Confira o parecer elaborado pelo Grupo de Trabalho do sindicato
A PEC 32 (Reforma Administrativa) foi apresentada ao Congresso Nacional em setembro de 2020, desde então, a Apufsc juntamente com outros sindicatos se mobilizam para discutir a proposta e evitar a sua aprovação.
Na UFSC, realizamos debates sobre a Reforma em quase todos os Centros e campi, além de alguns Departamentos[1]. Dialogamos com parlamentares, contribuímos com mobilizações nas redes sociais, produzimos materiais informativos e participamos de atos e protestos presenciais contra a PEC.
No dia 11 de maio de 2021, o Deputado Darci de Matos (PSD-SC) apresentou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, parecer pela admissibilidade da proposta, entretanto, rejeitou a concentração de poderes nas mãos do Executivo e o princípio da “subsidiaridade”, que possibilitava a redução do papel do Estado na prestação de serviços públicos. As duas rejeições foram importantes, mas o eixo da proposta ainda estava na mesa: o fim da estabilidade.
Após a aprovação da PEC na CCJ, ela foi encaminhada para a Comissão Especial, em que o Deputado Arthur Maia (DEM-BA) apresentou seu relatório no dia 1º de setembro de 2021. Ainda que o relatório contenha pontos bastante discutíveis, podemos considerar que é uma vitória da mobilização dos sindicatos juntamente com a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público. Sem a atuação coletiva realizada a nível local e nacional, a PEC teria sido aprovada da maneira proposta pelo Ministro da Economia, produzindo o desmonte do Estado brasileiro e a precarização das relações de trabalho no serviço público. Os impactos para os servidores, mas também para a população brasileira seriam muito significativos. Em tempos tão difíceis como estes, em que o serviço público, as universidades e as instituições seguem sendo atacadas e destruídas por dentro, é muito importante conseguirmos reverter alguns destes processos e reconhecer a potência da mobilização coletiva para evitar retrocessos.
Avaliamos, no entanto, que a vitória foi apenas parcial, pois o substitutivo da PEC apresentado pelo Deputado Arthur Maia ainda está em discussão na Comissão Especial. Este substitutivo é melhor do que a proposta original porque mantém a estabilidade para todos os servidores (não somente para cargos exclusivos de Estado), enfatizando que a estabilidade é “um instrumento de defesa em favor dos cidadãos e não em prol dos servidores. Trata-se de mecanismo que inibe e atrapalha o mau uso dos recursos públicos, na medida em que evita manipulações e serve de obstáculo ao mau comportamento de gestores ainda impregnados da tradição patrimonialista que caracteriza a realidade brasileira.”
Outros pontos positivos são a exclusão do “período de experiência” com a manutenção do estágio probatório e a retirada dos cinco novos vínculos antes previstos, com destaque para os cargos por prazo indeterminado e os cargos de liderança e assessoramento.
Apesar destes avanços, o substitutivo mantém a previsão da regulamentação por lei ordinária da Demissão por Avaliação de Desempenho (art. 39-A e art. 41, III), a ser aplicada a todos os servidores (inclusive os que já são estáveis). Indica que para esta avaliação deverão ser estipuladas metas de desempenho individual e que será considerada a satisfação dos cidadãos, a ser apurada por meio da plataforma Gov.br (art. 2º, §3º, I e §5º).
Ao prever a possibilidade de se regulamentar a avaliação de desempenho por lei ordinária, a PEC permite que o tema seja objeto de de Medidas Provisórias, que podem determinar, sem amplo debate democrático, como a avaliação será realizada. Além disso, a aferição de satisfação dos cidadãos por meio de plataforma virtual, amplia as possibilidades de manifestações enviesadas e discriminatórias, que podem prejudicar indevidamente os servidores. Por sua vez, a estipulação de metas de desempenho individual representa a consagração do modelo gerencial de gestão do Estado, com possibilidade de aumento significativo de exigências de produtividade para os servidores e consequente adoecimento no trabalho.
A precarização das relações de trabalho no serviço público também é ampliada pela previsão de contratação de servidores temporários por período mais longo, de até 6 anos (art. 3º, § 2º). Hoje, a contratação de professores substitutos no âmbito federal é limitada ao máximo de 2 anos, por exemplo (art. 4º, Parágrafo único, I da Lei nº 8.745/93).
Ao prever que a demissão de servidor público poderá ser feita após decisão de órgão colegiado (art. 41, § 1º), a PEC flexibiliza a coisa julgada e torna as demissões mais rápidas. Mesmo que, por exemplo, um Tribunal Superior posteriormente reconheça a ilegalidade da demissão revertendo-a, esta já terá ocorrido e produzido impactos negativos na vida do servidor.
A proposta também flexibiliza a estabilidade ao criar uma nova hipótese de demissão dos servidores, por meio da declaração legal de um cargo como desnecessário ou obsoleto (art. 41 §3º), que acarretará a demissão, ainda que com possibilidade de pagamento de indenização.
Esta previsão, assim como a demissão por avaliação periódica de desempenho, precisam ser lidas juntamente com a manutenção do art. 37-A da proposta original que prevê os “Instrumentos de cooperação” como uma forma de contratação de empresas para a execução de serviços públicos. Assim, caso muitos servidores em um mesmo órgão sejam demitidos, por avaliação de desempenho ou porque os cargos públicos que ocupavam foram extintos após declarados desnecessários ou obsoletos, o Estado poderá celebrar um “Instrumento de Cooperação” com a iniciativa privada para executar esses serviços públicos. Sejam serviços de educação ou saúde, por exemplo.
A terceirização da prestação de serviços públicos de educação é reforçada pela criação, pelo substitutivo de Arthur Maia, dos “cargos exclusivos de Estado” (ele altera a nomenclatura com relação à proposta original de Paulo Guedes que se referia a “cargos típicos de Estado”), entre os quais não estão incluídos aqueles relacionados à educação e saúde.
Segundo o art. 37 da PEC são cargos exclusivos de Estado aqueles “voltados a funções finalísticas e diretamente afetas à segurança pública, à representação diplomática, à inteligência de Estado, à gestão governamental, à advocacia pública, à defensoria pública, à elaboração orçamentária, ao processo judicial e legislativo, à atuação institucional do Ministério Público, à manutenção da ordem tributária e financeira ou ao exercício de atividades de regulação, de fiscalização e de controle”.
Para estes há critérios e garantias especiais para a perda do cargo (art. 247) e a vedação de contratação de temporários e redução de jornada com redução de remuneração (art. 37, § 20).
Podemos concluir que, ainda que tenha havido avanços quanto à proposta original da PEC 32, a atual proposta tem pontos negativos: precisamos lutar para que sejam totalmente alterados. Enfatizamos a possibilidade de se restringir a atuação direta do Estado às funções exclusivas, tornando a educação e saúde públicas serviços passíveis de terceirização, com a consequente queda na qualidade no serviço e precarização nas relações de trabalho. Assim, a mobilização em defesa da vida, do SUS e da educação pública precisa continuar!
[1] O GT da Apufsc sobre a Reforma Administrativa iniciou as conversas com os docentes com uma reunião virtual com o campus de Curitibanos (24/04), depois se seguiram CFM (30/03), CSE (26/03), CCS (31/03), CTC (28/04), CFH (1º/04 e 20/05), CCB (09/04), Colégio Aplicação e NDI (06/04), Joinville, CCA (20/04), Conselho Universitário (27/04), Departamento de Física (26/04), Departamento de Botânica (30/04), Departamento Biologia Celular (03/05), Departamento Matemática (06/05), CED (11/05), Departamento Microbiologia, Imunologia e Parasitologia (11/05), CCE (11/05), Araranguá (19/05), Departamento de Jornalismo (25/05) e Blumenau (07/07).
GT Reforma Administrativa – APUFSC-Sindical: Alex Degan, Carmen Maria Olivera Muller, Daniel Ricardo Castelan, Luana Renostro Heinen, Luiz Gonzaga de Souza Fonseca