Coluna de Marta Arretche*, ao Nexo, afirma que revelações recentes sobre a liberação de verbas para a educação no Brasil mostram que perdemos em impessoalidade e laicidade na distribuição de recursos voluntários
*Marta Arretche é professora titular do Departamento de Ciência Política da USP e pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole. Foi editora da Brazilian Political Science Review (2012 a 2018) e pró-reitora adjunta de pesquisa da USP (2016 a 2017).
O Brasil tem atualmente 3,5 mil escolas inacabadas esperando por recursos. Mas o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) autorizou a construção de 2 mil novas escolas em 2022, segundo matéria publicada na revista Piauí. Matéria da Folha de S.Paulo, denunciou no mês de abril que sete cidades alagoanas receberam neste ano R$ 26 milhões pelo mesmo FNDE para adquirir kits robótica, embora apresentassem deficiências básicas de infraestrutura, como falta de salas de aula, internet, computadores e até água encanada. O próprio ministro que saiu atirando (não se trata de uma figura de linguagem!) municiou a denúncia de que pastores evangélicos intermediavam a liberação de verbas do mesmo FNDE para os municípios, a pedido do presidente da República.
Se ao ler essas reportagens você teve a sensação de ter voltado no tempo, você está certo! Os escândalos do FNDE revelam que o Brasil andou para trás nos esforços para racionalizar a distribuição das transferências voluntárias do governo federal.
O que são transferências voluntárias? São recursos financeiros repassados pela União aos estados, Distrito Federal, municípios e organizações da sociedade civil, em decorrência da celebração de convênios ou outros instrumentos similares, cuja finalidade é a realização de obras e/ou serviços de interesse comum. São chamadas de voluntárias, porque, como o próprio nome diz, o governo federal não é obrigado por lei a fazê-las.
Há evidências de que a distribuição das transferências voluntárias no Brasil é afetada por alinhamento partidário. Estudo de Mauricio Bugarin e Fernanda Marciniuk publicado no Journal of Applied Economics revela que esses repasses aumentam em anos eleitorais e que municípios alinhados politicamente ao presidente obtêm maior volume de recursos, seja diretamente (contornando governadores de oposição) ou por meio de repasses que passam pelos governadores alinhados.
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