Cidades com gasto anual inferior a R$ 4.500 por aluno têm média 5 no Ideb, contra 6,4 das que têm orçamento de mais de R$ 7.000
A realidade de gasto por aluno nas redes municipais tem relação com os resultados educacionais revelados pelo Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). O indicador médio das redes varia até 1,4 ponto a depender do nível de investimento dos municípios.
Os dados do Ideb 2019 foram divulgados na terça-feira (15) pelo governo federal. O indicador é calculado a cada dois anos pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão do MEC.
Para chegar ao índice, são levados em conta o desempenho dos estudantes em avaliação de matemática e língua portuguesa, chamada Saeb, e as taxas de aprovação escolar. A avaliação federal é feita ao fim de três etapas: anos iniciais (5º ano) e finais (9º ano) do ensino fundamental e no último ano do ensino médio.
A Folha cruzou os resultados do Ideb do ensino fundamental das redes municipais com os gasto anual por aluno. Os dados de investimento são referentes a 2015, os mais atuais, e foram atualizados pela inflação até 2019.
A maior distância aparece nos anos iniciais. Municípios com investimento por aluno de até R$ 4.500 por ano registram uma média de 5 no Ideb. Já aqueles com gastos superiores a R$ 7.000 têm, na média, Ideb 6,4 nos anos iniciais. Como comparação, a rede pública brasileira demorou 11 anos para avançar 1,3 ponto no Ideb dos anos finais até alcançar a média 5,7 no Ideb 2019. Essa é a etapa em que o país tem conseguido seus melhores resultados nos últimos anos.
A reportagem separou os municípios em quatro faixas de gastos; a cada faixa, aumenta a média obtida no Ideb.
Entre os municípios com Ideb calculado, 26% têm orçamentos anuais de educação equivalentes a até R$ 4.500 por aluno. Quase a mesma proporção (27%) conta com orçamento entre R$ 5.680 e R$ 7.000, que têm na média Ideb 6,2 —ou 1,2 ponto superior ao grupo com menores orçamentos.
Em termos de aprendizado, a distância entre a média de matemática nesses dois grupos de municípios é de 28 pontos. Trata-se do equivalente a dois anos de aprendizado, segundo especialistas.
Nos anos finais, etapa com maiores desafios para os sistemas educacionais, a diferença máxima das médias do Ideb é de 0,8 ponto de acordo com o nível de investimento. São 20 pontos em matemática e 18 em português. No Ideb de 2015, por exemplo, as distâncias eram similares —1,6 ponto nos anos iniciais e 1 ponto nos finais.
O valor de R$ 5.680, adotado pela reportagem nos recortes, é a projeção de gasto mínimo por aluno que o país deve alcançar com o novo Fundeb em 2026. Hoje ele é de R$ 3.656,85. Principal mecanismo de financiamento da educação básica, o Fundeb reúne impostos e os direciona para as redes de ensino com base no número de alunos.
Renovado e ampliado neste ano pelo Congresso, ganhou regras que preveem que a União mais que dobre sua contribuição ao fundo, de modo escalonado, até 2026. Atualmente, o gasto por aluno no Brasil varia sete vezes entre os municípios que têm mais ou menos recursos —diferença que deve cair a três.
De toda forma, o investimento por aluno não é uma variável definitiva para o sucesso escolar. A rede municipal de Mucambo, no Ceará, por exemplo, tem orçamento inferior a R$ 4.500 e conseguiu no ano passado um Ideb de 9,4 nos anos iniciais. Foi o maior do país na etapa.
No mesmo grupo de gastos, 31 municípios (sendo 24 do Ceará) superam 7,1, média registrada pela rede privada no país. Mas o menor Ideb do país está exatamente no grupo com os menores investimentos: Envira, no Amazonas, teve 2,3 nos anos iniciais.
Nos grupos com maiores investimentos não há cidades com indicadores nem perto disso. Nenhum município com gastos entre R$ 5.680 e R$ 7.000 fica abaixo de 3,4 e, nas redes com orçamento superior a R$ 7.000, o menor índice é de 4,1.
As condições de oferta escolar também variam de acordo com a realidade de investimento, o que se reflete na educação oferecida aos alunos. Naqueles com gastos de até R$ 4.500 por aluno, a média de professores que dão aulas sem formação superior é de 25% nos anos iniciais.
Esse índice cai para 11% entre as redes com gastos entre R$ 4.500 e R$ 5.680. Depois vai para 8% entre os que investem até R$ 7.000 e, nas redes com mais de R$ 7.000, chega a 5%.
Nos anos finais, por exemplo, 44% dos professores das redes municipais no menor intervalo de gastos lecionam disciplinas para as quais não tem formação. No outro extremo de gasto, esse percentual é de 26%.
A média de alunos por sala também varia. Ainda nos anos finais, comparando o grupo com mais e o com menos investimentos, as médias são de 25 e 22 alunos por turma.
O município com maior Ideb nos anos finais do fundamental também está no Ceará, a exemplo do que se vê no primeiro ciclo, e encontra-se entre as cidades com menos de R$ 4.500 por aluno. Trata-se de Pires Ferreira, com Ideb de 7,8 pontos.
A cidade cearense de Sobral, que na edição passada liderou nas duas etapas, teve queda nas duas etapas e perdeu posições. Ainda assim, mantém resultados bem acima da média e das metas (8,4 nos iniciais e 6,9 nos finais).
O Ceará é apontado como exemplo de eficiência porque municípios pobres conseguiram bons resultados com recursos limitados. O estado aprovou lei, ainda em 2009, que alterou a distribuição do ICMS para cidades com base em resultados educacionais, e a secretaria estadual de Educação realiza forte trabalho junto às prefeituras.
Os resultados do Ideb indicam que, nos anos iniciais do ensino fundamental, 3.346 municípios melhoraram o desempenho, mas apenas 3.082 conseguiram atingir a meta estabelecida para 2019 —o que representa 61,9% do total.
Já a avaliação do desempenho dos anos finais das redes municipais mostra que 2.408 avançaram no Ideb de 2017 para 2019, mas apenas 1.251(32,2%) atingiram a meta estabelecida para o ano.
Fonte: Folha de S. Paulo