Convicções e democracia

*Por Armando Lisboa

“Eu sou a luta. Eu não sou um dos que estão conceituados em luta, mas sou ambos os lutadores e a própria luta” (Hegel)

Esta semana tivemos duas Assembleias Gerais. Segunda feira (20/5), a AG de greve (convocada pela AG de greve anterior), com 344 docentes presentes. Não vi ninguém da Diretoria/Apufsc. Tampouco nossos dois diretores lá no Proifes, Bebeto e Romeu…

É provável que pouquíssimos (ou nenhum) dos 200 subscritores do abaixo-assinado pela outra AG dela tenham participado. Conheço talvez 1/3 destes, mas não vi ninguém…

Terça (21/5) realizou-se a AG convocada pela Diretoria, face ao abaixo-assinado, para apreciar o fim da greve. Conforme o Estatuto, seria uma AG com dois tempos: o presencial de debates, e o da votação on-line ao longo dos próximos dias.

Assim como eu, a grande maioria presente na primeira AG também a esta compareceu. Buscamos a unidade do movimento, e não apostamos na sua partição. Sabem o sentido da palavra “diabólico”? Dividir…

O espírito que me anima nestes momentos é o que Albert Hirschman expõe em “Auto-subversão” e em “A retórica da intransigência”.

Com o propósito de não nos aprisionarmos nas retóricas da intransigência, praticadas tanto por reacionários quanto progressistas, Hirschman alerta que a “superprodução de opiniões peremptórias” ameaça a ordem democrática.

De forma taxativa, aponta para o perigo das convicções no processo democrático: “é essencial que as opiniões não sejam formadas plenamente antes do processo de deliberação”. É vital, demonstra ele, este instante de interação e deliberação, quando novas informações e argumentos “podem surgir no decorrer de debates públicos”.

Este é o momento e o sentido das AGs. Nelas se exerce a arte da resolução de conflitos e agregação. A política não é o campo do “diálogo” de “eus” (como predomina no novo mundo virtual), mas o da formação do “nós”!

Se o debate público não elevar nossas compreensões, e simplesmente ficarmos aferrados a posturas pré-concebidas extremas e intransigentes, a democracia não faz sentido.

Assim, ingenuamente com meu Hirschman, achava que pelo menos na AG da terça, os colegas contrários à greve lá estariam, e teríamos um grande debate.

Mas, ao que parece, nenhum dos 200 subscritores do abaixo-assinado lá estavam. Sequer “diálogo de surdos” tivemos…

Saímos de lá atordoados, assustados com o grau de degradação moral/política a que pode descer dirigentes sindicais universitários. Presenciamos as mais deprimentes cenas destes 50 anos de história da Apufsc.

A implosão da AG foi toda premeditada pela Diretoria, que conduziu-a para este desenlace. Inclusive a clara violação do Estatuto. Impediu-se que a cédula de votação fosse apreciada. Calculadamente, abortou-se a etapa presencial da AG. Na sequência, de forma obviamente antiestatutária, iniciaram a etapa de votação com uma célula sequer discutida ou aprovada na AG.

Não, colegas, o assembleísmo dista completamente de ser o nosso problema. Hoje somos golpeados com práticas centralistas e autoritárias, afrontosas da práxis democrática. A Diretoria/Apufsc opera de modo cupulista e antissindical, ou seja, desmobilizador. Isto estava claro desde março: https://www.apufsc.org.br/2024/03/13/desmobilizando-a-categoria/.

Eles dobraram a aposta.

*Armando de Melo Lisboa é professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais do Centro Socioeconômico (CNM/CSE) da UFSC e ex-diretor da Apufsc-Sindical (2006-2010)