Por Raul Valentim da Silva
A Escola de Engenharia da UFSC teve como ponto de partida um convênio com a UFRGS que previa o deslocamento de docentes para lecionar, durante dois anos, as disciplinas do Curso de Engenharia Mecânica e preparar seus substitutos. Estes professores atuavam na docência quase que exclusivamente em tempo parcial, desenvolvendo paralelamente atividades profissionais de engenharia.
Assim, a engenharia que era lecionada em Porto Alegre e que passou a ser ministrada na UFSC estava devidamente contextualizada. O professor da disciplina de Portos, Rios e Canais, por exemplo, possuía uma larga vivência profissional no projeto, na execução de obras e na gerência de entidades nestas áreas da engenharia civil. Na UFSC atuou posteriormente o professor Colombo Machado Salles, que chegou a ser governador e que possuia tais qualificações.
Com a reforma universitária implantada na UFSC em janeiro de 1970, foram introduzidos os regimes de tempo integral e dedicação exclusiva, ao lado do regime de tempo parcial. Esta inovação permitiu uma efetiva profissionalização dos docentes e possibilitou os afastamentos para cursar o mestrado e o doutorado, permitindo a posterior implantação da pós-graduação. A UFSC e toda a universidade brasileira beneficiaram-se bastante desse significativo avanço.
Infelizmente, os aperfeiçoamentos, como muitas terapias, em geral também apresentam efeitos colaterais que podem ser prejudiciais. Na universidade existe uma grande diversidade de situações associadas com as respectivas áreas de atuação. No direito e na medicina logo foram constatados problemas decorrentes do distanciamento da universidade em relação aos respectivos ambiente profissionais.
Ao longo dos 50 anos de vigência do regime de dedicação exclusiva foram reduzidos os esforços efetivos nas IFES para propiciar uma contextualização apropriada para as áreas de engenharia. A pesquisa vinculada principalmente à pós-graduação acabou alienando-se de múltiplos sistemas produtivos brasileiros. Como decorrência, observa-se um ensino universitário que nas engenharias está se tornando cada vez mais alienante. São necessários esforços para criar vínculos mais fortes com a realidade profissional brasileira.
Os docentes dos cursos de engenharia da UFSC foram, em geral, alunos de professores que não atuaram profissionalmente em engenharia e que tiveram uma vida quase que totalmente acadêmica e predominantemente inserida em ambientes de pesquisa. A Capes já percebeu este problema e está reformulando seus critérios de avaliação dos cursos de pós-graduação, inserindo dimensões como impactos nos processos de desenvolvimento do Brasil.
As novas diretrizes curriculares nacionais das engenharias (DCNs) e a curricularização da extensão podem ser processos bastante úteis numa melhor contextualização brasileira do ensino das engenharias. Mas são necessários novos mecanismos de interação entre as organizações dos sistemas produtivos e as IFES. O marco legal da ciência, tecnologia e inovação precisa ser devidamente regulamentado nas universidades. O marco legal do saneamento é um mecanismo setorial que deve ser bem trabalhado, especialmente na formação de pessoal qualificado.
Jornais de circulação nacional como a Folha e o Estado de São Paulo estão facilitando o acesso de docentes e alunos aos seus conteúdos digitais. Tais oportunidades devem ser bem aproveitadas. Não apenas os docentes, mas também os discentes precisam ser devidamente inseridos no contexto das reais problemáticas da engenharia no Brasil. Os professores aposentados e os demais servidores da UFSC também podem e devem ser envolvidos nesses processos de contextualização profissional.
Raul Valentim da Silva é professor aposentado do Centro Tecnológico (CTC) da UFSC.
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