Representantes dos países da América Latina e do Caribe afirmam que ensino superior é direito humano universal, bem público social, e que deve ser garantido pelos Estados
A Cres+5 — reunião de acompanhamento da III Conferência Regional de Educação Superior (Cres 2018) —, realizada de 13 a 15 de março, no Centro Internacional de Convenções do Brasil, em Brasília, resultou na elaboração de um documento final que tem como objetivo o desenvolvimento sustentável da região da América Latina e do Caribe.
Uma das premissas da declaração final da Cres+5 é a luta contra a mercantilização e privatização dos sistemas educativos, em todos os seus níveis, bem como a promoção de controles que evitem essa tendência. A declaração também defende a educação como bem público, e não mercadoria.
Para a defesa desse modelo emancipatório, o documento afirma ser preciso defender o Estado Democrático de Direito, as instituições de educação superior, um sistema de ensino diversificado e uma ciência aberta, plural, inclusiva, humanística, além de reafirmar o sentido público dos conhecimentos.
O documento lembra, ainda, que os discursos negacionistas, anticientíficos, de líderes políticos que retomam visões dogmáticas e religiosas, representam um perigo para um modelo de educação mais inclusivo e igualitário.
O texto diz que “a educação superior deve contribuir para reparar a dívida histórica das sociedades e dos Estados contemporâneos com os povos indígenas e afrodescendentes; educar contra o racismo, a discriminação racial e todas as formas de intolerância; e fomentar políticas destinadas a promover a igualdade de oportunidades para mulheres e membros da comunidade LGBTQIA+”.
Compromissos
A declaração da Cres+5 apresenta compromissos para a construção de um novo modelo de ensino. Conforme está no documento, são necessárias a equidade e a formação das pessoas ao longo de suas vidas; os estudantes constituem o foco principal do nosso trabalho, no âmbito docente, de pesquisa, institucional ou social, pois representam o futuro de nossas comunidades e personificam os aspectos mais valiosos da nossa identidade e diversidade; a integração regional com a mudança das condições sob as quais se realizam as relações inter-regionais e globais; uma perspectiva descolonizadora deve constituir o centro da consciência latino-americana e caribenha; manifestamos nossa convicção em empreender uma ação coletiva entre governos, sociedades e instituições de educação superior, ciência e tecnologia, que atuem a favor de acordos de cooperação horizontais e solidários, de fomento e coparticipação de boas práticas.
Esses compromissos têm o objetivo de criar um cenário propício para o desenvolvimento significativo como bloco regional, orientado para o bem-estar e a equidade. Instamos o Espaço Latino-Americano e Caribenho de Educação Superior (Enlaces), as redes, as associações e os consórcios regionais e nacionais de educação superior a promoverem a criação de uma Agência Regional de Conhecimento (Arco) que promova a investigação, a extensão e a inovação colaborativas, solidárias e horizontais.
O documento endossa a vigência das instituições de educação superior como um espaço valioso para a construção de um futuro promissor baseado na cidadania plena, na justiça social, no desenvolvimento sustentável e na integração regional. Por fim, para promover a integração regional, os representantes recomendam que os Estados ratifiquem tanto a Convenção Regional quanto a Convenção Mundial de Reconhecimento de Qualificação de Ensino Superior.
Avaliações
Convergência é a palavra que define o espírito dos representantes de governos e organizações que prepararam a Cres+5. Ministros e representantes da América Latina e do Caribe entendem que a universidade gratuita é um direito universal do ser humano, instrumento de desenvolvimento social, preservação ambiental e sustentabilidade.
Os investimentos previstos, direcionados às pessoas mais simples, dão a oportunidade para que cada uma delas possa, no futuro, fazer a diferença nas diferentes áreas do conhecimento e encontrar soluções para temas urgentes, como a energia limpa e barata e a produção de alimentos e de água potável.
Para a presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Denise Pires de Carvalho, “esse documento deve avançar no sentido de determinarmos quais são as diretrizes para o avanço da educação superior”.
O secretário de Educação Superior do Ministério da Educação (MEC), Alexandre Brasil, afirmou que “já passou do tempo de se pensar na universidade brasileira, latino-americana e caribenha, onde os nossos, que foram colonizados e não tiveram voz, possam agora contribuir efetivamente para o desenvolvimento, justiça e democracia”.
Na avaliação de Francesc Pedró, diretor do Instituto Internacional da Unesco para a Educação Superior na América Latina e no Caribe (Unesco-Iesalc), a Cres+5 “foi uma oportunidade magnífica para reencontrar representantes de grupos de atores muito diversos, não só da região, como também de diferentes segmentos da sociedade. Conseguir encerrar essa conferência com um balanço do que têm sido estes últimos cinco anos — e ainda com uma lista de prioridades que implicam cada um dos atores — me parece um final fantástico”.
Já Oscar Domínguez, presidente do Enlaces, destacou a importância do reencontro de todos depois da Cres 2018: “Acho que nos reencontrarmos depois de 2018 e poder ver o estado da arte pós-covid e pós-impactos das transformações sociais é muito importante. O discurso do ensino superior está reposicionado, há a necessidade de aproximá-lo dos povos, das comunidades e há a necessidade de continuar discutindo vigorosamente sobre isso. Isso é ensino superior”.
Cres+5
A reunião de acompanhamento da Cres 2018, chamada de Cres+5, tem como público-alvo reitores, diretores, acadêmicos, trabalhadores, estudantes, redes de ensino superior, associações, profissionais, centros de pesquisa, sindicatos, representantes de organizações governamentais e não governamentais e todos os interessados na educação superior no continente.
Entre as atividades preparatórias para a reunião, foram organizadas diferentes instâncias de debate aberto e participativo, como parte do processo de construção metodológica do evento. Ao longo de 2023, ocorreram reuniões presenciais em Córdoba (Argentina), Puebla (México), Assunção (Paraguai) e Havana (Cuba). Além disso, foram realizadas consultas públicas virtuais preparatórias, a fim de debater e coletar informações sobre os 12 eixos temáticos da Cres+5, bem como contribuir para a realização da Conferência.
Fonte: MEC