Chefe do Departamento de Saúde Pública da UFSC, ele descreve a importância da representatividade na sua vida pessoal e profissional
“Se assumir é um elemento político muito importante, principalmente numa carreira como a nossa, porque não ensinamos só para a aula, mas também para a vida. Nós, como docentes, somos um ponto de marca e de transformação para os estudantes e para a universidade como um todo”. É dessa forma que o professor Rodrigo Moretti, chefe do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) descreve a importância da representatividade na sua vida pessoal e profissional. Ele integra o Conselho de Representantes da Apufsc-Sindical.
Atuando como professor de prescrição e terapêutica do curso de Odontologia na universidade desde 2009, ele tem mestrado e doutorado em Saúde LGBTQIA+ pela Universidade de São Paulo (USP) e já escreveu um livro na área de direitos sexuais reprodutivos dessa população. No início de sua formação como dentista, no final da década de 1990, Moretti explica que a Odontologia tinha um caráter muito clínico, privativo e distante de alguns grupos e classes sociais, e buscou sempre mudar esse cenário por meio dos ensinamentos que propaga para seus alunos.
Para Moretti, é fundamental que as diversidades e singularidades de pacientes sejam respeitadas e valorizadas para que todos tenham acesso e direito à saúde de forma igualitária. “Meu maior foco sempre foi conscientizar os estudantes. A ideia de ser um profissional de saúde inclusivo é o que me norteia tanto em nível de aula de graduação, como em pesquisas mais densas de doutorado, por exemplo, em que você está orientando de forma mais aprofundada”, explica.
No âmbito da saúde, a inclusão LGBTQIA+ em pesquisas e trabalhos científicos sempre foi um desafio para Moretti. Apesar da tradição de mais de 30 anos em estudos de gêneros e diversidade na UFSC, a área da saúde sempre esteve mais afastada da temática LGBTQIA+, em comparação às áreas de humanas ou comunicação. Ele explica que o fato das pesquisas se limitarem a divisão de sexos, entre masculino e feminino, contribuiu para que houvesse uma invisibilidade de singularidades ou similitudes, e uma certa LGBTfobia nas pesquisas acadêmicas.
O debate, a pesquisa e a discussão sobre esse tema motivaram o professor a integrar e se tornar o atual coordenador do grupo de trabalho (GT) de saúde LGBTQIA+ da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). No GT, ele atua com uma rede de pesquisadores que trabalham com saúde LGBTQIA+, que elaboram relatórios científicos e questionamentos sobre como o Ministério da Saúde pode implementar novas políticas públicas e revisar políticas voltadas para esta população.
Ocupando um cargo de liderança no CCS sendo um professor LGBT, Moretti diz que tem o privilégio de trabalhar em um ambiente acadêmico acolhedor, mas ressalta que nem sempre foi assim.
“A questão da minha orientação sexual, com certeza, ao longo do tempo se constituiu como um dificultador. Eu acabei encontrando barreiras e resistências pelo fato de não estar dentro da expectativa social do padrão de sucesso”.
Entre 1998 e 2001, período em que estava se graduando em Odontologia pela USP, ele conta que era raro ver casais LGBTs no campus. Boatos e piadas maldosas sobre alunos e docentes eram recorrentes. “É certamente o fato de você ter essa forma de receber, essa forma de interagir com a temática, que afastou muita gente como eu e outras pessoas e fez nos esconderem por muito tempo”, acredita.
Para ele, o trabalho realizado pelo Instituto de Estudos de Gênero (IEG) contribuiu para que a representatividade LGBTQIA+ estivesse mais presente dentro do espaço universitário e a LGBTfobia fosse combatida.
“A representatividade aparece porque eu, enquanto docente LGBT, falo e me assumo, isso permite que estudantes, docentes e servidores possam externalizar isso também. Então, você acaba sendo alguém que mostra que a diferença está presente”.
Filipe Mello
Imprensa Apufsc