Docente acredita que o cenário de desigualdade de gênero nas engenharias está ligado a uma questão cultural que surge ainda na infância
Uma das únicas quatro mulheres na turma de graduação de Engenharia de Controle e Automação nos anos 1990, Luciana Bolan Frigo conta que foi minoria durante sua formação. Professora do Departamento de Computação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), campus Araranguá, há 13 anos, hoje, segundo ela, a realidade continua parecida. Com o pai e a mãe da área de exatas, Luciana teve inspiração dentro de casa. Como docente, também busca apresentar esse mundo para meninas nas escolas, por meio do programa Meninas Digitais.
A docente acredita que esse cenário está ligado a uma questão cultural da infância. “As lojas de brinquedo têm a separação do que é de menina e do que é de menino. Os de meninas são mais voltados aos afazeres domésticos, cuidados, médico, enfermeira, enquanto os dos meninos mais ligados à tecnologia, carro, robô, avião.” Segundo Luciana, isso perpetua na sociedade a noção do que faz parte da natureza feminina e masculina e a familiaridade criada reflete na escolha da profissão.
Na universidade, esse estigma é visto na prática. A professora conta que ainda há relatos de alunas nos quais as famílias são contra a escolha delas de cursarem Computação, de que o desejo é que fizessem outra coisa.
O programa Meninas Digitais-UFSC, que Luciana coordena, se insere na faixa etária em que as crianças estão sendo apresentadas às oportunidades. Com oficinas e palestras, o campo da tecnologia é introduzido e visa atrair mais mulheres para a área da Computação. Ela ressalta que o mais importante desse contato é reafirmar que as mulheres podem fazer escolhas. “Quando a gente vai fazer uma oficina, eu sempre digo que não estamos ali para evangelizar, para dizer você tem que seguir a área de tecnologia.” E completa: “é mostrar a tecnologia e dizer que se você gostou, achou legal e gostaria de trabalhar com isso, você pode”.
Com graduação, mestrado e doutorado pela UFSC, Luciana argumenta que para aumentar a igualdade de gênero tanto na universidade, quanto no mercado de trabalho, “primeiro tem que fazer com que elas entrem”. “Não adianta a gente querer ter mais mulheres professoras se não temos mulheres com formação para ser essas docentes”, conclui. Atualmente o departamento de Computação da UFSC, em Araranguá, tem um quadro docente com quase um terço de mulheres, segundo Luciana, em outros setores das engenharias o número é mais discrepante.
Com uma realidade de gênero pouco diferente de quando começou a faculdade, Luciana lembra que nunca teve problemas com os colegas, mas que sentia falta de ter mais dos seus pares. “Era normal, mas claro que quando a gente chega na sala de aula leva um susto, não espera que sejam tão poucas.” Ela também enfatiza que essa diversidade não é importante só por uma questão quantitativa, mas para que a tecnologia atenda as demandas de mais grupos da sociedade. “Quando a gente coloca um grupo só de homens brancos e jovens, de certa forma a tecnologia que vai ser desenvolvida vai ter esse viés.”
Karol Bernardi
Imprensa Apufsc