Apesar de outras universidades brasileiras já terem políticas de acesso a pessoas trans, nenhuma tem a mesma abrangência da política aprovada na federal de Santa Catarina
Quinze anos após as primeiras políticas de ações afirmativas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o Conselho Universitário (CUn) aprovou, na última terça-feira, dia 8, a política institucional de acesso e permanência para pessoas transexuais, travestis, transmasculinas, transgêneras e não binárias.
A política abrange do ensino básico à pós-graduação, garante reservas de vagas na graduação, na pós e em concursos públicos, bem como acesso prioritário a editais de assistência estudantil. Contempla, ainda, o combate à transfobia, campanhas, programas e ações educativas e adequações de infraestrutura. Apesar de outras universidades brasileiras já terem políticas de acesso a pessoas trans, nenhuma tem a mesma abrangência da política aprovada na UFSC.
O grupo de trabalho para elaboração de uma política voltada a pessoas trans iniciou em 2021, à época sob a coordenação da antiga Secretaria de Ações Afirmativas e Equidade, gerida pela professora Francis Tourinho. Desde então, mais de 40 pessoas se dedicaram à tarefa, entre estudantes, técnicos-administrativos, docentes e integrantes das pró-reitorias de Permanência e Assuntos Estudantis (Prae), de Pós-Graduação (PROPG), de Graduação (Prograd) e do Colégio de Aplicação, além da Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Equidade (Proafe), que proôs a normativa.
“É um momento histórico que demarca uma nova posição institucional de enfrentamento às desigualdades de gênero”, resumiu a diretora de Ações Afirmativas e Equidade da Proafe, Marilise Luiza Martins dos Reis Sayão. “De fato, será um documento que servirá de inspiração para outras universidades que se proponham a enfrentar a transfobia e avançar em suas políticas de ações afirmativas e de promoção dos direitos humanos”, complementou.
“A aprovação de uma política dessa magnitude alçará a UFSC entre as primeiras universidades brasileiras que assumiu um compromisso pleno de equidade que abarque essa população, com uma concepção institucional que visará a garantir a permanência de estudantes trans e travestis na universidade, focada na criação de políticas de inclusão específicas que envolvam toda a comunidade acadêmica e setores da UFSC. Só dessa forma as ações concretas que serão viabilizadas pela aprovação dessa política permitirão ações efetivas de combate à transfobia e de promoção do bem-estar para estas pessoas, transformando a universidade num local seguro e acolhedor”, destacou Marilise Luiza Martins dos Reis Sayão, diretora da Proafe.
Reserva de vagas
A partir de agora, serão reservadas 2% das vagas dos cursos de graduação e pós-graduação e das vagas presentes em editais de transferências e retornos a pessoas trans, termo usado ao longo da resolução normativa como guarda-chuva que abriga as seguintes categorias: pessoa transexual, travesti, transmasculina, transgênera, não binária e outras que porventura surgirem.
Em concursos públicos para servidores docentes e técnico-administrativos e processos seletivos para professores substitutos, 1% do total de vagas ofertadas em cada categoria será destinada a esse público. O percentual será aplicado sempre que o número de candidatos a serem contratados for igual ou maior que oito. E, quando o número de vagas reservadas resultar em fração, deverá ser arredondado para cima.
Para concorrer às vagas reservadas na graduação, na pós e em concursos, será necessário se autodeclarar pessoa trans no ato da inscrição e validar essa condição posteriormente por meio de memorial descritivo, que deverá descrever a trajetória da transição de gênero e o processo de afirmação da identidade de gênero.
Toda a documentação será analisada por comissões de validação compostas por pessoas trans de movimentos locais e/ou estudantes de graduação ou pós-graduação que façam parte da Rede Trans UFSC; servidore técnico-administrativo que, preferencialmente, atue junto às políticas de ações afirmativas; representante de organização da sociedade civil atuante no combate à discriminação e/ou na promoção dos direitos da população trans; e servidor docente ou técnico-administrativo com pesquisa, ação de extensão ou atribuição de cargo que tenha relação direta com as questões que envolvem esse segmento populacional.
Permanência qualificada
Para além do ingresso, a política busca garantir a permanência qualificada, que abrange a criação de mecanismos que articulem a inserção de pessoas trans, suas necessidades como grupo e a garantia de um espaço de acolhimento respeitoso com as diferenças.
A política implementa a reserva mínima de 2% das vagas para pessoa trans em todas as modalidades de bolsas acadêmicas e nos editais de auxílio e programas de permanência da Prae. A pró-reitoria também fica responsável pela garantia de avaliação técnica especializada por parte de sua equipe de psicologia educacional quanto à análise da composição familiar desse público, considerando suas especificidades, e pela implementação de uma política institucional de permanência estudantil para pessoas trans.
O documento dedica ainda uma seção voltada ao enfrentamento à violência transfóbica, caracterizando atos e comportamentos transfóbicos, bem como penas e sanções. A resolução prevê também a promoção de ações e programas de cunho preventivo e educativo direcionados à formação continuada e qualificação de alunos, professores, técnicos e terceirizados em todos os campi, a qualificação do quadro técnico da ouvidoria para o recebimento de denúncias, campanhas de conscientização institucional a respeito de identidades de gênero e suas especificidades e a adequação de infraestrutura, com implantação de banheiros e vestiários inclusivos, entre outras ações.
Fonte: Notícias UFSC