Seminário debate educação intercultural indígena-quilombola antirracista

Evento homenageou Nêgo Bispo, professor e pensador quilombola. MEC anunciou a criação da Escola Nacional Negro Bispo de saberes tradicionais indígenas, afro-brasileiros e quilombolas, que será instalada em institutos e espaços cedidos por universidades federais

O Ministério da Educação (MEC) — em parceria com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE) — promoveu nesta quarta-feira, dia 27, em Brasília (DF), o 1º Seminário Antônio Bispo dos Santos em Educação Intercultural Indígena-Quilombola Antirracista. O evento reuniu representantes de comunidades quilombolas e indígenas, acadêmicos, movimentos sociais e parlamentares.  

O seminário buscou ampliar o debate sobre os avanços e desafios das políticas de educação intercultural e antirracista. Outro objetivo foi o intercâmbio de experiências pedagógicas de ativistas, lideranças comunitárias, professores e gestores do curso de pós-graduação lato sensu em educação intercultural indígena-quilombola antirracista oferecido pelo IFPE no Campus Garanhuns. A primeira turma leva o nome do mestre de saberes Nêgo Bispo, do quilombo Saco do Curtume, no Piauí, em homenagem à sua contribuição enquanto educador, lavrador e poeta contracolonial. Nêgo Bispo atuou como docente do componente curricular “Saberes Indígenas e Quilombolas e Decolonialidade”. 

O seminário coincide com a criação da Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola (Pneerq), do MEC. Instituída pela Portaria nº 470/2024, a Pneerq visa enfrentar as desigualdades étnico-raciais e valorizar as políticas educacionais para a população quilombola.  

A secretária da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi), Zara Figueiredo, destacou a importância do seminário e de receber no MEC a comunidade quilombola e indígena. Segundo Figueiredo, o governo do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, está retomando as ações de inclusão dessa parte da população, que, durante muito tempo, foi excluída e invisibilizada pela sociedade.   

“Quando eu vejo o desenho do evento dentro da logomarca da Pneerq, fico muito orgulhosa. Não é orgulho do MEC, mas orgulho do governo respondendo a algo que, durante todo esse tempo, ficou sem responder. A gente está tentando, com muita rapidez, retomar aquilo que ficou para trás. É um orgulho saber que a gente está dando conta de construir isso junto com vocês”, ressaltou a secretária. 

Ela afirmou que a memória do quilombola Nêgo Bispo e sua história não serão esquecidas, pois a Secadi vai criar a Escola Nacional Negro Bispo de saberes tradicionais indígenas, afro-brasileiros e quilombolas, em institutos federais e espaços organizados pelas universidades.  

“Este é um momento de cultivar, de olhar para essa memória afetiva, essa memória ancestral, essa memória do que nos constrói, que é a nossa identidade. Os mestres e mestras terão as suas bolsas como professores de mestrado e doutorado. A Escola Negro Bispo vai chegar aos institutos, porque eles são capilarizados e alcançam as regiões que as universidades não alcançam. Então, os institutos federais e as universidades podem participar do edital da Escola Nacional. Uma das contrapartidas é exatamente poder ofertar espaços a que a universidade não chega. Precisamos ocupar todos os espaços, e a Escola Nacional Negro Bispo também é uma forma institucionalizada de que os seus filhos nunca o esqueçam, porque, como ele mesmo dizia, ‘tudo é sempre começo, meio e começo’”, informou. 

Para a diretora de Políticas de Educação Étnico-Racial e Educação Escolar Quilombola, Wilma Coelho, os estudantes que estão concluindo a formação na UFPE podem promover transformações decisivas na educação quilombola. Além disso, deixarão um legado de compromisso com a causa quilombola e de espírito coletivo, servindo de inspiração às novas gerações quilombolas.   

“O seminário reforça o compromisso do governo com a formação de lideranças que se insurjam contra qualquer forma de injustiça racial e que fortaleçam a política educacional voltada para a coibição do racismo”, considerou. 

Já o reitor do IFPE, José Carlos de Sá Júnior, lembrou que foi o presidente Lula quem fez a interiorização dos institutos federais em todo o país. Além disso, a pós-graduação é realizada na cidade da qual Lula saiu quando era criança (Garanhuns) — como retirante, por conta da seca — para São Paulo. O reitor observou que, depois de anos, foi Lula quem deu essa brecha histórica para a valorização dos povos indígenas, quilombolas e das comunidades tradicionais. “Temos consciência do tamanho do desafio e nos agarramos a essa oportunidade de nos fortalecermos, nos unirmos, nos juntarmos”, disse.  

Sá apontou, ainda, que os institutos federais são um instrumento de inclusão e desenvolvimento social. Eles crescem por meio do diálogo com as comunidades locais e de acordo com as suas necessidades. “Que outro governo poderia pensar em desenvolvimento social através de uma instituição de educação, ciência e tecnologia? Os institutos federais foram criados com esta perspectiva de promover acesso à cidadania às pessoas em todos os territórios e lugares. Essa instituição cresce através desse diálogo com as comunidades, os territórios, as lideranças. É um instrumento de inclusão e que o Estado brasileiro tem de levar a política pública a um espaço para transformação da realidade e de vidas”, concluiu. 

Participantes

 O seminário contou com a participação de alunos e professores do curso de pós-graduação do IFPE; da comunidade quilombola Negros do Osso; do território indígena Kapinawá; do território indígena Pankararu; do povo Xucuru de Ororubá; da comunidade quilombola do Angico; de diretores, coordenadores e gestores da Secadi; de lideranças indígenas e quilombolas; de representantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar; e da Fundação Cultural Palmares. 

Antônio Bispo

Lavrador e formado por mestres e mestras de ofícios, o líder quilombola frequentou escola formal até a 8ª série do ensino fundamental, com o intuito de traduzir as escrituras para sua comunidade e seu povo. Morador do quilombo Saco Curtume, em São João do Piauí (PI), ele foi membro da Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Piauí (CECOQ/PI) e da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).  

Também foi integrante da rede de mestres e docentes do Encontro de Saberes, tendo lecionado em diferentes universidades públicas, como a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).   

Fonte: MEC