Pesquisa avaliou ações de comunicação científica em oito países; Brasil é o campeão, enquanto Japão teve índices mais baixos de divulgação
O Brasil é o país que mais divulga ciência em suas instituições públicas de ensino, como universidades e centros de pesquisa, e também o que mais utiliza as redes sociais como meio de divulgação científica.
A frequência de ações de comunicação da ciência no país —incluindo mídia tradicional, eventos públicos e redes sociais— é quase três vezes a do Japão, e acima da média global. Os países europeus “empataram” neste sentido —houve pouca ou nenhuma diferença.
Os dados são fruto de um estudo publicado na revista científica PlosONE por pesquisadores de diversos países, incluindo uma brasileira, Luisa Massarani, coordenadora do Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia da Fiocruz.
O estudo avaliou 2.030 instituições no Brasil, Estados Unidos, Alemanha, Itália, Reino Unido, Holanda, Portugal e Japão. A inclusão destes países seguiu as diretrizes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) para pesquisas e estatísticas globais, garantindo assim validade metodológica ao estudo. Os dados foram coletados entre junho de 2017 e maio de 2018.
Para avaliar como é feita a divulgação científica nas instituições, os pesquisadores enviaram formulários aos diretores ou responsáveis da área de divulgação dos centros participantes.
No formulário, havia perguntas como qual a frequência de ações de comunicação da ciência (em uma escala de 0 a 100%) e quais os principais meios de divulgação utilizados. Os cientistas analisaram também o tamanho das instituições, medido pelo corpo de pesquisadores, e o orçamento anual para pesquisa.
A análise global dos dados mostrou que, em média, as universidades se engajam mais em divulgar ciência através de eventos públicos (como atividades em escolas e semanas temáticas) e mídia tradicional em comparação às mídias sociais.
Mas os pesquisadores encontraram uma forte correlação entre os institutos que mais divulgaram por mídias tradicionais também serem mais ativos nas redes sociais.
“Nossa expectativa era que o uso de redes sociais fosse maior do que o encontrado. Mas entendemos que, nas instituições que usam mais tanto meio tradicional quanto redes sociais, isso é mais devido a um investimento maior em divulgação científica do instituto, com formação em recursos humanos, do que tamanho da instituição”, afirma Marta Entradas, pesquisadora do Instituto Universitário de Lisboa e primeira autora do estudo.
No caso do Brasil, a frequência reportada de uso do Facebook diariamente ou semanalmente pelas instituições foi de 40%, o maior valor encontrado entre todos os países. Este é o valor aproximado também de divulgação em sites oficiais das instituições (38%). Cerca de 20% reportaram usar o Twitter e apenas 10% blogs de ciência.
Para Massarani, a divulgação em redes sociais pode ser feita a custos mais baixos, o que é uma vantagem para instituições de menor porte, com menos recursos disponíveis. “Mas ter uma diversidade de ações, de tipos e custos diferentes, é fundamental para consolidar uma cultura científica em nosso país, com objetivos e perspectivas diferentes.”
Ainda segundo a pesquisa, a maior parte da população procura buscar informações sobre ciência em mídias tradicionais, o que reflete a baixa adesão em redes sociais das instituições públicas. Nos países europeus, cerca de 10% reportaram usar redes sociais para buscar informações de ciência e tecnologia.
Outro dado interessante da pesquisa é como a divulgação se concentra, em geral, em uma fração das instituições (30%) que mais praticam divulgação científica. A seleção das instituições seguiu metodologia estratificada diferenciada em cada país, evitando que o tamanho do país, em termos geográficos, influencie os dados.
No caso do Brasil, foram selecionadas as instituições públicas listadas no Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), os centros de pesquisa ligados ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e também as 50 universidades listadas como as melhores do país no ranking Times Higher Education e no RUF (Ranking Universitário da Folha).
Cruzando todos esses critérios, chegou-se a um total de 945 instituições, das quais 169 responderam o questionário. Na Itália, foram incluídas 366 instituições, na Alemanha, 358, e no Japão, 321. Todos esses países tiveram menor desempenho na comunicação que o Brasil.
O principal obstáculo para divulgação científica no Brasil é a falta de recursos, avalia Massarani. No entanto, os resultados da pesquisa refletem “os esforços que ocorreram desde 2004 de incentivo à divulgação”. A pesquisadora cita a criação de um setor no então Ministério da Ciência e Tecnologia dedicado à popularização da ciência, que trouxe ações importantes, como a Semana Nacional da Ciência e Tecnologia. “Infelizmente, o setor tem sido reduzido nos últimos anos e, apesar da cultura científica que se estabeleceu, é importante manter o apoio econômico e o estímulo que existiam.”
Embora a comunicação da ciência tenha sido avaliada principalmente de dentro das instituições, há um movimento crescente de divulgadores de ciência no país, especialmente de jovens pesquisadores que se lançam em canais de divulgação independentes.
Para Yurij Castelfranchi, físico de formação, professor do departamento de sociologia da UFMG e coordenador do curso de especialização em comunicação pública da ciência (Amerek), que não participou do estudo, há uma ideia de o Brasil ser “atrasado” na divulgação científica. No entanto, a comunicação da ciência no Brasil sai do estereótipo “quadrado” das instituições tradicionais, o chamado padrão europeu, e se aproxima da comunidade e dos públicos mais jovens.
Para ele, a comunidade acadêmica brasileira tem feito divulgação com metade ou nenhum incentivo. “Tanto a população quanto as instituições usam redes sociais e isso aproxima o público, torna o cientista mais próximo do povo. Uma [Universidade de] Cambridge pensa seis vezes antes de aparecer no Facebook. Há uma onda muito grande de jovens cientistas divulgadores que eu acho fantástico”, finaliza.
Fonte: Folha de S. Paulo