Ainda em discussão no governo, a tesourada também afetaria programas que são bandeiras da gestão de Jair Bolsonaro, como escolas cívico-militares e a alfabetização infantil
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, afirmou ao Ministério da Economia que pode ter que interromper aulas em 29 institutos federais por causa de um corte de R$ 1,57 bilhão no orçamento da pasta deste ano. A tesourada, ainda em discussão no governo, também afetaria programas que são bandeiras da gestão de Jair Bolsonaro, como a implementação de escolas cívico-militares e a alfabetização infantil.
O alerta de Ribeiro está registrado em ofícios obtidos pelo Estadão. O ministro atribuiu o pedido de bloqueio dos recursos à Secretaria de Governo, comandada por Luiz Eduardo Ramos, articulador político do Palácio do Planalto. Técnicos da Economia, no entanto, já haviam comunicado os ministérios que haveria remanejamento de recursos para atender o Pró-Brasil. Após a pressão de ministros e do Congresso Nacional, o governo deve destinar R$ 6,5 bilhões do Orçamento para obras públicas, como mostrou o Estadão.
No caso do MEC, Ribeiro aponta “risco de imagem” ao governo, pois alguns institutos federais têm retomado atividades, ainda que remotamente, após promessa do governo federal de apoiar estudantes de baixa renda ao fornecer equipamentos e internet. A paralisação afetaria 175 mil alunos.
Ao pedir para barrar o bloqueio do orçamento, a Educação argumenta que já enviou mais de R$ 66 milhões a 40 institutos e escolas técnicas para ações de “desenvolvimento e modernização” destas instituições. Segundo nota técnica da pasta, haveria “prejuízos incalculáveis a formação dos alunos”, pois o recurso já está sendo executado. “O que significa que eventual cancelamento acarretará a quebra de contratos junto a fornecedores e prestadores de serviços, além da possível interrupção dos cursos.”
O maior cancelamento de orçamento seria feito em ações de “apoio ao desenvolvimento da educação básica”, o que inclui o programa de ensino médio em tempo integral, as escolas cívico-militares e ações em unidades de ensino em todo o País. A verba disponível nesta área cairia de R$ 1,27 bilhão para R$ 260 milhões, informou o MEC à Economia. O ministro também alerta para redução dos recursos disponíveis ao atendimento contra a covid-19. “Importa ainda, esclarecer que a medida também afeta as ações orçamentárias dos hospitais universitários federais, comprometendo a cobertura dos atendimentos realizados.”
A Secretaria de Governo nega o pedido de bloqueio de orçamento do MEC. A assessoria do ministro Ramos afirma que nem sequer pode se intrometer na elaboração do orçamento. Procurado, o MEC não quis dar mais detalhes sobre a previsão de redução da sua verba, apenas confirmou que pediu para reverter o bloqueio.
Segundo a Educação, com o corte ainda seriam atingidas as políticas de formação indígena, da Escola da Terra e de Educação Especial. “A Educação Bilíngue de Surdos, por exemplo, ofertará 3 mil vagas em parceria com 13 instituições, objetivando instrumentalizar os professores da educação bilíngue de surdos a lidar com a volta às aulas – diante de um novo panorama educacional causado pela pandemia – e seria uma das primeiras formações específicas na área do ensino bilíngue”.
Junta orçamentária ainda analisará corte no MEC
O pedido de reconsideração de Ribeiro foi enviado à Casa Civil no fim de agosto, que encaminhou os ofícios em 11 de setembro à Economia. O MEC argumenta que o bloqueio nem sequer seria viável, pois atinge até valores que já não estão mais com a pasta, pois foram enviados a universidades, por exemplo.
Em nota, o Ministério da Economia disse ao Estadão que a Junta de Execução Orçamentária (JEO) avaliará se o orçamento do MEC será ou não bloqueado. O órgão é formado por Guedes, o ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto, e técnicos que lidam com o orçamento.
Os ministérios consultados não explicam o motivo do pedido. O Estadão apurou que algumas pastas têm recebido ordens da JEO para bloquear verbas da própria pasta.
“Não houve consulta ao MEC sobre os possíveis impactos na execução de suas políticas por ocasião do bloqueio dos créditos. Além disso, não foram considerados os empenhos e as descentralizações de valores em algumas ações, o que resultou na inversão de contas contábeis”, afirma nota técnica da Educação.
No fim de agosto, o governo recuou e desistiu de corte de orçamento no Ibama e no Instituto Chico Mendes (ICMBio), após o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciar que paralisaria ações de combate ao desmatamento na Amazônia e no Pantanal. Conforme nota da equipe de Salles, a tesourada seria de R$ 60 milhões. A ameaça do ministro escancarou racha com ministros militares que atuam no Palácio do Planalto.
Fonte: Estadão