O professor da UFSC José Rubens Morato Leite reforça a importância da decisão
A Justiça Federal concedeu uma liminar que institui um sistema de governança ecológica, envolvendo múltiplos atores, para a defesa e preservação da Lagoa da Conceição, em Florianópolis. A decisão liminar foi proferida em uma Ação Civil Pública Estrutural promovida por pesquisadores do Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental e Ecologia Política (GPDA) e do Observatório de Justiça Ecológica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em nome de entidades da sociedade civil organizada.
O juiz Marcelo Krás Borges, da 6ª Vara Federal de Florianópolis, que deferiu a proposta da Ação Civil Pública, determinou em sua decisão a instituição liminar da Câmara Judicial de Proteção da Lagoa da Conceição, “com a finalidade de assessorar este Juízo na adoção de medidas estruturais necessárias para garantir a integridade ecológica do ente natural através de uma governança judicial socioecológica”. A Câmara será formada por representantes de 15 instituições, entre órgãos públicos, representantes da comunidade acadêmica e das entidades autoras. A UFSC vai participar através de três laboratórios e um núcleo de estudos (veja abaixo a lista dos integrantes).
A ação judicial tem como autores a União Florianopolitana das Entidades Comunitárias (Ufeco), a ONG Costa Legal e a Associação Pachamama. O juiz aceitou um pedido dos autores e o Ministério Público Estadual (MPSC) e Ministério Público Federal (MPF) ingressaram na ação como parte interessada na causa, ao lado das associações. No outro polo da ação figuram como réus o Município de Florianópolis, o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA), a Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis, o Estado de Santa Catarina, a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) e a Agência de Regulação de Serviços Públicos de Santa Catarina.
Problema histórico
Na sentença, o juiz acolhe os argumentos e razões apresentadas pelos autores da ação, que alertam para o progressivo comprometimento ambiental da Lagoa da Conceição. “Com efeito, existe um problema histórico envolvendo o despejo de efluentes de modo impróprio e ilegal no sistema lagunar. Os estudos científicos juntados pela parte autora demonstram inequivocamente o grave comprometimento dos sinais vitais da Lagoa da Conceição e para o agravamento dos riscos e danos em cenário futuro próximo, com risco de irreversibilidade. As evidências científicas são contundentes e já indicam um quadro de colapso”.
A decisão reconhece também a ineficiência da gestão e da governança para proteção da qualidade ambiental da Lagoa e até mesmo a ineficácia de decisões judiciais neste sentido. “Com efeito, possui razão a parte autora, pois a caracterização da incapacidade reiterada de governança da Lagoa da Conceição restou evidente no episódio do extravasamento ou rompimento da Barragem de Evapoinfiltração, ocorrido no último 25 de janeiro de 2021”.
A falta de cooperação, de comunicação e de efetividade dos agentes públicos, segundo o juiz, demonstram a existência de “um problema de natureza estrutural”. Por isso, ele entendeu como necessária a criação da Câmara Judicial de Proteção da Lagoa da Conceição. Agora, os órgãos e entidades citados pelo juiz terão 15 dias para designar os integrantes da Câmara e prestar “informações atualizadas sobre as medidas que estão sendo adotadas e os principais problemas diagnosticados para a proteção da integridade ecológica, manutenção e a restauração dos processos ecológicos essenciais da Lagoa da Conceição”.
O professor José Rubens Morato Leite, titular do Centro de Ciências Jurídicas (CCJ) e coordenador do GPDA, destaca a importância da decisão. “A liminar é um precedente de suma importância para o direito ambiental no país, já que traz a teoria do direito ecológico e insere uma nova abordagem a um caso prático de forma mais efetiva. A Lagoa da Conceição passará a ter uma proteção não fragmentada, mas sim sistêmica, amparada por uma governança plural, a qual inclui os direitos das gerações presentes e futuras e resgata este bem imaterial da Ilha de Santa Catarina do colapso”, avalia.
De acordo com o professor, a decisão representa um grande avanço no direito ambiental brasileiro, ampliando a discussão das noções de direito ecológico sistêmico, pluralista, e considerando as noções de integridade ecológica. Na ação, foram usados como fundamento legal o artigo 225 da Constituição Federal, capítulo do Meio Ambiente, e o artigo 133 da Lei Orgânica no Município, que trata da natureza como sujeito de direito.
Leia na íntegra e confira os integrantes da Câmara Judicial de Proteção da Lagoa da Conceição: Notícias UFSC