqui estão sobrecarregados. Eles dão aula dentro de sua área de formação, mas nem todos dentro de sua área de doutorado. A idéia é que cada um estivesse atuando dentro da área que fez o doutorado. Mas na sua área de formação básica eles estão atuando, todos.
Boletim – A biblioteca do câmpus atende às atuais necessidades?
Peters – Ela está sendo implantada gradativamente. O espaço dela é razoável para o nosso número de alunos. O número de volumes atende a nossa demanda para complementar nosso projeto pedagógico. Os alunos chegaram a reclamar que faltava mais material na área cultural. Pedimos para eles fazerem sugestões que foram contempladas.
Boletim – Como está elaboração do regimento do câmpus?
Peters- Na verdade quando se pensa no regimento temos que definir claramente o que se pensa para os três câmpus a longo prazo. Nós fizemos uma discussão interna avaliando um câmpus com várias áreas de atuação, com várias áreas de conhecimento. Nós já temos aqui uma área tecnológica e já temos uma área de biociência, que é a área da saúde com o curso de fisioterapia. Então a gente já tem duas áreas grandes e nós imaginamos um regimento que previsse centros de ensino, por exemplo, como em Florianópolis, mas não necessariamente Departamentos. É uma idéia interessante para integrar as pessoas, como em Joinville, que foi o primeiro a definir o projeto pedagógico. Eu acho que é interessante ter todo mundo integrado no mesmo ambiente para trocar experiências. Mas o que nós percebemos aqui é que as duas grandes áreas tinham que ter um tratamento diferenciado, elas tem suas peculiaridades. Nós pensamos num regimento de um câmpus integrado, mas que contemplasse essas grandes áreas. Essa é uma proposta que nós levamos para o gabinete do Reitor e estamos avaliando. Vão acontecer algumas reuniões daqui pra frente para definir isso.
Boletim – No início deste semestre os alunos do câmpus fizerem uma série de manifestações cobrando mais estrutura. O que o senhor tem a dizer sobre isso?
Peters – Nós estamos sempre em permanente contato com a Reitoria e com os órgãos que atuam nesse sentido. Por exemplo, na infraestrutura, o que nós fizemos? O pedido de mais agilidade na construção dos novos prédios. Mas na verdade nós já estamos sendo ágeis porque realmente o projeto de um prédio grande, com 4 mil metros quadrados, com laboratórios de ensino, exige um tempo maior para ser executado. Nós estamos trabalhando no projeto praticamente desde o inicio do ano e a gente tem pressionado, digamos assim, e principalmente buscado recursos. A maior reivindicação dos alunos é de infraestrutura. Eles tem razão. O ideal é que já tivéssemos os prédios prontos com os laboratórios prontos, mas não temos ainda, então estamos procurando atender através de outros laboratórios, como os do Instituto Federal, que tem condições de atender a gente. Se for necessário faremos novas parcerias com outros laboratórios de outras universidades aqui da cidade para atender aos alunos. Não é a situação ideal, é uma situação de transição, enquanto não temos laboratórios aqui no câmpus. A previsão é que os prédios fiquem prontos até 2013.
Boletim – Qual a sua avaliação do Reuni?
Peters – Eu acho que deu certo sim. No caso de Araranguá, nós demoramos um pouco para definir o projeto pedagógico do câmpus. Em agosto de 2009 começou o curso de Tecnologia da Informação e Comunicação, em março de 2010 o de Engenharia de Energia e em março de 2011 começaram os cursos de Fisioterapia e de Engenharia da Computação. Inicialmente não tínhamos a previsão desses quatro cursos. O projeto Reuni original previa outros cursos e previa cursos que a comunidade não aprovou, a própria UFSC achou que não eram adequados para essa região. Para se ter uma idéia, inicialmente tinham sido previstos no projeto original os curso de Administração, Relações Internacionais e Ecoturismo, o que não foi bem aceito, digamos assim, pela comunidade, pela associação de municípios. Então a Reitoria propôs iniciar com a área de informática que exige menos estrutura, necessita basicamente de laboratórios de informática, que nós temos aqui. Eu diria que o Reuniu foi muito importante, permitindo que a gente viesse para o interior. E no caso dos três câmpus da UFSC foram criados cursos diferentes dos da sede. Florianópolis oferece um campo grande de cursos e aqui oferecemos cursos diferentes, como em Joinville e Curitibanos também. Hoje nós atendemos mais esses 500 alunos que provavelmente Florianópolis não atenderia. Talvez alguns sim, mas a maioria não estaria estudando na UFSC. Nossos professores efetivos todos tem doutorado, tem formação básica nas áreas que eles estão minitrando aulas. Ainda não é o ideal, reconheço que ainda falta bastante, é um processo que nós vamos trilhar por uns três anos ainda, talvez, para termos uma situação estável.