Reitor informou sobre convite à professora Cátia Regina Silva de Carvalho Pinto na última reunião do Conselho Universitário de 2020; assunto não foi debatido entre conselheiros
O ano de 2021 começa com uma mudança em um dos maiores cargos da UFSC, o que vem gerando debates entre representantes da comunidade universitária. No encerrar das atividades do último ano, foi anunciado o convite à professora Cátia Regina Silva de Carvalho Pinto para assumir a vice-reitoria a partir deste mês de janeiro. O anúncio surpreendeu integrantes do Conselho Universitário naquela reunião do dia 18 de dezembro, dedicada a uma série de homenagens pelos 60 anos da universidade. Sem entrar no mérito da escolha específica pela professora Cátia, que tem trajetória profissional inclusive enaltecida pelos entrevistados, docentes, técnicos e discentes ouvidos pela reportagem foram unânimes ao falar em uma surpresa na forma como o convite foi anunciado, sem consulta prévia no Conselho.
A APUFSC ouviu a reitoria, diretores dos centros e representantes do Conselho Universitário para trazer um panorama de como está a condução desse processo. O presidente da Apufsc, Bebeto Marques, destaca que é preciso atentar pela transparência e cuidados com a segurança jurídica nesta etapa. “Não se pode desconhecer ou subestimar o contexto político mais geral, com intervenções e nomeações antidemocráticas nas reitorias por parte do governo federal”. Ele complementa: “ouvir os conselheiros e a reitoria é uma forma de ajudar na transparência e tranquilidade por meio da boa e correta informação, por isso agradecemos aos que se manifestaram”.
Representantes da comunidade universitária reiteram ponderações em relação à condução técnica do processo. “Tenho certeza de que a professora Cátia tem condições profissionais para lidar com os desafios e entendo que o cargo de vice-reitora é de confiança e o reitor tem o direito de fazer essa escolha. Entretanto, queria ponderar, até pela minha trajetória de luta e vivência na universidade, que seria muito importante e prudente que um convite dessa natureza fosse feito de forma diferente”, afirma o professor João Luiz Martins, que está à frente do campus de Blumenau.
O professor acredita que o assunto deveria ter sido previamente submetido em reunião, em uma decisão mais dialogada. “Certamente o Conselho iria aprovar o convite, mas é uma questão de respeito ao órgão máximo da universidade e seria uma oportunidade de conversar sobre o tema e até de ouvir as prioridades da nova vice-reitora e enaltecer o trabalho dela”. Martins complementa: “Todos foram surpreendidos com a informação, ao final da reunião do dia 18. Para mim, foi uma surpresa boa, mas a comunidade universitária fica preocupada com a abordagem”, afirma o professor, destacando ainda que o diálogo se torna ainda mais importante em um momento de reivindicações para que o direito à lista tríplice das universidades seja garantido.
O professor Irineu Manoel de Souza, diretor do CSE, também discorda da forma como o assunto foi conduzido. “As decisões mais importantes nas universidades, normalmente, são tomadas ouvindo-se os órgãos colegiados”, ressalta. Ele acredita que a indicação para o cargo da vice-reitoria da UFSC deveria ter sido precedida de consulta ao Conselho Universitário, como é a cultura nas universidades e conforme as orientações contidas no próprio estatuto da UFSC – ele lembra, inclusive, do artigo 17, IX, e do artigo 30, que tratam do assunto. O professor ainda destaca o decreto Nº 2.014, do ano de 1996, que se refere à delegação de competência para nomeação de vice-reitores, e complementa que, seguindo o estatuto da UFSC, a nomeação para o cargo de vice-reitoria requer encaminhamentos diferenciados da nomeação para os cargos de pró-reitores, por exemplo. “Naturalmente, o Conselho Universitário analisaria com toda tranquilidade a proposição do reitor”, conclui.
O coordenador geral do Sindicato dos Trabalhadores da UFSC (Sintufsc), Humberto Roesler Martins, avalia que o convite sem a apreciação do Conselho falha do ponto de vista administrativo, por não ter passado pela apreciação prévia do Conselho, e falha do ponto de vista democrático. “Ao nosso entender, a forma como o convite foi feito fere todos os princípios democráticos que deveriam reger uma instituição como a universidade, pelo fato de não ter sido apreciado o nome da professora em uma sessão do próprio conselho universitário, que é a instância máxima de deliberação da universidade e na sua composição estão representantes de todas as categorias da comunidade universitária”, afirma.
Já o diretor do campus de Curitibanos, Juliano Wendt, também ficou sabendo da escolha na reunião do Conselho, mas não vê problemas em relação à indicação da professora. “Fiquei sabendo da escolha no final do ano, assim como vários outros conselheiros. Mas não vejo problema em relação à forma como foi escolhido o nome da professora Cátia”, destaca.
O professor Nilton Branco, do CFM, expõe que “a mensagem do professor Carlos Vieira, representante dos professores do CFH no Conselho, levanta uma possível fragilidade jurídica no procedimento adotado na indicação da atual vice-reitora. Essa fragilidade, se confirmada, pode colocar a instituição em situação delicada, em uma época em que somos atacados, de forma injusta mas constante, por alguns setores de nossa sociedade”. Para ele, a administração precisa dar uma resposta, para tranquilizar a comunidade e definir a precisão e a correção jurídicas do ato.
“Além disso, me parece necessário que a indicação seja apreciada pelo Conselho Universitário, para que o nome da professora Cátia, que não encontra resistência neste conselho, tenha o respaldo formal da comunidade e que a instituição não se veja insegura frente a possíveis ataques externos”, complementa.
::: O professor José Fletes e o professor Carlos Vieira também debateram o assunto em artigos de opinião publicados no site da Apufsc.
Questões técnicas da escolha
A universidade precisa de uma nova vice-reitoria em função dos desdobramentos da morte do reitor Luiz Cancellier. Na época, foi escolhido um novo nome para o cargo vacante e, depois disso, houve um novo pleito para reitoria, enquanto a vice-reitora Alacoque Lorenzini, da chapa de Cancellier, ficou até o fim de seu mandato. Isso fez com que os mandatos de reitor e vice ficassem descasados. O mandato da vice se encerrou em maio de 2020, mas recebeu a prorrogação do reitor até dezembro de 2020.
O professor José Pilati, diretor do CCJ, explica que, se o mandato da vice-reitora terminou e já transcorreu metade do prazo do mandato do reitor, ele legalmente pode nomear alguém de confiança para concluir o período e no futuro restabelecer a simetria entre os mandatos, na próxima eleição. “Então, caso o Conselho não homologue o nome indicado, quando a tanto convocado, depois das férias, o reitor indicará outro, à livre escolha sua também; o que certamente não acontecerá, porque a pessoa nomeada preenche todas as condições e ninguém tem nada contra ela”, afirma.
Para o professor Edson de Pieri, do CTC, há três fatos preponderantes que merecem ser analisados: o que representa o cargo de vice-reitor para a UFSC, qual a melhor forma de fazer a indicação e a quem compete a nomeação depois de tantas idas e vindas na legislação que trata do assunto.
Para ele, há muitas questões que antecedem a proposta de um nome. “Diferentemente da proposta de chapas que concorrem à reitoria e são ou não referendadas pela comunidade e pelo Conselho Universitário, neste momento, a comunicação de um nome coloca a pessoa escolhida no mesmo patamar de um pró-reitor, podendo constranger o nosso regimento e estatuto e também a pessoa escolhida”, diz o professor. “Ainda que eu ache que não poderá ser somente a indicação de um nome. De fato, uma vice reitora, não é equivalente a um pró-reitor”, acrescenta.
“A escolha de uma vice-reitora neste momento de excepcionalidade precisa ser feita de forma cuidadosa, com um trâmite que merece ser analisado em toda a sua complexidade”. Para ele, o decreto que permitiu ao reitor reconduzir a Profa. Alacoque até dezembro não pode mais ser usado. “Devemos retornar à legislação que trata do assunto. A nomeação pelo presidente pode exigir uma lista tríplice e determinar um mandato de quatro anos, somente para citar algumas possibilidades abertas pela legislação vigente”, destaca.
Outra questão apontada pelo professor é a indicação por um reitor que não teve a prerrogativa de escolher o seu vice no momento em que se candidatou. “Mas a importância do cargo, as responsabilidades e a legislação atual exigem primeiramente um amplo entendimento do que representa escolher uma vice-reitora neste momento”, afirma, reforçando que a melhor forma de indicação passa por uma discussão clara e objetiva em reunião do Conselho.
O que dizem os estudantes
Para o Diretório Central dos Estudantes (DCE), o gabinete falhou em fazer uma discussão mais ampla envolvendo a comunidade. “Se fosse algo urgente, que pelo menos a comunidade tivesse ciência, que pelo menos tivesse tido mais transparência de apresentar isso ao conselho e a toda a comunidade universitária”, reforça Cauê Baasch de Souza, membro da coordenação geral do DCE. “Mais uma vez, vemos um atropelo, fazendo as coisas de uma forma que pode ser pela questão de esconder ou por uma grande desorganização. Nosso posicionamento é que as coisas poderiam ter sido feitas de forma mais transparente”, destaca. Já a Associação de Pós-Graduandos da UFSC não quis se manifestar.
Com a palavra, o reitor
Após contato da reportagem, o professor Ubaldo afirmou: “eu não nomeei ninguém como vice-reitora, como estão dizendo. A professora Cátia foi convidada e aceitou”. Ele informou ainda: “Agora, vamos seguir a tramitação normal e legal, para regularizar a situação. Mas isso só deverá ser feito em fevereiro”, quando ele retornar das férias, que se encerram no próximo dia 25. A assessoria da reitoria reforça que a designação oficial só será feita no retorno do reitor.
Levantamento junto aos Centros
Os diretores dos Centros e integrantes do Conselho foram procurados por e-mail e telefone entre os dias 04 e 08 de janeiro, pela equipe de jornalistas da Apufsc. Confira abaixo os posicionamentos dos demais representantes dos Centros e campi da UFSC.
CCB, Prof. Alexandre Verzani Nogueira
Alexandre apontou que o assunto ainda não foi discutido pelo Conselho do CCB, mas que fez uma consulta à Procuradoria Federal sobre o assunto. “Uma servidora técnica queria que o Conselho do CCB apreciasse a matéria. A resposta foi que a escolha do cargo de vice-reitora não compete aos órgãos executivos setoriais. A consulta não seria conhecida por inexistência de competência para tratar do referido tema”.
CED, Prof. Antonio Brunetta
Preferiu não se manifestar sobre o assunto.
CCE, Prof. Arnoldo Debatin Neto
“Eu penso que esse assunto ainda vai passar pelo Conselho Universitário.”
Campus de Joinville, Prof. Diego Greff
Preferiu não se manifestar sobre o assunto.
Campus de Araranguá, Prof. Eugênio Simão
“Isso é matéria para fórum correto e não para matéria de tablóide, como conselheiro não posso me pronunciar fora do âmbito do conselho e todos não deveriam”.
CCS, Prof. Fabricio de Souza Neves
Não retornou aos nossos contatos.
CDS, Prof. Michel Angilio Saad
“Como entrei há pouco tempo na direção do CDS, estou ainda em fase de familiarização com as legislações, regimentos e outras questões pertinentes ao cargo. Em relação a escolha da professora Cátia Regina Silva de Carvalho Pinto, acredito que foi a melhor possível, ela fez uma ótima gestão no campus de Joinville e vai agregar muito a equipe da reitoria.”
CFH, Profa. Miriam Furtado Hartung
“Primeiramente, devo esclarecer que este posicionamento é meu como diretora, e pode não refletir a posição do CFH como um todo. A consulta da Apufsc vem num momento em que não é possível reunir o Conselho de Unidade para discutir esse importante assunto, realmente de grande interesse de toda a comunidade acadêmica. Em relação às indicações para as funções maiores na UFSC, quero apenas relembrar que a organização das universidades, desde sua redemocratização, se baseia em instâncias colegiadas que, por lei e costume, devem estar envolvidas em decisões desta natureza e importância, mesmo que, em algumas situações, possa se admitir a prerrogativa de indicação de ofício. Não estou certa se na UFSC tudo tem seguido esta norma, que é sempre a nossa expectativa. De forma oportuna, seria também o caso de manifestar alguma estranheza quanto ao interesse da APUFSC neste assunto, neste momento e neste contexto. Diante do panorama nacional, acredito que todos esperávamos ver a Apufsc promover e liderar o debate, necessário e urgente, sobre a intervenção do governo federal nas nomeações dos reitores de várias universidades, eleitos democraticamente em seus conselhos superiores. Este é o tema maior que deveria mobilizar a comunidade acadêmica, com expressão e apoio da entidade sindical”.
CCA, Profa. Rosete Pescador
Rosete disse ter tomado conhecimento sobre a indicação da professora Cátia no dia 18 de dezembro e que o fato foi “uma grande surpresa” para ela. Para além da sua reação pessoal, a professora comenta que não vê mais pessoas conversando sobre o tema, o que atribui ao recesso coletivo e ao distanciamento social causado pela pandemia.
Assessoria de Imprensa