Estado enfrenta pior momento da pandemia, com 94% de ocupação dos leitos de UTI
Com uma taxa de ocupação das UTIs do SUS em 94,05% e um total de mortes por Covid que supera 7,1 mil, Santa Catarina enfrenta seu pior momento na pandemia e está na iminência de um colapso do sistema de saúde. Nesta quarta-feira (24), o governo do Estado publicou um novo decreto, com restrições à circulação de pessoas e ao funcionamento de estabelecimentos.
Na prática, as mudanças são tímidas em comparação com o decreto de 18 de dezembro, que já estava em vigor, e insuficientes, na avaliação de pesquisadores da UFSC. Há pouca novidade no último decreto. As casas noturnas, por exemplo que já estavam proíbidas de abrir em regiões com situação gravíssima, agora são proíbidas em todos os níveis de risco. Atualmente, todas as regiões do Estado, exceto a Carbonífera, estão em situação gravíssima. O limite de ocupação de bares, feiras, igrejas e cinema que era de 30% passou para 25% com o novo decreto. Os estabelecimentos devem permanecer fechados entre meia-noite e 6h.
Em contrapartida, o secretário de saúde de Santa Catarina, André Motta Ribeiro, enviou mensagem aos prefeitos catarinenses nesta quinta-feira alertando para o colapso do sistema e pedindo medidas mais restritivas nos municípios.
Para o epidemiologista e professor do Departamento de Saúde Pública da UFSC Lúcio José Botelho, as medidas do recente decreto estadual estão muito aquém do que seria necessário no momento para conter a disseminação do vírus. “Vemos o pior cenário acontecer e estamos atônitos pela indicação de que irá piorar. Todas as evidências levam a crer que essas medidas do decreto são pífias”, afirma. Ele explica que, no momento, não há controle na transmissão da doença, ou seja, o aumento do número de casos é gigantesco, o que amplia a necessidade de internação. Como não há capacidade de internar as pessoas com uma boa condição e estrutura, a tendência é que o número de mortes siga na curva crescente.
A professora Josimari Telino, do Departamento de Saúde Pública da UFSC, diz que o decreto de dezembro já era ineficaz, em um momento em que a pandemia não era tão grave. “Agora, temos variantes circulando e com maior transmissibilidade. Em poucos dias, assistiremos o sistema hospitalar se esgotar em todas as regiões.”
Enquanto os pesquisadores fazem alertas para a situação de colapso iminente no Estado, entidades empresariais se manifestaram em apoio à medida estadual. A Federação das Associações Empresariais (Facisc), que representa mais de 34 mil empresas catarinenses, disse, em nota, que “neste primeiro momento, as medidas tomadas pelo governo estadual atendem aos anseios da classe empresarial”.
Urgência
Botelho reforça que a abertura de escolas nas últimas semanas e as medidas inócuas do decreto seguem na contramão do que a urgência de contenção à pandemia impõe. “Abrimos as escolas e, na primeira semana, está um horror. Mais de 100 professores testaram positivo em Blumenau”, alerta. Para ele, não basta atribuir ao indivíduo, e esperar que ele resolva, por meio de seus comportamentos, atribuições de âmbito social e coletivo. Ele acredita que, da mesma forma, não é o suficiente aumentar a quantidade de leitos. “Hoje, essas medidas do decreto são como liberar a ingestão de bebida alcóolica, liberar a velocidade dos carros e colocar uma ambulância a cada cinco quilômetros”.
Para o professor, no lugar do mero investimento em leitos, deveria haver um lockdown imediato no estado por pelo menos duas ou três semanas, com o direcionamento de recursos públicos para programas sociais, para dar condições para as pessoas ficarem em casa. “Pesquisas divulgadas nesta semana já demonstraram que, entre os indivíduos que adoecem e são entubados, 25% morrem ou retornam à internação no primeiro ano e 45% não conseguem trabalhar nesse primeiro ano”, explica ele. “Ou seja, nem do ponto de vista econômico há justificativa para não fazer lockdown”, acrescenta.
Na avaliação do epidemiologista, as ações recentes do governo estadual sugerem que ele empurra, mais uma vez, para a competência dos municípios ações que deveriam ser assumidas nos níveis estaduais e federais. Isso faz, inclusive, com que os municípios busquem alternativas por conta própria, como a negociação da compra de vacinas com os países, em ações descoordenadas.
Na prática, o professor acredita que haja uma falta de visão dos governos sobre o estágio da pandemia em que estamos vivendo. “Para nós da saúde pública, se tivesse uma perspectiva clara de horizonte da vacina, seria outra situação. Mas no momento, vivemos em uma insegurança vacinal”. O plano nacional de vacinação, que era referência mundial, sofre com a alteração constante de regras, o que dificulta ainda mais. “Para mim, é uma questão muito aguda e vamos entrar em um caos profundo”, lamenta.