Projeto foi apresentado como um substitutivo de autoria do senador catarinense Dario Berger (PSB-SC), que fez a relatoria e garantiu aprovação no Senado com envolvimento de entidades e articulação política
O Projeto de Lei Complementar (PLP) 235/19, que cria o Sistema Nacional de Educação (SNE), foi apresentado como um substitutivo de autoria do senador catarinense Dario Berger (PSB-SC), aprovado no Senado, e agora está em análise na Câmara dos Deputados. Pelo texto, a ideia é universalizar o acesso à educação básica e garantir padrão de qualidade; erradicar o analfabetismo; assegurar as oportunidades educacionais; articular níveis, etapas e modalidades de ensino; cumprir planos de educação nos entes federativos; e valorizar os profissionais da educação, entre outras ações.
O foco do sistema é especialmente a educação básica, mas conforme a assessoria do senador Dario Berger, nada impede que o ensino superior também seja discutido, respeitando a autonomia universitária.
Como princípios e diretrizes do SNE, são mencionadas a igualdade de condições para acesso e permanência na escola, na alocação de recursos e na definição de iniciativas; a articulação entre escola, trabalho e prática social; e ações inclusivas para alunos e populações de comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas.
Estados, Distrito Federal e municípios terão até dois anos para aprovar legislação específica para criação dos respectivos sistemas estaduais, distrital e municipais de educação. O Ministério da Educação deverá prestar assistência a todos.
“A aprovação do SNE representa o maior avanço na gestão educacional do nosso país das últimas décadas e, com certeza, terá reflexos no futuro de Santa Catarina e de todo Brasil. Teremos um novo modelo de ensino, de forma integrada e eficiente. Essa é uma vitória dos estudantes, dos professores, é uma vitória de todos que acreditam na educação como ferramenta de transformação”, destacou o senador.
O SNE, na prática, vai unificar políticas públicas e integrar a União, os estados e os municípios num regime de colaboração para que haja planejamento e para que sejam cumpridas metas de rendimento e resultados. A atuação dos entes passa a ser em conjunto e não mais separado em suas responsabilidades pelo sistema de ensino.
Berger exemplifica: “Temos a escola estadual A que comporta 1 mil estudantes, mas só tem 500 matrículas. No mesmo bairro, temos a escola municipal B, que está com uma fila de 300 crianças. Com o SNE, haverá uma maior facilidade para que o governo municipal e o governo estadual cheguem a um acordo, fazendo com que essas 300 crianças e seus professores possam ocupar a infraestrutura da escola estadual ociosa. Isso traz economia porque o município não fica pressionado a fazer mais escolas e traz praticidade, tendo em vista que os pais não precisarão colocar seus filhos em escolas mais distantes”.
A pandemia também mostrou a importância de o país ter uma articulação nacional em educação. Não foram raros os casos de termos, num mesmo bairro, uma escola estadual aberta e uma escola municipal fechada para aulas presenciais, e vice-versa. “A falta de coordenação nacional trouxe diversas dificuldades a todos – questão que ficará superada com a pactuação e a cooperação dentro do Sistema Nacional de Educação”, pontuou Berger.
Uma das contribuições mais importantes aderidas pelo relator se refere ao Custo Aluno Qualidade (CAQ) – um mecanismo que define quanto o governo deve investir por estudante ao ano para cada etapa da educação básica pública.
Tramitação
Conforme matéria do site Outras Mídias, há 90 anos profissionais, pesquisadores e militantes da área defendem a criação do SNE como estratégia para incentivar e viabilizar uma maior cooperação entre municípios, estados e governo federal. Agora, em 2022, depois da experiência traumática da pandemia – e talvez incentivado por ela –, tudo indica que finalmente essa proposta vai sair do papel.
Conforme a Agência Câmara, o projeto tramitará em conjunto com iniciativa da Câmara (PLP 25/19) e será analisado pelas comissões de Educação; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Depois seguirá para o Plenário.
O deputado Idilvan Alencar (PDT-CE) avalia que a proposta para criação do SNE poderá ser votada pelo Plenário da Câmara dos Deputados ainda neste ano. A iniciativa é uma das prioridades da Frente Parlamentar Mista da Educação.
“É totalmente possível”, afirmou Alencar, relator e autor de um substitutivo sobre o tema aprovado pela Comissão de Educação da Câmara. “O Sistema Nacional de Educação não é pauta do partido A, B ou C, mas de todos”, explicou o deputado. “Não vejo muitas dificuldades de chegarmos a um acordo”, concluiu.
Articulação política e com entidades resultou na aprovação no Senado
Yuri Santos, assessor parlamentar do senador Dario Berger, que participou ativamente da elaboração do projeto, conta que a ideia do sistema remonta aos anos 1930, quando se discutia que um país do tamanho do Brasil precisaria ter melhor articulação entre os entres federados para que tivesse a melhor educação possível. “Na Constituição também foi discutido, mas a lei nunca foi pra frente. Os projetos sempre morriam nas constuições, nunca chegaram a ser votados”, explica.
Em 2019, Berger foi presidente da Comissão de Educação e trouxe para si a relatoria do projeto. “Entendendo a importância, trouxe para a relatoria dele próprio. O senador queria começar o trabalho no início de 2020, mas com a pandemia, a discussão começou em junho. A gente sabia que os desafios eram grandes e que o único jeito de passar era com muito diálogo. Então discutimos com conselhos, entidades, sindicatos”, conta o assessor.
O diálogo também se deu com as demais bancadas: “Do ponto de vista legislativo, a gente conquistou algo que era imaginável, inclusive com apoio de governistas”, reforça Yuri, pontuando que Berger é oposição ao governo Bolsonaro.
O senador enfatizou que durante o processo de construção do relatório foram realizados muitos debates temáticos no Senado, além de mais de 50 reuniões em que se reuniram muitas entidades e profissionais especialistas em educação. Em sua opinião, o SNE constituirá a “maior política educacional que esta geração de parlamentares tem a oportunidade e a responsabilidade de aprovar”.
Berger complementou: “Esse texto foi construído a muitas mãos, após reuniões com entidades, associações, especialistas e, mais recentemente, com o próprio governo federal, por meio da Secretaria de Governo, do Ministério da Economia e do MEC. Não posso deixar de mencionar grupos que nos ajudaram a construir esse relatório desde o início, como de secretários estaduais e municipais de educação, conselheiros, fóruns de educação, a Confederação Nacional dos Municípios, e o Movimento Todos pela Educação”.
Histórico
De acordo com o site Outras Mídias, legalmente, a ideia de um Sistema Nacional de Educação foi incluída no texto da Constituição Federal em 2009 por meio da Emenda Constitucional 59. Desde o texto original, no entanto, o artigo 211 da Carta define que deve haver “regime de colaboração entre os sistemas de ensino”. E, para dar conta de tudo isso, em 2006 a Emenda Constitucional 53 alterou o parágrafo único no artigo 23 estabelecendo que “leis complementares” (no plural) deveriam “fixar normas para a cooperação entre a União e os estados, o Distrito Federal e os municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional”.
Faltava, portanto, uma regulamentação do que a Constituição anunciava. E essa é, precisamente, a função da nova lei que sairá do Congresso este ano, se a aprovação do Senado se confirmar na Câmara.
No projeto, a principal estratégia para incentivar essa articulação é a criação de instâncias de pactuação entre os entes federados, em moldes muito semelhantes às que existem no SUS, o Sistema Único de Saúde. Até os nomes são praticamente iguais: comissões intergestores tripartite e bipartite da Educação, respectivamente, Cite e Cibe. A primeira envolve os três níveis de governo, incluindo a União; já a segunda é espaço de negociação entre os gestores da educação dentro de um mesmo estado.
De acordo com o texto, esses são “fóruns responsáveis por definir parâmetros, diretrizes educacionais e aspectos operacionais, administrativos e financeiros do regime de colaboração”, com o objetivo de garantir uma “gestão mais coordenada da política educacional”.
“Não há hoje no país um espaço onde os gestores municipais, estaduais e federais de educação se reúnam para conversar”, explica Yuri Santos.
A expectativa, portanto, é que, com um Sistema Nacional de Educação, a diversidade da educação brasileira seja protegida junto a um compromisso de unidade “em termos de garantia de acesso e permanência”.
CONFIRA AS PRINCIPAIS DIRETRIZES ESTABELECIDAS NO SNE:
• Estrutura de escolas com padrões mínimos de qualidade;
• Valorização e o desenvolvimento permanente dos profissionais da educação e dos gestores educacionais;
• Conciliação da educação com o uso de novas tecnologias;
• Erradicação do analfabetismo e das desigualdades regionais de educação;
• Assegurar padrão de qualidade das instituições formadoras de docentes, incluindo prática docente durante o processo de formação;
• Incorporar tecnologias da informação e do conhecimento nas práticas pedagógicas escolares.
Leia também: Por que criar um Sistema Nacional de Educação?
Imprensa Apufsc