Desde quando assumiu a Pró-Reitoria de Pesquisa e Extensão, em 1998, Débora Peres Menezes recebeu reclamações sobre as regras para a progressão funcional dos docentes. As insatisfações chegavam de diversos centros de ensino da Universidade, em especial o Centro de Física e Matemática (CFM) e o Centro Tecnológico (CTC). “Para não ficar no achismo, montei uma comissão e foi feito um estudo: analisaram-se mais de 900 casos de progressão para saber se, de fato, havia problemas”. A conclusão da pró-reitora foi que não há problemas no que tange à progressão. As reclamações seriam fruto da dificuldade que os docentes tinham com o registro das atividades de extensão. “Passamos nos centros para explicar o funcionamento do processo e, ainda assim, os professores continuaram reclamando. As pessoas não sabiam o que era extensão”, lembra.
Algumas ações foram feitas, como a simplificação do sistema Notes – usado para o registro das atividades dos docentes – e o problema persistiu. A resolução estaria, então, na reforma da tabela vigente. Em 2010 surgiu a primeira proposta que, de acordo com a pró-reitora, recebeu muitas sugestões pertinentes. A discussão, que se mantém até hoje, foi revigorada com a divulgação de uma nova proposta de tabela, no último mês de abril. “Uma nova proposta não é apenas uma mudança na tabela, é um documento indutor de política na universidade”, esclarece Débora.
Para Raymundo Baptista, professor do Departamento de Física, os problemas da tabela não se resumem à ausência de relacionamento dos docentes com o Notes, mas refletem-se em dois eixos principais: a saturação dos pontos e as formas de progressão. “Há duas espécies de pontos: você pode ganhar 200 pontos por ter feito algo, mas esses pontos se convertem para dez unidades e são essas unidades que contam”, exemplifica o professor, lembrando que as unidades têm um limite. Através desse sistema de conversão, um professor com muitos pontos tem sua pontuação convertida a um máximo de unidades equivalente a outro professor que não tenha obtido tantos pontos. A nova proposta elimina essa conversão. De acordo com Débora, a saturação dos pontos não é um defeito na tabela, mas um defeito na política da universidade.
Quanto à forma de progressão, Baptista condena o sistema de progressão por tempo: “o professor tem que fazer determinada pontuação em determinado tempo. Caso não consiga, ganha mais tempo para fazer a mesma pontuação. É como se um aluno reprovasse numa disciplina de média 6 e o professor desse a chance de ele refazer a matéria, mas com média 5”. A consequência desse modelo, segundo ele, é a de que, mais cedo ou mais tarde, todo mundo progride. “O recado da universidade para o professor é o seguinte: trabalhar pra quê, cara?”, destaca Baptista. Débora concorda que a tabela nivela os docentes por baixo: “quem faz o mínimo e quem trabalha vão para frente. Isso é característica de ambiente público”.
Produção artística
A avaliação das atividades relacionadas às artes é outro ponto polêmico na reforma da tabela de progressão. Uma comissão composta pelos professores Fábio Salvatti (Artes Cênicas) e Mauro Pommer (Cinema) e a secretária de Cultura e Arte Maria de Lourdes Alves Borges, foi especialmente montada com a pedido da pró-reitora. O grupo produziu uma tabela para a avaliação de trabalhos artísticos em 2010. “A nova proposta mostra um avanço em relação à tabela que produzimos, mas as demandas de arte não foram contempladas”, analisa Salvatti.
O objetivo dos professores do Departamento de Artes é fechar um acordo com a comissão que estuda a progressão funcional atualmente, presidida pelo professor Paulo Cesar Philippi. “Nossa sugestão é de que seja incluída a tabela que elaboramos, mas o entendimento da comissão é diferente do nosso: alegam-nos que a avaliação no campo da arte é muito subjetiva e que tudo deveria ser contado através de horas dedicadas ao projeto. Não é o que acontece com artigos científicos”, compara Salvatti.
Philippi diz que a comissão consumiu várias semanas de trabalho na discussão sobre o tratamento da área artística. No debate, o professor Henrique Finco, do cinema, convenceu-o de que um produto artístico é uma forma tão importante de produção de conhecimento na área artística quanto uma publicação. “O que não podemos é criar um conjunto de critérios específicos para cada área do conhecimento. Trabalhar com critérios diferentes para áreas diferentes terá o efeito de segregar estas áreas e destruir os vínculos que elas têm em comum. Seremos um condomínio de áreas e não uma universidade”, argumenta o presidente da comissão.
Para Salvatti “é preciso ter algum tipo de instrumento de aferição. A proposta presente não contempla de forma suficiente a área das artes”. O professor comentou uma das sugestões de Philippi, que faria com que 18 semanas, com 20h de trabalho cada, equivaleriam a uma publicação de nível B2 no Qualis. “Entendo como uma distorção da valorização da tabela, mas a lógica parece razoável para o professor Philippi”, diz Salvatti e complementa: “Há que se ter uma mudança paradigmática para incorporar a mudança provocada pelos cursos de arte. Conosco, a arte passa a ser ensino, pesquisa e extensão. Queremos ser tratados com igualdade”.
Ensino, Pesquisa e Extensão
A única discussão polêmica que parece atingir a unanimidade dos professores refere-se à indissociabilidade de Ensino, Pesquisa e Extensão na UFSC. O regimento atual torna obrigatório a todos os docentes a dedicação aos três pilares que regem a universidade. “Está na Lei das Diretrizes de Base e também na Constituição Federal: a universidade deve oferecer esses três eixos. Isso não significa que cada professor tenha que promover atividades nesse sentido. O professor tem que fazer bem feito. A nossa carreira é a melhor do mundo porque temos liberdade para trabalhar. Quando eu dei início a um projeto de extensão eu já tinha 15 anos de universidade”, explica Débora.
Quanto a um risco possível de que a nova proposta gere um desequilíbrio entre as atividades nos três níveis, Philippi é cético. “Os professores não irão deixar de exercer estas atividades em função de uma mudança de regras. O ensino é obrigatório para todo mundo. A pesquisa, ao menos a acadêmica, é fundamental para a qualidade do ensino e é a atividade que precisa de um grande estímulo na universidade pois é a partir dela que o conhecimento é gerado e que distingue uma universidade de um colégio do terceiro grau”. Débora concorda: “os diferenciais da UFSC são o ensino e a extensão. Isso diferencia a formação do aluno àqueles que fizeram a faculdade da esquina. O estudante que entra aqui e participa de um projeto de pesquisa ou extensão tem uma percepção social muito maior”.