Pesquisa mostra quadro atual das espécies exóticas invasoras no Brasil, após uma década sem atualizações
Conhecer as espécies exóticas invasoras, consideradas uma das maiores causas da perda de biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos, é fundamental para prevenir sua disseminação e controlá-las. Um artigo publicado na revista Biological Invasions atualizou a lista brasileira dessas espécies, o que não ocorria há mais de 10 anos. O trabalho, elaborado por especialistas de diversos locais do país, contou com a participação do pesquisador Rafael Barbizan Sühs, pós-doutorando do Departamento de Ecologia e Zoologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e professor da universidade.
“Nosso trabalho envolveu a participação de professores, pesquisadores, técnicos do Ministério do Meio Ambiente e gestores de ONGs em um grande esforço conjunto para atualizar a lista”, contou Sühs. O artigo Invasive non‑native species in Brazil: an updated overview contou ainda com a participação de Silvia Renate Ziller, do Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental, que tem projetos em parceria com a UFSC.
A nova lista contém 444 espécies: 254 animais, 188 plantas e duas algas. “Algumas dessas espécies foram transportadas para o Brasil no início da colonização europeia nos anos 1500, mas a maioria dos primeiros registros datam do século passado, com numerosos primeiros 88 (20%) registros feitos após o ano 2000”, escreveram os autores no artigo (em tradução livre).
A lista de espécies exóticas, segundo Silvia Ziller, é uma referência para a gestão ambiental no país: “Serve como base para a definição de medidas de prevenção, detecção precoce e resposta rápida e controle, associada à definição de áreas e espécies prioritárias. A partir da lista existente será viável definir regras para o uso de espécies exóticas invasoras de importância em sistemas produtivos, o que gera oportunidade de qualificar a produção no sentido de prevenir impactos à diversidade biológica e aos serviços ecossistêmicos.”
De acordo com o pesquisador, a lista também é importante para que o público em geral tenha referência sobre espécies problemáticas que precisam ser evitadas no uso comum, como plantas ornamentais. Outra preocupação dos especialistas é que espécies de criação não sejam soltas e nem escapem para ambientes naturais, desde peixes de aquário ou aquicultura, até búfalos. Além disso, é preciso que os tutores de animais de estimação e domésticos tenham cuidado para evitar que eles causem impactos à fauna nativa.
Novos e velhos conhecidos
O Tojo e o Javali são “velhos conhecidos”, explicou o pesquisador, pois já estavam na última lista publicada. “São espécies invasoras que preocupam. O tojo, especialmente na serra catarinense, com algumas populações grandes já estabelecidas nos municípios de Lages e São Joaquim, invade ambientes abertos, começando com beiras de estradas. Essa espécie invade áreas campestres, como os campos de altitude, gerando prejuízos econômicos aos produtores (pois os animais não consomem essa planta, que é um arbusto bem espinhento) e para quem trabalha com ecoturismo, pois atrapalham as caminhadas, arranham as pessoas. Além do prejuízo ecológico ao destruir os belos campos de altitude. É uma espécie que precisa ser manejada o quanto antes para não chegar ao ponto de descontrole total, como é o caso do javali, que está presente em todo o Brasil e já conhecemos bem seus impactos ambientais, econômicos, culturais e sociais.”
Entre as novas espécies está o vime, que entrou na lista devido aos esforços de Ziller e Sühs, além de outros pesquisadores da UFSC, como alunos de pós-graduação de Ecologia da Universidade e a professora Michele de Sá Dechoum – que coordena o Laboratório de Ecologia de Invasões Biológicas, Manejo e Conservação (Leimac) e é uma das principais referências em invasões biológicas. “O vime tem uma situação delicada, pois é uma espécie que tem valor econômico, especialmente na serra catarinense, devido à produção de móveis. Mas o plantio de vime para ‘secar’ banhados, além de ilegal, gera impactos ecológicos drásticos, como a alteração do curso de rios e diminuição da diversidade de aves. Esses vimes que ficam abandonados acabam crescendo, se tornando grandes árvores e se espalhando pelos rios”, relata Sühs.
Outros exemplos de espécies que entraram na lista recentemente são a Anolis sagrei (uma espécie de lagarto), a Aphyocharax anisitsi (peixe conhecido por “enfermeirinha”), Phallotorynus victoriae (peixe conhecido como “barrigudinho”), Perna viridis (o mexilhão-verde) e Elodea canadensis (planta aquática conhecida como “elódea-comum”).
Onde acessar a lista
A lista ainda não foi publicada oficialmente pelo Ministério do Meio Ambiente, mas as espécies listadas podem ser acessadas através da Base de Dados Nacional de Espécies Exóticas Invasoras, mantida desde 2005 pelo Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental, que é atualizada continuamente. A lista também pode ser acessada na página da publicação do artigo, ou diretamente através deste link.
A lista foi elaborada a partir de dados como os da Base de Dados Nacional de Espécies Exóticas Invasoras e publicações técnicas e científicas. Também foram feitas consultas públicas abertas a todo o Brasil através de reuniões on-line a fim de estimular a participação pública e especialmente da comunidade científica, de gestores, técnicos na área ambiental e outros interessados.
“As sugestões recebidas foram analisadas criteriosamente e incluídas, ou justificada sua não inclusão. As espécies listadas precisam estar em conformidade com os seguintes critérios: ter histórico de invasão em algum lugar do mundo ou no Brasil; estar presente no país, com um ou mais pontos de ocorrência conhecidos e confiáveis. A lista foi elaborada no âmbito do Projeto GEF Pró-Espécies por uma consultoria especializada e em estreita cooperação com o Ministério do Meio Ambiente, o IBAMA e o ICMBio”, explica Silvia Ziller.
Fonte: Notícias UFSC