Conforme a Andifes, “vários gestores já relataram a impossibilidade de pagar todos os compromissos até o final do ano”; UFSC não respondeu a Apufsc sobre o assunto
Quinze prédios da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) amanheceram no dia 13 de novembro sem luz devido ao corte de energia feito pela concessionária de energia Light, por atraso no pagamento das contas. Naquela tarde, a concessionária Águas do Rio cortou o fornecimento de água em diversos pontos do campus, entre os quais o Restaurante Universitário e a residência estudantil. A situação é reveladora sobre os problemas orçamentário das Instituições Federais de Ensino (IFEs) brasileiras.
Em nota, a UFRJ diz que foi surpreendida pelo corte no fornecimento de água no prédio da Reitoria, nas instalações da Prefeitura Universitária, no Restaurante Universitário e na residência estudantil. “Além de uma atitude arbitrária por parte das concessionárias, é uma atitude cruel com os mais vulneráveis”, afirmou o reitor da UFRJ, Roberto Medronho.
Para o segundo-secretário da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (AdUFRJ), Rodrigo Nunes da Fonseca, “isso é reflexo da privatização da água feita pelo governo do estado e demonstração da total insensibilidade da empresa”.
A dívida total da UFRJ junto à Light soma R$ 31,8 milhões e é referente a faturas vencidas entre março e novembro de 2024, além de R$ 3,9 milhões em parcelas não quitadas de um acordo firmado em 2020. Na época, a Light e a Reitoria da UFRJ pactuaram o parcelamento de uma dívida de R$ 21,3 milhões; contudo, apenas R$ 13 milhões foram pagos até o momento. Com a companhia de água, os débitos são de R$ 18 milhões.
Ainda no dia 13, a UFRJ conseguiu suspender na Justiça os cortes de energia elétrica. Na decisão, o desembargador Alcides Martins, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), determinou que a “Light se abstenha de interromper o fornecimento de energia nas instalações da UFRJ e realize o religação imediata nas instalações que sofreram corte de luz”.
O magistrado levou em consideração o caráter essencial das atividades acadêmicas e de assistência oferecidas pela UFRJ. A decisão da Justiça não atende ao corte no fornecimento de água realizada pela concessionária Águas do Rio.
“A categoria tinha plena consciência de que isso poderia acontecer”
Rodrigo Nunes da Fonseca, da AdUFRJ, conta que um debate recente feito pelo sindicato sobre a questão orçamentária revelava que o problema era grave. “A gente tinha plena consciência de que, se não houvesse um aporte maior do governo federal, isso poderia vir a acontecer”, diz ele sobre os cortes de luz e água.
O dirigente sindical também reflete sobre como a situação impacta na atividade docente. “A UFRJ é uma das maiores universidades do país, tem muitos prédios históricos, museus, hospitais, que precisam manutenção específica. Acaba que não sobra recurso para apoiar a atividade docente”, pontua. Sobre o final de semestre, ele acrescenta: “O principal problema é a incerteza, não saber se vamos conseguir fechar o ano, se vamos chegar na sala de aula e poder dar aula”.
Orçamento em queda desde 2012
O governo federal repassa às universidades os recursos do chamado orçamento discricionário, ou seja, aqueles que devem ser usados para manutenção e investimentos. É com esse valor que são pagos, por exemplo, os fornecedores de alimentação do restaurante universitário, as bolsas de assistência estudantil, empresas de segurança patrimonial e manutenção predial e fornecedores, entre eles, os de água e energia elétrica.
Desde 2012, esse orçamento discricionário vem sendo constantemente reduzido na UFRJ, caindo de R$ 784 milhões naquele ano para apenas R$ 392 milhões em 2024, em valores corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Estima-se que apenas para pagar os valores de custeio e parcelas de dívidas seriam necessários R$ 743,9 milhões anuais, isso sem considerar a recuperação da infraestrutura ou novos investimentos.
A gestão da universidade precisa tomar decisões difíceis como, por exemplo, decidir entre cortar as bolsas ou atrasar o pagamento das contas de luz. E cresce também o endividamento: as despesas não pagas em um ano ficam para o ano seguinte. Em 2023, a UFRJ fechou o ano com uma dívida de custeio de R$ 176 milhões. A expectativa é que esse valor alcance R$ 192 milhões em 2024.
Cenário nacional
Segundo o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Planejamento e de Administração das Instituições Federais de Ensino Superior (Forplad), ligado à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), a rubrica orçamentária prevista para as universidades federais em 2024 foi de cerca de R$ 60 bilhões, o segundo menor valor observado no decênio analisado, com exceção somente de 2022, quando ficou na casa dos R$ 50 bilhões. Já o maior orçamento observado, até agora, ocorreu em 2015, com cerca de R$ 70 bilhões.
O Fórum apresentou ainda a depreciação do valor médio do orçamento discricionário por aluno de graduação, que caiu drasticamente em oito anos: de R$ 12 mil, em 2014, para perto de R$ 4 mil, em 2022.
“Os bloqueios orçamentários de emendas e a reprogramação dos limites de empenho no Ministério da Educação têm sido motivo de preocupação para as universidades federais. Vários gestores já relataram a impossibilidade de pagar todos os compromissos até o final do ano”, afirma o reitor José Daniel Diniz Melo (UFRN), presidente da Andifes.
Ele complementa que a entidade “está em constante diálogo com o MEC, apresentando as dificuldades financeiras das instituições e a importância da recomposição dos recursos para o fechamento das contas de 2024.”
UFSC executou 95,4% do orçamento previsto para 2024
Conforme o Painel da Andifes de Execução Orçamentária, a UFSC executou 95,4% do orçamento previsto para 2024, e conta com R$ 3,8 milhões para fechar o ano, dos R$ 162,4 milhões autorizados para 2024.
Com base nestes dados, a equipe de Imprensa da Apufsc-Sindical entrou em contato com a Secretaria de Planejamento e Orçamento (Seplan) e com a assessoria de imprensa do Gabinete da Reitoria no dia 18 de novembro, com os seguintes questionamentos: O recurso disponível é suficiente para fechar o ano? O governo federal anunciou a liberação 0,2% de verba congelada na Educação, e prometeu restante em dezembro (conforme reportagem da Folha). Já se sabe quanto a UFSC receberá deste recurso? Como está a situação da UFSC relacionada às contas de luz e água? Há dívidas em aberto? Existe risco de corte, como ocorreu na UFRJ?
Até a manhã desta terça-feira, dia 26, nem a Seplan, nem a assessoria de imprensa do Gabinete, haviam respondido aos questionamentos.
No início desse ano, a Reitoria da UFSC projetava um déficit de R$ 35 milhões em 2024, conforme mostrou reportagem da Apufsc-Sindical.
Atuar frente ao problema do financiamento das IFEs é parte do plano de ação da Diretoria da Apufsc-Sindical, que, localmente, acompanha a situação da UFSC e, nacionalmente, atua junto ao Proifes-Federação neste sentido.
Stefani Ceolla
Imprensa Apufsc
Com informações de Agência Brasil e Andifes