Uma das críticas feitas é a ausência do corredor exclusivo para ônibus, uma exigência da universidade ao ceder áreas ao município. Apufsc participou do evento. Nova audiência será realizada pelo Conselho Universitário nesta quarta-feira
A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) realizou na noite de sexta-feira, dia 14, a pedido da comunidade acadêmica, uma audiência pública sobre as obras na rua Deputado Antônio Edu Vieira e a implementação do sistema binário no entorno no campus da Trindade, em Florianópolis. O encontro foi marcado pela presença de autoridades, docentes, estudantes e Reitoria, e pela ausência de representantes da prefeitura de Florianópolis, que executa a obra. Nas falas dos presentes, ficou perceptível a insatisfação com as obras que, segundo o Departamento de Projetos de Arquitetura e Engenharia (Dpae/UFSC), não seguem o que foi acordado entre a universidade e a prefeitura para a cessão de terrenos da universidade ao município. O principal ponto de preocupação é a ausência do corredor exclusivo para ônibus, que era previsto no projeto original.
Aberta pelo reitor Irineu Manoel de Souza e pela vice-reitora Joana Célia dos Passos, no Centro de Eventos da UFSC, a audiência iniciou com a apresentação da diretora do Dpae, Fabrícia de Oliveira Grando, e da coordenadora de Planejamento de Espaço Físico do Dpae, Carolina Cannella Peña, de um histórico das obras.
Na fala de Carolina, ficou evidente a dificuldade de diálogo com a prefeitura. “Em fevereiro a UFSC soube do binário pela mídia. Formalmente o que foi enviado foi a alteração das linhas de transporte público”, relatou. Abordando cada etapa da obra na Edu Vieira, detalhando o que estava previsto no termo de cessão e o que está sendo entregue pela prefeitura, a engenheira explicou que “mesmo o projeto de 2018, que tinha corredor central para ônibus, tinha muitas falhas. Era muito focado nos carros e não no transporte público nem nos pedestres”.
Carolina comparou o projeto de 2018 com o de 2022 e afirmou: “a versão de 2022 é basicamente o mesmo projeto, mas sumiu o transporte público do meio”. Segundo a engenheira, “a prefeitura diz que é a primeira etapa e que o corredor central vai ser executado na segunda etapa”. No entanto, não foram apresentados prazos ao Dpae. Ela ainda afirmou que “eventualmente pode ter mais áreas da UFSC sendo cedidas pra implantação do transporte coletivo futuramente”.
Enquanto a obra na Edu Vieira caminha e a implementação do binário é anunciada pela prefeitura para ainda este mês, o Dpae discute com o município mitigações de problemas já identificados, como no entorno do Centro de Desportos.
“É fundamental a gente ter uma resposta”, defende diretor da Apufsc
Após a apresentação feita pelo Dpae, as autoridades que compuseram a mesa se pronunciaram. Estiveram presentes a procuradora Analucia de Andrade Hartmann, do Ministério Público Federal (MPF), o vereador Afrânio Boppré (PSOL), a vereadora Carla Ayres (PT), o comandante do 1º Comando Regional de Polícia Militar (CRPM), coronel Julival Queiroz de Santana, o professor Roberto de Oliveira, presidente da Associação Catarinense dos Engenheiros (ACE) e do Conselho Metropolitano para o Desenvolvimento da Grande Florianópolis (Comdes), e o professor Marcio Vieira de Souza, diretor de Comunicação da Apufsc-Sindical.
Hartmann disse que o MPF se atenta ao “prejuízo que a UFSC está tendo com a cessão de uma área valiosa, com prejuízos também à segurança interna da Universidade”. Os vereadores Afrânio Boppré e Carla Ayres expuseram a ausência de espaços de debate público sobre a obra. Segundo Afrânio, os projetos foram “gradativamente abandonados, golpeados os interesses da universidade e da comunidade”. O vereador pediu pela suspensão da execução da obra, para a realização de um “estudo de impacto de vizinhança”.
O coronel da PMSC, Julival Queiroz de Santana, expôs fragilidades da cidade. “A ilha tem um problema sistêmico de mobilidade. Sou doutorando da UFSC, sabemos o trabalho que a universidade vem fazendo ao longo de todos esses anos”. O oficial falou da duplicação da via e consequências que já afetam pedestres, ciclistas, transporte público e passagem de veículos de emergência: “Haverá que ter um consenso mínimo, mesmo sem unanimidade, já que a obra está em processo de finalização”.
O professor aposentado da UFSC e presidente da ACE, Roberto de Oliveira, também apresentou detalhes históricos sobre a obra e as dificuldades enfrentadas ao longo das últimas décadas pela UFSC. “Independente das pessoas envolvidas, achei que a entidade UFSC foi desrespeitada pela entidade prefeitura”.
Diretor de Comunicação da Apufsc-Sindical, o professor Marcio Vieira de Souza avalia como “preocupante o modo como essa obra está sendo feita”: “Pelo modo como a prefeitura fala desse binário, parece que a população é cobaia”. Morador do bairro Pantanal, por onde passam as obras, há 18 anos, Souza lamentou a ausência de representantes do Poder Executivo municipal na audiência. “A exposição da engenheira nos deu uma visão muito boa da perspectiva da UFSC, e ficou faltando a posição da prefeitura. Posso dizer, em nome da Apufsc, que vamos apoiar e ter presença ativa nessa audiência pública do CUn [Conselho Universitário], porque é fundamental a gente ter uma resposta mínima”.
Comunidade pede suspensão da implementação do binário
Ausente na audiência pública, o promotor de Justiça Daniel Paladino (MPSC) enviou justificativa em razão de um problema de saúde na família. Uma carta que seria entregue a ele pelas moradoras da região e representantes do Fórum Repensando o Binário, Mariana Nascimento e Marlene Alano Coelho Aguilar, foi lida durante a audiência, solicitando a suspensão do projeto de binário.
A carta teve o apoio de várias pessoas que fizeram o uso da palavra ao longo da audiência pública. Um deles, o professor aposentado do Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Lino Peres, clamou pela suspensão imediata e estudo de propostas alternativas, com responsabilização da prefeitura. Moradores do bairro Pantanal, Carvoeira e da Bacia do Itacorubi expressaram sua frustração com o processo, a morosidade e os perigos que poderão resultar da implementação da alteração viária sem que haja adequações. Representantes do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e movimentos políticos e sociais destacaram a necessidade de manifestação contundente da UFSC por meio de seu Conselho Universitário.
Outro docente do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC, José Ripper Kós, defendeu que as obras fossem interrompidas para que “um estudo sério das águas e dinâmicas dos córregos fosse realizado”. Problemas frequentes de inundações na UFSC e região podem estar sendo causados por reflexos das obras, afirma o professor, com embasamento também na documentação apresentada pelo Dpae.
Encaminhamentos e nova audiência pública
A procuradora federal Analucia Hartmann solicitou cópias dos relatórios citados, e disse que irá solicitar uma audiência judicial para tratar do tema. Hartmann sugeriu que a Procuradoria Federal junto à UFSC fizesse igual solicitação.
A vice-reitora Joana dos Passos convidou os presentes para a próxima sessão aberta do CUn, na quarta-feira, às 14h, que discutirá as obras da Edu Vieira. “Precisamos de uma ação combinada, com a UFSC e a comunidade unidas”, disse.
O reitor Irineu Manoel de Souza encerrou a audiência lembrando a todos que a principal demanda apresentada é o cumprimento dos acordos, com a implementação do corredor de ônibus e que a prefeitura se comprometa com a reconstrução dos espaços pedagógicos do Centro de Desportos, que atualmente tem dois de seus laboratórios muito próximos à via duplicada, o que prejudica as aulas e representa risco à comunidade. “Orçamos a obra de reconstrução dos laboratórios em R$ 4,8 milhões, e a contrapartida proposta pela prefeitura é de apenas R$ 1 milhão, aproximadamente. É fundamental levar esse debate para o Conselho Universitário na próxima quarta-feira”, concluiu.
Assista à audiência na íntegra:
Stefani Ceolla
Imprensa Apufsc, com informações da Agecom UFSC