*Por Nestor Roqueiro
Estou bastante ansioso esperando o dia 1° de janeiro, como muitos, imagino. Mas isso não me impede de olhar um pouco mais para frente e analisar possíveis cenários. Em particular, neste texto, queria tratar do futuro do sindicato. É claro que temos que observar a realidade política em que o sindicato está inserido e onde deverá agir. Esta realidade é fortemente polarizada por um lado e significativamente fragmentada por outro. A polarização decorrente da disputa eleitoral deste ano não se encerra em 1° de janeiro e a fenda instalada no seio da sociedade vai dificultar a busca de soluções consensuais ou amplamente majoritárias para muitos dos problemas que temos e dos que aparecerão. Isto significa que a comunicação vai ter um papel preponderante para dirimir conflitos. Aliás, sempre teve, mas hoje é mais importante do que nunca.
Sem uma excelente comunicação a fenda só tende a se aprofundar e a se alargar. A comunicação deve ter o objetivo de informar de forma clara, transparente e ampla a todos os agentes envolvidos na solução dos problemas de forma que estes possam tomar decisões bem fundamentadas. E todas as pessoas podem tomar boas decisões se estiverem bem informadas.
No caso do sindicato, os agentes são os dirigentes, óbvio, docentes, a população que se beneficia do trabalho docente e paga os impostos e os representantes nos órgãos colegiados. A tarefa não é simples, mas é imprescindível, senão continuaremos com os mesmos dirigentes tomando as mesmas decisões, muitas das vezes à revelia dos interessados e do benefício da maioria da sociedade.
A comunicação tem vários problemas, dentre eles a manipulação da informação e a linguagem a ser usada. No passado, já tivemos experiência com a manipulação de informação no sindicato, por exemplo na época das assembleias da então seção sindical em que a informação fragmentada e repetida era utilizada para conduzir participantes e/ou fazê-los desistir do debate para obter um resultado predeterminado na votação final em assembleias esvaziadas.
Claramente, neste caso, a classe não decidia nada. Outra forma de manipulação da informação é a escolha de representantes da classe para reuniões de alto nível, geralmente em Brasília, onde se tomavam decisões longe dos ouvidos e da possibilidade de reação da base do movimento docente.
O Proifes-Federação é diferente na forma, mas não na essência. Vide a última “decisão” de criar uma mesa de negociação permanente, longe dos ouvidos dos sindicalizados na base. É claro que esta proposta afasta propositadamente a base do movimento das instâncias de decisão. Porém, o mais grave é que progressivamente vai sendo criada a percepção de que não vale à pena participar do sindicato.
Se docentes não recebem informação de qualidade e, repetidamente, seja por manipulação ou por simples desprezo, as suas opiniões não são levadas em consideração para as decisões em questões importantes. O resultado é uma cultura de “vou escolher um dirigente para que ele faça tudo, já que nunca vou ser ouvido”, e a de “se o dirigente é amigo dos que estão no poder, talvez consiga algo para mim”.
Outro problema de comunicação é a linguagem usada, e este é um tema em que não vou me aprofundar pois meu conhecimento é empírico e pobre. Mas vou contar uma história que me aconteceu que, estimo, vai dar o pontapé inicial. Uma pessoa simples, não erudita, fez observações sobre o comportamento da camada mais pobre da população e não entendi claramente. Depois vi uma entrevista de uma pessoa erudita que disse basicamente o mesmo e entendi. Eu me perguntei: por que não entendi a pessoa simples, se tenho muito respeito e a considero uma pessoa inteligente? A resposta que encontrei foi que a linguagem do erudito é mais familiar para mim. Isto me alertou para o cuidado que devo ter em apreender a linguagem com quem quero me comunicar. E onde entra o sindicato aqui? Na comunicação com a população externa à universidade.
A segunda parte é sobre fragmentação. O resultado da última eleição presidencial estabeleceu que o país será comandado por uma frente ampla, e bota ampla nisso. Fora a extrema-direita, estão todas as linhas ideológicas representadas. O que significa que não tem linha ideológica alguma. Poderia ser bom, se isto demonstrasse que estão todos de acordo em que o fundamental é melhorar a qualidade de vida da população. Mas tenho minhas dúvidas, muitas.
Se chegamos aonde estamos é porque nenhuma das linhas ideológicas da frente ampla nem a extrema-direita conseguiram atender os anseios da população, e não me parece que isto vá a mudar. Não, pelo menos, se depender dos dirigentes. E onde entra o sindicato nisto? Que não é possível confiar que os dirigentes nacionais vão saber, ou querem saber, o que é melhor para nós.
Se não tivermos uma organização de base forte e participativa, o futuro que nos espera é o presente. Aumento de 9% nos salários, no melhor dos casos, oferecido pelo novo governo. E a sua participação nisso, meu caro leitor?
Precisamos cobrar do sindicato informação de qualidade e que nos ouça regularmente. Precisamos utilizar nossa inteligência coletiva para resolver nossos problemas e dar direção ao sindicato.
Nestor Roqueiro
DAS/CTC
* O artigo foi enviado em 22 de dezembro de 2022