Edital foi lançado nesta semana para preencher as vagas. Universidade aponta que alta taxa de abandono de estudantes, reflexo da pandemia, é um dos principais motivos para o número. Crise na licenciatura também contribui
A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) anunciou nesta semana a abertura de processo seletivo de transferências e retornos para admissão nos cursos de graduação, com ingresso a partir do segundo semestre de 2023. O número de vagas chama atenção: são 6,1 mil, distribuídas entre transferência interna e externa, retorno por abandono e retorno de graduado, e candidatos do vestibular.
As inscrições estão abertas de 22 a 30 de maio e ocorrem com o envio de e-mail com o formulário eletrônico e documentos exigidos às respectivas coordenadorias dos cursos. A lista de e-mails das coordenadorias, o quadro de vagas e os respectivos formulários estão disponíveis neste edital.
Cursos com maior número de vagas
Entre os cursos com maior número de vagas ofertadas estão os localizados nos campi da UFSC no interior – o de Engenharia Têxtil no campus Blumenau, por exemplo, tem 404 vagas – , e os de licenciatura – como em Matemática, com 286 vagas.
Confira a lista dos 10 cursos com maior número de vagas abertas:
Engenharia Têxtil, campus Blumenau: 404
Engenharia de Materiais, campus Blumenau: 317
Matemática – Licenciatura: 286
Agronomia, campus Curitibanos: 268
Química (noturno), campus Blumenau: 241
Engenharia de Aquicultura: 223
Física – Licenciatura (noturno): 217
Matemática – Licenciatura, campus Blumenau: 216
Engenharia Florestal, campus Curitibanos: 198
Ciência e Tecnologia de Alimentos: 156
Reflexo da pandemia
Segundo a pró-reitora de Graduação e Educação Básica da UFSC, Dilceane Carraro, mais de 6 mil estudantes abandonaram os cursos durante os dois anos de aulas remotas na pandemia de covid-19. A situação melhorou a partir do segundo semestre de 2022, quando a taxa de abandono voltou à casa dos 6%, com 1.046. Entre desistentes, transferidos e troca do curso, foram 1.615 estudantes.
Carraro reflete, porém, que apesar de a taxa de abandono estar voltando ao patamar de antes da pandemia, “a gente não recuperou esses estudantes” que abandonaram os cursos entre 2020 e 2021. O edital lançado nesta semana é uma tentativa de trazer de volta esses alunos.
“A gente disponibilizou cerca de 6,5 mil vagas no edital de transferências e retornos do semestre passado, e preenchemos cerca de 1,1 mil a 1,2 mil. Então 5 mil não foram preenchidas. Elas serão disponibilizadas novamente agora, com mais as vagas desse último semestre. Então é um edital novamente de mais de 6 mil vagas, porque aquelas pessoas que saíram durante a pandemia a gente não conseguiu ainda recuperar, essas vagas estão desocupadas”, analisa a pró-reitora.
Crise na licenciatura
Conforme matéria publicada pela Apufsc no mês de maio, o Novo Ensino Médio tem impacto direto nos cursos de licenciatura, já que exclui algumas áreas de conhecimento antes contempladas e cria novas exigências a professores e professoras. O debate entre especialistas, docentes e estudantes chama atenção para a importância de repensar ou até revogar o modelo. No início de maio, a Apufsc-Sindical realizou uma conversa pública sobre o tema.
Nas universidades, os colegiados de cursos de licenciatura se preocupam com a baixa na procura por formações de áreas que estão sendo afetadas pelo Novo Ensino Médio, como a redução de horas/aula em disciplinas como Matemática, Química e Física.
Segundo pesquisa do Instituto Semesp, na última década a porcentagem de ingressantes com até 29 anos em cursos de licenciatura teve uma queda de 9,8%, passando de 62,8%, em 2010, para 53%, em 2020. O professor Alaim Souza Neto dá aula para os cursos de licenciatura da UFSC e é líder do Grupo de Pesquisa Observatório de Práticas Curriculares (OPC/UFSC), e diz que observa um esvaziamento nas turmas. “Vai desde a baixa procura no vestibular, mas está nas salas de aula também, na desistência da formação”.
Dificuldade de preenchimento de vagas nos campi do interior
Entre os cursos com maior número de vagas abertas, chama atenção aqueles que ficam nos campi da UFSC no interior, principalmente em Blumenau e Curitibanos. Na cidade do Vale do Itajaí, há vagas para todos os cursos: Bacharelado em Química, Engenharia de Controle e Automação, Engenharia de Materiais, Engenharia Têxtil, Licenciatura em Matemática e Licenciatura em Química. Já em Curitibanos, estão disponíveis 495 vagas, distribuídas entres os cursos de Agronomia, Engenharia Florestal e Medicina Veterinária.
O diretor do campus da UFSC em Curitibanos, Juliano Gil Nunes Wendt, conta que a unidade teve seu ápice de estudantes matriculados antes da pandemia de covid-19, com 1,3 mil alunos. Quando as atividades presenciais foram retomadas, 700 retornaram. Atualmente, o número varia entre 800 e 830. “De fato nosso entendimento é de que a pandemia agravou esse problema”, analisa Wendt.
Mas não foi somente isso. “Tem outro fator aliado que é a vinda de várias instituições de ensino para Curitibanos no modo EaD. Tivemos uma série de baixas por isso, uma vez que a UFSC Curitibanos oferece somente Agronomia, Medicina Veterinária e Engenharia Florestal, e outras insituições oferecem outros cursos”, analisa o diretor. Wendt pondera, porém: “A gente entende que mesmo assim a UFSC mantém uma qualidade, um nome, e isso também pesa”.
Quase metade da população de Blumenau desconhece o campus da UFSC na cidade
O diretor do campus da UFSC em Blumenau, Adriano Péres, conta que teve acesso a um dado preliminar que mostra que até 45% das pessoas que na cidade não sabem que existe o campus local da universidade no município. “A gente ainda não tem uma identidade, por mais forte que seja a marca UFSC”, observa.
Sobra o alto número de vagas, Péres atribui, em partes, aos impactos da pandemia. “Nosso campus foi atingindo fortemente pela pandemia. Antes dela, chegamos a ter 1,5 mil alunos e estávamos em crescimento. Porém, depois daquele período, nosso número de matriculados chegou a cair para 980. Hoje recuperamos um pouco, temos cerca de 1,2 mil estudantes, e acreditamos que ainda vamos crescer”.
Graduação com maior número de vagas abertas, a Engenharia Têxtil é uma incognita para o diretor. “Ainda não temos uma visão muito clara sobre o que pode estar ocorrendo, porque no início era o curso que mais atraía matriculados. Realmente causa estranheza que esse curso, no berço da indústria têxtil, tenha baixa procura”, analisa. Mesmo assim, Péres reafirma a importância da graduação: “Nós acreditamos nesse curso, tanto é que oferemos mestrado na área”.
À respeito dos cursos de licenciatura, o diretor tem uma preocupação diferente. “Realmente, nossos cursos de licenciatura têm baixa procura. Mas reafirmamos nosso interesse de mantê-los até porque temos uma visão social. Se nós não formarmos professores, quem vai formar?”, questiona.
Péres complementa afirmando que todos os cursos oferecidos pela UFSC em Blumenau têm conceito 5 no Ministério da Educação (MEC). “A nossa marca é a alta qualidade”, reforça. Diz ainda que ações estão sendo feitas para reverter este cenário. “Temos agido na promoção dos nossos cursos no ensino médio e também no fundamental, mostrando que a UFSC Blumenau existe e está à disposição da comunidade”.
Nesta quinta-feira, dia 25, será realizada uma audiência pública para discutir a oferta de cursos da UFSC. O evento está marcado para as 19h, na Câmara de Vereadores, e toda a comunidade está convidada a participar. A audiência foi proposta pelo vereador Adriano Pereira (PT) a pedido da direção do campus. “Temos uma expectativa muito grande de que haja um anúncio de expansão do ensino superior federal por parte do Ministério da Educação e, se isto ocorrer, queremos estar preparados para atender às expectativas da comunidade regional. Sabemos que a comunidade almeja a diversificação de cursos públicos e gratuitos na região de Blumenau e queremos atender essa demanda oferecendo cursos com a qualidade UFSC que todos já conhecem”, diz o diretor do campus da UFSC em Blumenau.
A realização da audiência pública é uma das etapas da consulta pública externa sobre a oferta de novos cursos. Também estão sendo aplicados questionários para públicos específicos, como escolas, empresas e instituições da região, e, em breve, um formulário será disponibilizado no site da UFSC Blumenau para participação da comunidade em geral.
“São muitos os trâmites para oferecer um novo curso federal. O MEC é quem decide se vai ter o curso ou não. Se o MEC aprovar e nos der os respaldos, que são orçamento, vagas, docentes e técnicos, vamos oferecer”, explica Péres.
Stefani Ceolla, Filipe Melo e Lia Capella
Imprensa Apufsc