Apoiadores de Bolsonaro invadem assembleia sindical de servidores federais em Camboriú

Um grupo com quatro apoiadores de Jair Bolsonaro (PSL) invadiu, na quarta-feira, uma assembleia do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), que ocorria no Instituto Federal Catarinense (IFC), em Camboriú. A presença do grupo causou confusão no local e a Polícia Militar esteve no instituto.

Professores de institutos federais do Estado eram a maioria na assembleia. O impasse ocorreu quando eles perceberam que a reunião estava sendo gravada às escondidas. As imagens foram publicadas nas redes sociais e os servidores foram acusados de “comunistas” e “doutrinadores”.

A gravação foi feita por Dileta Corrêa Silva, candidata a deputada federal pelo PSL que não foi eleita. Nesta quinta-feira à tarde o vídeo e as postagens já não estavam mais disponíveis nas redes sociais. As mensagens, obtidas pela NSC e reproduzidas a seguir, falavam em “comunada” e acusava os servidores de “organização criminosa”.

João Carlos Cichaczewsky, diretor de formação e comunicação do Sinasefe, diz que a assembleia era direcionada aos associados do sindicato, mas costumaser aberta à comunidade acadêmica. A ex-candidata, segundo ele, fez-se passar por professora do IFC de Araquari.

Dileta diz que soube da reunião por “grupos de Whatsapp” e pelo Facebook. Os servidores desconfiaram da presença da ex-candidata e dos demais integrantes do grupo. Mas, segundo o sindicalista, não a interpelaram porque ela não havia causado tumulto. No momento em que Dileta foi questionada sobre a gravação, no entanto, o empresário Emílio Dalçoquio, de Itajaí, que integrava o grupo de invasores, exaltou-se. Devido à confusão, a reunião foi paralisada temporariamente.

Parte da situação foi filmada pelo jornalista responsável pela assessoria de comunicação do sindicato, João Moura.

Nas imagens, o empresário dá vivas ao ditador chileno Augusto Pinochet, que governou o país com mão-de-ferro entre 1973 e 1990, e foi acusado de crimes contra a humanidade. Dalçoquio afirma, na gravação, que o ditador chileno “matou quem tinha que matar” e que “História é para homem e profissional, não para amador”.

No vídeo, Dalçoquio cita o Diário Catarinense, apesar de as imagens terem sido gravadas pelo jornalista do Sinasefe. O empresário diz ainda, em referência a Pinochet, que se “tivessem feito o que ele fez aqui no Brasil não haveria isso aí”. Durante a ditadura Pinochet foram mortas no Chile mais de 3 mil pessoas, e mais de 40 mil foram torturadas.

PM é acionada no IFC

A Polícia Militar foi chamada, e o grupo de apoiadores de Bolsonaro deixou o IFC. O Sinasefe informou que, após o ocorrido, a reunião continuou normalmente.

Em nota, o Instituto Federal Catarinense informou que, devido “à proporção do caso e da forma desrespeitosa de como estavam sendo tratados os servidores”, a direção chamou a PM e registrou boletim de ocorrência para “iniciar a tomada de providências legais cabíveis”. A instituição informou, ainda, que não interfere nas pautas discutidas pelo sindicato.

O Sinasefe, por sua vez, informou que o departamento jurídico do sindicato está tomando providências legais, inclusive em relação à suposta falsa identificação da ex-candidata a deputada. Em nota, o sindicato afirma que “os invasores levantaram suspeitas desconexas da realidade. Sem nenhuma prova do que afirmava, a ex-candidata e, portanto, filiada a um partido político, Dileta Correa afirmou defender uma Escola sem Partido”.

A assembleia tinha, entre os assuntos a serem discutidos, análise de conjuntura e eleições 2018. Para os dirigentes sindicais, um assunto importante em período de troca de governo:

— É algo que temos que discutir, o resultado da eleição faz muita diferença para o sindicato em relação às estratégias, às formas de luta, e aos problemas que podem vir pra instituição de ensino. A instituição em si não pode discutir, mas o sindicato sim – disse João Carlos Cichaczewsky, diretor de formação e comunicação do Sinasefe.

No fim da tarde o Diretório Central dos Estudantes do IFC Camboriú emitiu nota lembrando que a organização sindical é garantida por lei, e classificando a invasão como “ato de má fé e criminoso”. Os estudantes cobram medidas que assegurem a integridade física e moral dos servidores, alunos e professores.

O que diz Dalçoquio sobre a confusão no IFC

O empresário comentou o caso, em entrevista pelo Whatsapp com esta colunista, nesta quinta-feira.

Qual foi o objetivo da invasão à reunião sindical em Camboriú?

Emilio Dalçoquio: Quem não deve não teme. Porque não aconteceu a reunião com a minha presença?

Havia alguma irregularidade na reunião?

Dalçoquio – Se não tivesse, porque eles não continuaram? São eles que tem que responder, não eu.

Em seguida, o empresário encaminhou um áudio no qual afirmou que quer “ajudar o Brasil a tirar o comunismo da faculdade”.

– Eu não ia fazer (a invasão) à toa. Dentro da faculdade a maioria dos professores é comunista e oprime os que não são. São arrogantes, ignorantes. Invadimos e invadiremos onde tivermos que invadir a faculdade para enfrentar esses professores de m** comunistas – diz Dalçoquio na mensagem de voz.

Esta não é a primeira vez que o empresário Emílio Dalçoquio se envolve em polêmicas. Sócio de uma das maiores transportadoras do país, ele foi intimado a prestar depoimento à Polícia Federal em maio, durante a greve dos caminhoneiros, por supostamente incitar o movimento. O empresário é alvo de um inquérito no Ministério Público Federal (MPF), que investiga a ocorrência de locaute durante a greve – quando os empregadores provocam a greve em busca de benefícios.

Procurado, o MPF não informou, nesta quinta-feira, se o inquérito segue em andamento, ou que providências foram tomadas.

Dileta diz não ter sido invasão

Dileta Correa Silva, que foi uma das líderes de movimentos pró-intervenção militar no Estado, não entende o caso como invasão porque viu convites nas redes sociais, e afirma que “tem professores e alunos com medo de se manifestarem e serem perseguidos”. Ela negou que tenha informado um nome falso ao ser questionada pelos servidores durante a reunião.

— Não sou de extrema direita, nenhum extremo é bom ou salutar, sou contra a doutrinação, a perseguição dos alunos e professores que são contra a escola sem partido.

Nota oficial do IFC

“O Instituto Federal Catarinense (IFC) – Campus Camboriú vem a público, por meio desta nota oficial, esclarecer a situação ocorrida na tarde de ontem, 24/10/18, durante a Assembleia Extraordinária do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe) – Seção Litoral, realizada no campus.

Os servidores sindicalizados de diversos campi do IFC estavam debatendo sobre as pautas da seção, quando perceberam que uma das pessoas presentes estava filmando a assembleia.

Quando questionada se era servidora e de qual campus, a participante disse que pertencia ao IFC Araquari e que estava na reunião para conhecer o Sindicato. Logo, os servidores sindicalizados perceberam que havia mais pessoas participando da reunião e que não eram servidores e nem sindicalizados. Acusações sobre incitação política começaram a ser feitas desrespeitosamente por parte destas pessoas (que não quiseram se identificar ou usaram de identidade falsa) e a direção do IFC Camboriú foi até o local para intervir. Devido à proporção do caso e da forma desrespeitosa de como estavam sendo tratados os servidores, a direção optou por chamar a Polícia Militar (PM) de Camboriú para registrar os devidos Boletins de Ocorrência (B.O) e iniciar a tomada de providências legais cabíveis. A instituição destaca ainda que não há interferência nas pautas discutidas nas Assembleias do Sinasefe e o caso somente teve a intervenção da Direção por conta das agressões verbais e da iminência de problemas de maior proporção.

O Instituto Federal Catarinense (IFC) – Campus Camboriú tem em sua missão proporcionar uma educação profissional, comprometida com a formação cidadã, a inclusão social, a inovação e o desenvolvimento regional. E é com base nessa missão – na formação cidadã e democrática – é que estamos sempre dispostos a dialogar, de forma respeitosa, para resolver e mediar discussões que possam acontecer dentro da instituição. Ressaltamos que o IFC, por intermédio da Procuradoria Federal, irá tomar as medidas legais cabíveis a respeito da repercussão do caso. O IFC repudia toda e qualquer forma de violência, seja verbal ou física, e trabalha em prol da presença da democracia em todas as situações”.

 

Fonte: DC