Como detalha matéria da Agecom, documento apresenta análise de oito amostragens coletadas ao longo de duas semanas
O grupo de pesquisadores da UFSC que está monitorando os efeitos do rompimento da barragem da lagoa de Evapoinfiltração (LEI) da Casan sobre o ecossistema da Lagoa da Conceição produziu o primeiro relatório. O documento apresenta a análise de oito amostragens coletadas ao longo de duas semanas após o desastre. A barragem da lagoa da Casan que armazenava esgoto tratado rompeu-se no dia 25 de janeiro, após dias de fortes chuvas, despejando na laguna toneladas de sedimentos (areia) e de matéria orgânica.
O sedimento arenoso transportado pela enxurrada depositou-se numa área às margens da lagoa, modificando a topografia do local. Este ponto, para efeitos de estudo, foi designado como Ponto zero pelos pesquisadores. As amostras estabelecem comparações entre o Ponto zero e outras áreas de controle da lagoa. Além de areia depositada no Ponto zero, “observou-se sedimento lamoso com elevada concentração de biodetritos (raízes, folhas, galhos em diferente estágio de decomposição)”. Esse material ficou concentrado na coluna da água marginal durante os primeiros dias do evento, mas acabou dissipado pelo sistema da laguna.
Considerando que 90% do volume da barragem da Casan tenha chegado à Lagoa, os pesquisadores estimaram a quantidade de Nitrogênio Inorgânico Dissolvido (NID) e Fósforo Total (PT) lançados na laguna pelo evento. “Esses valores representam 15 dias da carga emitida de N (nitrogênio) e 61 dias da carga emitida de P (fósforo) pela bacia hidrográfica via rios no sistema”, conforme o relatório. O documento cita como agravante da situação o fato de o ponto onde ocorreu a concentração dos detritos apresentar “uma característica hidrodinâmica de baixas velocidades médias, o que dificulta a dispersão, principalmente nas partes mais profundas da laguna”.
Até o momento foram sistematizados e analisados os dados parciais de pH, temperatura, salinidade e concentração de oxigênio dissolvido (OD), o que permite avaliar a extensão do desenvolvimento da zona morta promovida pelo lançamento do efluente tratado da Casan. “Os parâmetros físico-químicos da água revelaram efeito significativo do efluente sobre a disponibilidade de OD e valores de pH”. Nos ambientes relacionados ao Ponto zero, sob influência direta da lama, os valores de oxigênio dissolvido foram equivalentes aos observados nos ambientes mais profundos da lagoa, onde ocorre uma zona morta.
As análises permitem considerar que a alta carga de sólidos suspensos totais lançada nas águas da laguna (estimada em 5,08 toneladas) está comprometendo a vida da comunidade bêntica, organismos que vivem sobre e dentro do sedimento, como poliquetas e berbigão. “Isso ocorre pois o denso material rico em matéria orgânica se depositou no sedimento, sufocando-o, impedindo a oxigenação do sedimento e a circulação da água na interface sedimento-água, por onde esses organismos retiram seu alimento e efetuam as trocas gasosas para o seu metabolismo”.
Em conclusão, o relatório recomenda a continuidade do monitoramento em toda a laguna por mínimo seis meses, além do início imediato de ações de mitigação e restauração do ecossistema. Os pesquisadores caracterizam a Lagoa da Conceição como um ambiente altamente suscetível à entrada de matéria orgânica e nutrientes e ressaltam que a falta de ações imediatas de mitigação pode levar a laguna a ultrapassar o seu “limite ecológico”, amplificando a frequência de eventos com formação de zona morta.
“Reforçamos que o planejamento das ações deverá assegurar o equilíbrio ecológico e a sustentabilidade das diferentes formas de uso da região. É fundamental que o processo de restauração dos ambientes afetados pela LEI Casan contemple a revisão dos métodos de tratamento (para o sistema terciário) e de disposição dos efluentes da ETE em questão, até que alternativas mais robustas e seguras sejam discutidas e implantadas para garantir a saúde dos ambientes e a integridade das pessoas”.
O relatório é assinado por pesquisadoras e pesquisadores dos seguintes laboratórios e projetos: Projeto Ecoando Sustentabilidade; Laboratório de Biodiversidade e Conservação Marinha – LBCM; Laboratório de Ficologia – Lafic; Laboratório de Oceanografia Química e Biogeoquímica Marinha (Loqui), Núcleo de Estudos do Mar (Nemar) e Veleiro Eco.
Confira a íntegra do relatório no site da Agecom.