Os servidores públicos federais do poder executivo que foram nomeados antes de fevereiro de 2013 têm até 29 de março para decidir se querem mudar seu regime de Previdência. No fim do ano passado, o governo federal abriu pela terceira vez uma janela que permite essa migração – e o prazo termina no mês que vem. Mas será que vale a pena mudar?
Quem ingressou no serviço público antes de 2013 pode se aposentar, por exemplo, com o último salário da ativa, para os mais antigos, ou com a média dos melhores salários. Os que chegaram depois dessa data estão limitados ao mesmo teto do INSS, de R$ R$5.839,45. Para aumentar o valor da aposentadoria precisam aderir a um plano complementar. O primeiro grupo está sob o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) e o segundo, já está no novo Regime de Previdência Complementar (RPC).
O servidor que optar por mudar do RPPS para o RPC deixa de contribuir com 11% do salário para a previdência, e abre mão do benefício calculado com base na remuneração no momento da aposentadoria. Os pagamentos passam a ser baseados no teto do INSS e quem quiser receber mais, precisa aderir ao Funpresp – uma fundação criada pelo governo federal em 2012 para gerenciar a aposentadoria de servidores públicos federais do executivo e do legislativo. Hoje, 633 professores da UFSC já fazem parte do fundo, segundo o diretor-presidente do Funpresp, Ricardo Pena.
Servidores nomeados depois de 4 de fevereiro de 2013 aderem automaticamente ao plano de previdência complementar. Agora, a possibilidade de migração está aberta para quem entrou antes dessa data. Advogados entrevistados pela reportagem da Apufsc dizem que é preciso analisar caso a caso e principalmente conhecer bem os dois regimes antes de tomar a decisão.
As diferenças
Os regimes previdenciários dos servidores federais mudaram várias vezes nas últimas décadas. Para quem entrou no serviço público antes de 31 de dezembro de 2003, por exemplo, o benefício tem o mesmo valor do último salário, com correção monetária. Isso é chamado de integralidade. Esse servidor ainda tem direito à paridade, ou seja, está incluído nas negociações salariais da categoria, e sua aposentadoria é reajustada junto com os salários da ativa. Por outro lado, nesse regime, o servidor precisa continuar contribuindo com a previdência mesmo após a aposentadoria, obedecendo a mesma alíquota de quando estava na ativa: 11%.
Já para quem foi nomeado entre 2004 e 4 de fevereiro de 2013, o que vale é uma média dos salários desde a nomeação até o momento da aposentadoria. A contribuição para a previdência continua acontecendo, mas perde-se a integralidade e a paridade, e o benefício não está limitado ao teto do INSS.
Com as mudanças introduzidas no RPC, o servidor passa a ter o benefício atrelado ao teto do INSS, hoje de R$5.839,45, mas não precisa mais contribuir depois de inativo. A opção para receber mais é o Funpresp. “Com o Fundo, a previdência do servidor público fica mais parecida com aquela do setor privado”, explica João Marcelo Carvalho, advogado e atuário especialista em previdência complementar.
A migração voluntária faz o servidor trocar o benefício calculado com base no salário por uma aposentadoria composta por três pagamentos, explica Carvalho.
O primeiro se limita ao teto do INSS. O segundo é o benefício especial: uma vez que o servidor contribuiu por muitos anos com a alíquota previdenciária sobre o salário, ele recebe uma compensação, baseada no tempo de serviço público e salários anteriores. Já a terceira parcela é a que será paga pela Funpresp, a partir do momento da migração.
“O servidor faz pagamentos mensais, cujo valor mínimo é de 8,5%, e, para cada pagamento que ele fizer, a União realiza um depósito de igual valor. Isso tudo vai para uma conta individual, que ele acumula até o momento da aposentadoria.”
Para Rudi Cassel, advogado especialista em previdência complementar, o Funpresp não significou uma mudança positiva para os servidores, mas é preciso analisar as condições de migração. “O Funpresp ainda é uma opção melhor do que a previdência privada”, diz.
Vale a pena migrar?
As diferentes regras de previdência significam que a decisão de migrar ou não deve ser analisada caso a caso, concordam Carvalho e Cassel.
“Com a incerteza relacionada à reforma da previdência, as regras podem ser alteradas. A alíquota de contribuição atual, de 11%, pode subir para 14% ou até mesmo 20%. Ou seja, quem está no regime anterior pode ver sua alíquota subir. Então o servidor deve fazer uma análise política do seu caso, mas, em muitas vezes, haverá um ganho financeiro na migração”, diz Carvalho.
Um dos casos recomendados por Carvalho é se o trabalhador entrou muito jovem no serviço público. “Ele vai contribuir por um período muito grande antes de se aposentar, e não terá um benefício melhor por isso. Aí existe a recomendação de migração. Outro caso é o do servidor que cogita deixar o serviço público. Ele deve ver a Funpresp com bons olhos.”
Para Cassel, o servidor sempre deve buscar simular sua aposentadoria junto ao Funpresp antes de tomar qualquer decisão. “Há uma série de cálculos que precisam ser feitos, como idade, tempo de contribuição, que só podem ser feitos em uma simulação real. Se você não simular concretamente, não tem como saber.”
Entretanto, em alguns casos, a escolha é mais simples. Para quem entrou antes de 2003, por exemplo, a migração costuma ser contra-indicada. “Como, para esse servidor, o benefício é baseado na integralidade do salário, a condição é muito mais favorável”, diz Carvalho. “Nunca encontrei nenhum caso no qual faltasse menos de 12 anos para a aposentadoria onde fosse recomendável a migração”, afirma Cassel.
Cautela
De maneira geral, é importante comparar se o benefício atual é superior ou inferior aos três pagamentos que o servidor tem direito ao migrar. Para Carvalho, “muitas vezes eles acabam sendo maior do que o benefício original”. Entretanto, ele recomenda esperar o máximo possível para tomar uma decisão. “Com os desdobramentos da reforma da previdência, o cenário tende a ficar mais claro, e a avaliação fica mais precisa. Mas o importante é fazer as contas, colocar na ponta do lápis.”
Já Cassel ressalta a importância de o servidor estar consciente de que a simulação do Funpresp pode não se concretizar: “A previdência complementar depende do investimento no mercado financeiro. São carteiras com um grau de risco mínimo, mas que estão sujeitas ao comportamento do mercado. Uma eventual quebra de rendimento pode acarretar perdas para o servidor”.
Outro risco a ser considerado é o de má-gestão e corrupção, diz Cassel, como ocorreu com outros fundos de empresas estatais, como a Petros, da Petrobras, e o Postalis, dos Correios, envolvidos recentemente em escândalos de corrupção. Em 2017, funcionários e aposentados da petrolífera começaram um pagamento que deve durar 18 anos para cobrir o rombo de R$ 27,7 bilhões deixado por maus investimentos. Já o Postalis foi alvo de uma nova operação da Polícia Federal, deflagrada neste mês, para apurar suspeitas de fraudes na instituição, que tem um rombo estimado de R$ 6 bilhões.
“Para reduzir esse risco, o processo seletivo da fundação deve ser mantido com rigor, o que tem sido feito até aqui. O servidor é o maior interessado na boa gestão, então deve se manter atento aos demonstrativos de rendimento pessoal e institucional dos investimentos.”
Ricardo Pena, o diretor-presidente do Funpresp, enumera uma série de ações que são tomadas para garantir a transparência da fundação. “Nós acabamos de passar por uma longa fiscalização da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), que atribuiu nota 2 para a nossa governança, numa escala de 5 a 1, sendo 1 a maior nota. Além disso, a Entidade é fiscalizada anualmente pela Controladoria-Geral da União (CGU) e Tribunal de Contas da União (TCU)”.
Outra diferença ressaltada por Pena é o modelo previdenciário: a Funpresp funciona com contribuição definida, onde o participante tem uma conta individual e pode acompanhar seu próprio extrato. “Isso confere mais segurança e governança aos participantes da Funpresp. Também estimulamos o controle dos próprios participantes e prezamos por ter uma administração transparente. Nesse quesito, temos adotado pioneiramente a divulgação de vários atos, ações e atividades da entidade no nosso site e nos boletins destinados aos participantes e patrocinadores. Isso inclui todas as atas integrais dos órgãos colegiados, dando total publicidade às resoluções e deliberações.”
V.L. / N.O