Segundo a diretoria da entidade, os intensos debates ocorridos em 2024 e a realização da COP 30 mostram a necessidade de políticas públicas mais acopladas ao conhecimento científico
Enquanto 2024 foi um ano marcado por debates sobre a preservação ambiental e a necessidade de uma política científica brasileira como política de Estado, 2025 precisa ser o ano em que os diagnósticos virem ações concretas em prol da sociedade brasileira. Este é um dos principais pontos ponderados pela diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
“A SBPC vê o ano de 2025 com um moderado otimismo porque sabemos que, por um lado, o Brasil voltou a trilhar o caminho bem-sucedido do necessário investimento na Ciência, na Educação, na Saúde, na proteção ao meio ambiente e na inclusão social. Mas, por outro lado, sabemos que a situação ainda está muito difícil devido, em boa parte, aos bloqueios colocados pela situação do orçamento da União. Portanto, os investimentos que esperávamos que houvesse não estão se revelando à altura do que se imaginava”, pondera o presidente da entidade, Renato Janine Ribeiro.
“Nós consideramos urgente que os resultados das conclusões da 5ª Conferência Nacional de Ciência Tecnologia e Inovação (5ª CNCTI) sejam implementados e que sejam definidos, em especial, o Plano Decenal, a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação e o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, uma vez que já foi cumprido metade do atual mandato presidencial, e essas medidas são necessárias para que a gente consiga realizar o que a Ciência pode fazer pelo Brasil.”
Janine Ribeiro ressalta que a atuação da entidade em 2025 será marcada por uma cobrança constante às ações do poder Executivo federal, mas não apenas dele. “Vamos também cobrar o poder Legislativo, uma vez que deste se depende o orçamento da União, que é a principal fonte de financiamento para as políticas.”
O vice-presidente da entidade, Paulo Artaxo, complementa a preocupação sobre a destinação de recursos à Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). “O que nós observamos foi que, em 2024, continuamos a ter uma Ciência no Brasil extremamente subfinanciada, com recursos muito abaixo do mínimo necessário para impulsionar o desenvolvimento científico do Brasil. Cada vez mais os nossos institutos de pesquisas e as nossas universidades, que são responsáveis pela pesquisa científica no País, estão realmente com orçamentos muito abaixo do necessário para que eles possam cumprir minimamente as suas missões.”
Artaxo destaca que, para este ano de 2025, a SBPC vai intensificar sua luta pela Ciência e Educação, além das demais áreas importantes para o Brasil, como Saúde e Meio Ambiente. “Essa luta incansável com certeza vai ter que trazer dividendos em 2025, como o aumento dos recursos disponíveis do FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] e com um CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] cumprindo cada vez mais suas obrigações em relação ao financiamento de pesquisas estratégicas para o desenvolvimento do nosso País. Importante também uma maior articulação com as FAPs [Fundações de Amparo à Pesquisa], para que a legislação sobre destinação de recursos estaduais às FAPs seja efetivamente cumprida. As influências políticas sobre nomeações às FAPs têm trazido sérios problemas na gestão de muitas delas.”
A vice-presidente da SBPC, Francilene Garcia, traz a importância de o País continuar a ter o FNDCT com seus recursos descontingenciados, algo obtido desde 2023 com o atual Governo Federal e que também coloca novas responsabilidades à Finep (Financiadora de Estudos e Projetos).
“É importante que a SBPC esteja muito presente no acompanhamento dos resultados dos investimentos já colocados em prol da Ciência, Tecnologia e Inovação em 2023 e 2024, olhando para segunda metade do mandato do Governo Lula de maneira que possamos cada vez mais nos aproximarmos de uma política contínua de investimento, que apoie as universidades, os institutos de pesquisa e as parcerias que são oriundas com outras entidades públicas e privadas, tocadas majoritariamente pela Finep.”
Garcia também ressalta a realização da 5ª Conferência Nacional de Ciência Tecnologia e Inovação (5ª CNCTI) em 2024, que demanda do Brasil uma base estrutural de sua política científica. “Com tudo o que foi discutido e dialogado na 5ª CNCTI, obviamente que a SBPC vai atuar de forma a cobrar do governo, sobretudo do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), os desdobramentos dessa conferência, na forma da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação para os próximos anos e do próprio Plano Decenal que é, em linhas gerais, o plano que deverá ditar quais são os passos dos investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação para os próximos 10 anos.”
Algumas áreas estratégicas que apareceram na 5ª CNCTI necessitam de aporte político, como a educação científica. “Cada vez mais se torna fundamental incentivar a melhoria da educação básica e superior em Ciência por meio de iniciativas que aproximam os jovens e o público em geral do universo científico. Nesse ponto, inclusive, existem duas iniciativas importantes lideradas pela SBPC, como o Prêmio Carolina Bori, que em 2025 outorga e reconhece jovem cientistas que trabalharam com pesquisa no ensino médio e na graduação, e também o programa SBPC vai à Escola, que é dependente de verbas e recursos de emendas parlamentares, e que tem um papel muito Importante nessa aproximação da ciência na educação básica.”
Ciência é primordial na articulação da nova política ambiental
A realização da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, mais conhecida como COP30, em Belém, também impulsiona debates importantes sobre a Ciência nacional e global. Para o vice-presidente da entidade, Paulo Artaxo, é o momento do Brasil se posicionar assertivamente por fortes mudanças nas políticas de sustentabilidade global.
“Nesta COP30, nós esperamos que seja feita uma reviravolta completa nas políticas internacionais de redução de emissões de gás de efeito estufa e de financiamento dos países ricos para os países em desenvolvimento, de modo que haja um desenvolvimento econômico sustentável e com menores desigualdades, e que promova um planeta que caminhe em direção aos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentáveis (ODS).”
Francilene Garcia complementa que a SBPC realizará dois eventos que visam antecipar as tendências da COP30: a Reunião Regional da SBPC no Espírito Santo, que acontecerá em fevereiro, e a 77ª Reunião Anual, que será realizada em Pernambuco em julho.
“Serão dois momentos de importante diálogo em defesa do aumento dos investimentos em Ciência, Tecnologia, Inovação e, sobretudo, na direção do fortalecimento daquelas políticas públicas que dialogam com a Ciência e promovam soluções para o enfrentamento de desafios como as mudanças climáticas, a questão da desigualdade social, além de antecipar e, eventualmente, preparar melhor o país para as futuras crises sanitárias, entre outros temas.”
Articulação com os três poderes
Se a articulação com os poderes Legislativo e Executivo se mostra massiva, a SBPC também defende uma maior ação com o poder Judiciário, um terceiro ator essencial pela promoção da Ciência à sociedade. Para o presidente da entidade, Renato Janine Ribeiro, eventos ocorridos em 2024, como a condenação de duas cientistas que desmentiram fake news, mostram a necessidade do Judiciário se alinhar à Ciência..
“Temos uma grande preocupação em dialogar com o Poder Judiciário, uma vez que ainda recentemente tivemos um episódio muito delicado em São Paulo de pessoas, divulgadoras científicas, que apontaram uma falsidade transmitida por um influenciador e que foram condenadas a pagar uma indenização para esse influencer, uma questão que nos levou a procurar o Tribunal de Justiça para tentar esclarecer o que é o papel da Ciência. Em suma, nosso combate continua, é um combate árduo que não pode baixar a guarda, até porque nos últimos anos vivemos um grande retrocesso na visão de muitas pessoas sobre a Ciência e até sobre os fatos verdadeiros.”
Para Janine Ribeiro, a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, uma personalidade que não tem compromisso com os valores éticos da Ciência, também mostra o desafio da comunidade científica em se mostrar importante e essencial nas lutas políticas e sociais.
“Nós entendemos que assim como a imprensa tem o compromisso sério de divulgar os fatos como aconteceram, cabe à Ciência o compromisso de descrever os fenômenos como eles se produzem. E essas duas situações, essas duas missões, têm sido contestadas pelo negacionismo, tanto no âmbito político quanto até vitimando a própria Ciência. Por isso, sabemos que a luta é difícil, que a situação internacional não está fácil, mas essa não é uma razão para desanimarmos. Vamos continuar lutando”, conclui.
Fonte: Jornal da Ciência