Juliana é professora da Oceanografia e defende que a universidade seja um ambiente acolhedor para mulheres e mães
Juliana Leonel é oceanóloga pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande e doutora em Oceanografia Química pelo Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP). Ela tem dois pós-doutorados, um na área de poluição marinha e outro na área de paleoceanografia. Foi professora adjunta da Universidade Federal da Bahia por três anos e desde 2017 é professora da Coordenadoria Especial de Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde também é orientadora no Programa de Pós-Graduação em Oceanografia. Atua na área de poluição e geoquímica marinha, com enfase em poluentes orgânicos persistentes. Isso é o que consta no currículo lattes de Juliana. O que não consta, e ela reivindica, é que Juliana é mãe.
Em 2020, no período de isolamento social mais intenso provocado pela pandemia, nasceu Ian. E as atividades relacionadas ao trabalho de Juliana começaram ainda na licença-maternidade. “Minha experiência, além de tudo, foi na pandemia. Eu estava de licença-maternidade e não estávamos tendo aula. Quando eu iria retornar da licença, já estaríamos em trabalho-remoto. Mas teve todo um preparo antes disso, então eu tive que tirar um tempo durante minha licença para fazer as formações. No terceiro mês do meu filho eu já estava fazendo cursos, conversando com colegas para planejar as aulas remotas. Uma parte da minha licença foi roubada por isso”, lamenta a professora.
Quando as aulas foram retomadas, ainda online, Ian também entrou em cena. “Durante o período de atividades remotas, dei várias aulas com ele no colo”, recorda. E os desafios continuaram: “Desde que meu filho nasceu, eu não fui a campo, não participei de congresso presencial. Eu vi minha produção ficando para trás. Foi difícil para mim entender e me adaptar a isso”.
Viver essa experiências foi um dos motivos para que Juliana se tornasse uma das embaixadoras na UFSC do projeto Parent in Science, movimento que iniciou na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e tem o objetivo de discutir o impacto da parentalidade na carreira científica de homens e mulheres.
“Quando a gente tem filhos, é como se disserem: agora você tem que escolher, ou você é mãe, ou é pesquisadora e professora universitária”, reflete Juliana.
Para ela, um dos problemas está na carga horária. “A vida acadêmica não exige as 40 horas semanais, ela quer dedicação exclusiva sempre. E isso fica incompatível com a materndade. Não pode ser assim, a vida acadêmica não pode ser 100% a sua vida. A gente quer que a maternidade caiba no lattes”.
Além disso, ela pontua que as métricas utilizadas pela universidade e pelas agências de fomento prejudicam as mães. “Quando a gente tem filho fico mais difícil viajar, ir para congressos, ir a campo, e o sistema não permite isso. Então as mães, sejam professoras ou pós-graduandas, acabam ficando para trás nas pontuações. Nossa ideia é que o sistema comporte isso”.
Licença-maternidade para pós-graduandas
Desde 2017 existe uma lei que regulamentou a licença-maternidade na pós-graduação. Seria uma grande vitória se, na práticas, todas tivessem acesso. “Mas o que a gente vê: a pós-graduação tem que solicitar a licença, e algumas não solicitam porque vai aumentar o tempo de conclusão, e o programa sofre penalidades pela Capes”, exemplifica Juliana. E essa não é a única barreira: “Às vezes a aluna tem uma bolsa ligada ao orientador, não é da Capes ou CNPq. E aí orientador diz: se você sair de licença-maternidade não vai ter ninguém produzindo dados, eu não tenho como manter o projeto, então ou você sai do projeto ou não tira a licença”. Para a professora, “mesmo tendo o direito por lei, nem sempre está acessível às mestrandas e doutorandas.”
Por esse e outros motivos, Juliana defende uma mudança estrutural no sistema. “A gente precisa repensar o sistema. O que é proditividade? Hoje a gente foca em número de publicações, mas é muito mais que isso. É preciso observar as questões de cada uma: mães solo, mães atípicas, as mulheres em geral. A gente precisa de um sistema que olhe pra tudo isso e acolha”.
Stefani Ceolla
Imprensa Apufsc