“Em casa que falta pão…”

*Por Aureo Moraes

A pretensão com estas linhas é compartilhar com todas e todos a reflexão sobre o sentido do  adágio que dá título ao texto. Muitos devem conhecê-lo. O complemento natural à frase é  “(…) todo mundo tem razão”. E penso que a sentença se aplica, ajustadamente, ao período que estamos vivendo na UFSC. 

Ainda que estejamos fragmentados enquanto comunidade universitária, nossas causas – ou  nossas razões, se preferirem – são aparentemente comuns a todas e todos. Ou alguém duvida  que o conjunto de segmentos na UFSC tem como objetivo perene a defesa da Instituição, a  necessidade de valorização dos trabalhadores – técnicos e docentes – a recomposição  orçamentária, a ampliação das ações de permanência estudantil, a nossa consolidação como  fonte fundamental na construção e disseminação do conhecimento? Ou ainda: não seria majoritária entre nós a persecução constante de princípios como Liberdade, Inclusão,  Solidariedade, respeito mútuo, enfim, a defesa de valores democráticos e republicanos? 

Cada um a seu modo, tenho certeza, há de concordar. Não julgo que haja, nesse momento da  vida da UFSC, uma ‘polarização’. Há, sim, uma ‘pluralização’. Afinal é disso que somos feitos. De  nossas diferenças, que nos tornam tão múltiplos. Mas também de nossas semelhanças, que nos  permitem conviver em um espaço de debate e crítica, de decisões coletivas e práticas  individuais.  

Lembro aqui do convívio com o saudoso Reitor Luís Carlos Cancellier e de seu sucessor, o prof.  Ubaldo Balthazar. Em ambas situações, ocupei a função de Chefe do Gabinete. No período inicial  de sua breve gestão – brutalmente interrompida – Cancellier viveu pelo menos dois momentos  delicados: o primeiro, no ato solene de posse, motivado por justas demandas estudantis. O  segundo, em outubro de 2016, quando a UFSC foi palco de ocupações promovidas pelos  movimentos estudantis, contrários à PEC nº 55, que propunha restringir os investimentos  públicos em saúde e educação, a reforma do Ensino Médio, a PEC da Escola Sem Partido e a PEC 65, do licenciamento ambiental. Em ambas, prevaleceu o bom senso, o diálogo e a tolerância.  Mas sem abrir mão de uma postura fortemente institucional, buscando aproximar-se do  necessário e afastar-se do sectarismo. 

Já o ex-Reitor Ubaldo viveu, por sua vez, também situações de grande tensionamento. Lembro  muito bem – e outras pessoas devem lembrar – do quanto a UFSC se uniu em torno da  autodefesa intransigente de sua natureza Pública, Gratuita e de Qualidade, enfrentando a  ameaça do “Future-se”. O que foram aquelas memoráveis reuniões no auditório Garapuvu,  inclusive sessões abertas do CUn, que reuniram milhares e milhares de pessoas… por diferentes  visões, com participação ampla dos segmentos da comunidade da UFSC, o projeto foi derrotado  fragorosamente. Nos estritos limites de nossas práticas institucionais. E, a partir de março de  2020, a pandemia da COVID-19 nos ‘atropelou’ violentamente! Onde fomos buscar a melhor  solução para conduzir a Universidade naqueles dias de terror e mortes? Na nossa capacidade de  articulação, de mediação, de busca por consensos. O modelo de governança que nos garantiu  reorganizar a vida implicou em ampla representatividade e participação. E, no momento  oportuno, o Conselho Universitário concebeu os instrumentos capazes de restabelecer nosso  cotidiano. De novo, nos estritos limites de nossas práticas institucionais. 

Ora. Temos demonstrado essa absoluta capacidade de superar ameaças, gerenciar crises sem  precedentes, modular nossas atitudes na busca do desejado equilíbrio. Por que, agora, haveria  de ser diferente?

O que defendo, por fim, é que seja possível à nossa Instituição aproximar-se do necessário,  escancarando diálogos, buscando à exaustão os consensos, não a unanimidade. Afinal, em nossa  casa está faltando o pão, e, de algum modo, todas e todos temos razão.  

*Aureo Moraes é professor do Departamento de Jornalismo da UFSC