Palestra de Michel Gherman, da UFRJ, fez parte da programação do Novembro Negro na federal de SC
Pensar em uma pedagogia antifascista é uma das chaves fundamentais para combater o nazismo e a ascensão da extrema-direita. Ao falar para um auditório cheio em meio à programação do Novembro Negro na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Michel Gherman, historiador e referência em estudos judaicos, sensibilizou a plateia para a importância de se discutir processos históricos para compreender um fenômeno que precisa ser combatido e derrotado. Gherman é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O evento realizado na última quinta-feira, dia 17, foi oferecido pela Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Equidade (Proafe) e planejado em meio a denúncias de manifestações nazistas na UFSC, que estão sendo investigadas e mobilizam a comunidade universitária para responder de maneira firme a atos criminosos. As professoras Leslie Chaves, pró-reitora de Ações Afirmativas e Equidade, e Marilise Luiza Martins dos Reis Sayão, diretora de Ações Afirmativas e Equidade, conduziram os debates.
“Santa Catarina tem sido nomeada como um dos estados com mais células neonazistas. Nós, professores e alunos, não podemos deixar que pessoas saiam daqui com um diploma técnico sem que passem por uma educação antifascista. É dever de todos nós”, pontuou a professora Lia Vainer Schucman, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC, responsável por direcionar perguntas sobre o tema da palestra para o convidado.
Para Gherman, a dimensão do fascismo exige que seja compreendido para que seja derrotado, o que envolve, por exemplo, perceber que ele se expande sempre que ocorre expansão de direitos sociais. “O fascismo não tem coerência ideológica, mas tem coerência discursiva. O racismo do fascista está estabelecido em locais de poder onde ele gostaria de estar”, disse.
O professor falou sobre como o “quarto de empregada” pode ser um símbolo metafórico da perda de privilégios da classe média que resulta em fenômenos como o de crescimento da extrema-direita. “A redução desse espaço gera ressentimento. A ideia de que o filho da empregada entrou na universidade e o meu não, gera ressentimento. Esse ressentimento era parte da Alemanha na década de 1930 e é parte do Brasil atual”, compara. Segundo ele, é nesse processo de perda de privilégios que a classe média decide “derrubar o tabuleiro”, um horizonte propício para o fascismo.
Gherman rejeita a ideia que se evite comparações entre nazismo e fenômenos que são expressão do conservadorismo e autoritarismo no Brasil. Segundo ele, é preciso acabar com a sacralização da história do nazismo. “É fundamental que a gente compare. Os elementos são parecidos: a criminalização do outro e a dimensão conspirativa estão ali. A dimensão conspirativa é a ideia de que se uma coisa mudou foi por causa de um grupo específico”, explica.
Essa dimensão conspirativa foi responsável pela perseguição aos judeus por parte dos nazistas, mas, segundo o professor, também pode ser vista na contemporaneidade. Por meio dela, por exemplo, é possível entender por que a extrema-direita rejeita as discussões sobre gênero, uma das pautas conduzidas por movimentos de esquerda. Elegem-se os grupos que reivindicam a inclusão dessas pautas como inimigos e, discursivamente, trabalham para destruí-los.
“O fascismo não tem projeto de futuro: tem projeto de passado. Por isso quando negros e indígenas reivindicam o passado são odiados pela extrema-direita”, afirma. O professor também lembra que o fascismo é o desejo da morte. “O inimigo da extrema-direita brasileira é aquele que não aceita ser subjugado”, diz, relembrando quando o presidente Jair Bolsonaro comparou quilombolas a animais. “A referência desumanizadora não é casual, pois para eles os brancos podem resistir, mas os negros têm de se submeter”.
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